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Rinpoche: “A natureza humana profunda é a felicidade”

Tulku Lobsang Rinpoche visita Minas Gerais pela segunda vez entre os dias 12 e 22 de abril
Rinpoche: “A natureza humana profunda é a felicidade”
Crédito: divulgação / arquivo pessoal / Tulku Lobsang Rinpoche

Mais uma vez no Brasil, Tulku Lobsang Rinpoche visita Minas Gerais pela segunda vez entre os dias 12 e 22 de abril. “A jornada ao encontro da sua verdadeira natureza” é um convite ao reencontro da pessoa com a sua verdadeira vocação: a felicidade.

A programação é composta por consultas em medicina tibetana, workshops espirituais e sessões de yoga de Cura Tibetana Lu Jong e Meditação Shamata Tibetana – Shiné, na Capital, e um retiro de quatro dias na cidade de Caeté, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH).

Tulku Lobsang é um alto mestre budista e renomado médico da medicina tibetana. Nascido em 1976, em Amdo, no Nordeste do Tibete, ingressou na escola monástica budista local aos seis anos de idade e, aos 13, foi reconhecido como a oitava encarnação de Nyentse Lama. Já naquela época, ele impressionava as pessoas com suas capacidades de cura.

Entre os seus compromissos diários e a preparação da viagem para o Brasil, Tulku Lobsang Rinpoche conversou com exclusividade com o DIÁRIO DO COMÉRCIO para falar das suas impressões sobre o Brasil e Minas Gerais, o papel dos líderes na construção de um mundo mais justo e o necessário reequilíbrio entre a humanidade e a natureza, entre outros assuntos.

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A presença do mestre em Belo Horizonte está em linha com o Movimento Minas 2032 –  (MM2032) – pela transformação global, liderado pelo DIÁRIO DO COMÉRCIO. A iniciativa propõe uma discussão sobre um modelo de produção duradouro e inclusivo, capaz de ser sustentável, e o estabelecimento de um padrão de consumo igualmente responsável, com base nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), promovidos pela Organização das Nações Unidas (ONU) desde 2015.

DIÁRIO DO COMÉRCIO: Essa é sua segunda vez em Minas Gerais. Ǫuais suas impressões sobre o Estado e quais as expectativas para este ano?

Tulku Lobsang Rinpoche: Minhas impressões sobre o Estado de Minas Gerais foram muito positivas e a principal razão para eu querer voltar são as pessoas. No Brasil, as pessoas são muito humildes, elas sempre tentam obter o melhor dos meus ensinamentos. Isso é o que eu sempre experiencio, em especial desta última vez que eu vim para a cidade de Belo Horizonte. Foi tudo incrível. A cidade e as pessoas são incríveis e, claro, a organização, incluindo seu jornal, todas as pessoas ajudando. As pessoas são incríveis! E, claro, tem mais uma pequena razão: A comida é deliciosa (risos…). Obrigada! 

P: O senhor diz que como seres humanos, buscamos a felicidade, mas, no entanto, seguimos vivendo em um mundo cheio de conflitos – atualmente são cerca de 10 guerras declaradas entre nações. A isso podemos somar conflitos internos, guerras civis e tensões entre países que geram violência, mas ainda não é um conflito oficialmente declarado. Sendo assim, por que a humanidade ainda não se entendeu com a sua verdadeira vocação, que é a felicidade? E o que podemos fazer como indivíduos e como coletividade para mudar essa realidade? 

R: Sim! A natureza humana profunda é felicidade. O sofrimento está relacionado à nossa natureza condicionada enquanto a felicidade à nossa natureza não condicionada. Portanto, nós queremos ser felizes incondicionalmente, mas às vezes sofremos influências de emoções internas como a raiva, o ciúme e a ignorância e, devido a estas influências, perdemos a conexão com a nossa natureza profunda. Não é possível realmente perder nossa natureza profunda, mas devido às emoções negativas  – raiva, ciúme e ignorância – nos tornamos distantes da nossa natureza mais profunda. Nós a esquecemos condicionalmente, temporariamente, mas no longo prazo, nós sempre a reencontramos. Claro que neste mundo sempre houve muitos conflitos. No passado, tivemos mais conflitos do que agora. Conflitos sempre vem e vão, mais ou menos neste planeta, mas no final nós sempre desejaremos encontrar a felicidade, pois o sofrimento, as guerras não são nosso interesse mais profundo. São apenas uma condição temporária e nós aprendemos isso cada vez mais rapidamente.

P: O senhor está acostumado a falar para líderes públicos e privados de todo o mundo. O senhor tem notado uma maior conscientização sobre o papel da liderança na construção de um mundo mais justo e equilibrado ou ainda é muito difícil estabelecer esse tipo de conversa?

 R: Com a minha experiência eu realmente acredito que, de maneira geral, a maioria das lideranças são sempre agradáveis, são majoritariamente bem-intencionadas. No nível individual também. São majoritariamente boas pessoas. Claro que todos temos algum nível de problema em nós, mas, em geral, somos boas pessoas. Com a minha experiência, eu acredito que tanto indivíduos quanto pessoas públicas, eles realmente desejam, estão interessados em criar um mundo mais equilibrado e melhor. Quando olhamos de forma ampla, nos últimos 100 anos a humanidade sempre está se tornando melhor, é o que eu percebo. É claro que se olharmos bem de perto sempre temos momentos difíceis, estamos sempre tentando, subimos e descemos, mas de maneira geral e ampla conseguimos, estamos caminhando e alcançando mais equilíbrio e mais harmonia do que alguns séculos atrás. Essa não é tarefa para uma única geração de líderes, mas sempre estamos indo em boa direção.

P: Depois da Covid-19, o mundo vem sofrendo com o aumento das arboviroses. Estudos mostram que isso está ligado ao aquecimento global e ao desequilíbrio da nossa relação com a natureza. Muito já se fala em um “ponto de não retorno”. Como a filosofia tibetana encara esses perigos?

 R: Esse tipo de mudanças no meio ambiente surge de duas formas e uma delas naturalmente, por ela mesma, pois o nosso planeta Terra, nossa natureza, também nasce, envelhece, adoece e também morre. O mesmo que acontece em relação aos seres humanos também acontece ao planeta. Portanto, nós, tibetanos budistas, acreditamos que a natureza ou o planeta passa por este processo de nascimento, envelhecimento, adoecimento e morte independentemente da influência dos seres humanos ou de qualquer outra espécie. Esta não é  minha profissão e, por isso, eu não poderia dizer com 100% de razão, mas o meu sentimento é que mudanças estão acontecendo naturalmente globalmente. Eu não seria capaz de dizer em que grau estas mudanças estão acontecendo por elas mesmas, mas é claro que nós seres humanos somos uma condição importante e que também podemos influenciar essa mudança, como o quão rápido a mudança acontece, por exemplo. Portanto, se esta mudança é de fato provocada pelos seres humanos, então, eu penso que nós também podemos voltar atrás, eu não sei exatamente como, mas seria possível. Mas se todas estas mudanças não são realmente causadas pelos seres humanos e estão naturalmente acontecendo, então, nós não temos como voltar atrás. Nós, budistas, acreditamos que um dia este planeta pode morrer, se tornar quente demais, todas as águas podem secar, pode haver uma grande explosão e tudo se acabar, mas nós não sabemos quando. Sim! Isso é o que posso responder a partir da minha própria ignorância.

P: Todos esses conflitos e perigos têm gerado um crescente estado de ansiedade e depressão na população. Como cuidar da nossa mente para sermos resilientes o suficiente não só para suportarmos, mas também para resolvermos essas questões?

R: Eu não acredito que o mundo sempre possa mudar para cima e para baixo, o mundo pode mudar apenas de baixo para cima. O mundo é como uma árvore, uma árvore pode crescer apenas de baixo para cima. Portanto, mudarmos individualmente é a única forma de mudarmos coletivamente, a sua mudança individual é a única forma de mudança coletiva acontecer, quando nós mudamos coletivamente então a maioria das pessoas não tem outra chance e precisam mudar. Mas o problema é que nós seres humanos normais dormimos demasiadamente e não despertamos naturalmente. É melhor despertarmos naturalmente, mas se isso não acontece, então acontecimentos precisam vir, criar um distúrbio para nos forçar a despertar. Portanto, é por isso que as pessoas sentem ansiedade, preocupações e medo. Claro que não é tão agradável, mas é uma forma de nos despertar para reunir poder coletivo para nos movermos na direção de um mundo melhor. Aquelas pessoas que sentem ansiedade, eu gostaria de dizer: nunca percam a visão ampla da situação, isso nos ajuda a nos manter mais calmos. Quando perdemos a visão ampla e somente focamos em aspectos menores nós nos estressamos mais.

P: Apesar de todos esses desafios, o senhor e a Filosofia Tibetana têm um olhar positivo sobre o mundo. Que mensagem o senhor pode deixar especialmente para os brasileiros?

R: O Brasil possui uma natureza maravilhosa, vocês têm naturalmente todos os cinco elementos distribuídos ao redor de todo o seu País. Vocês possuem uma natureza tão rica, tão incrivelmente bonita, talvez vocês apenas precisem de mais educação, de mais desenvolvimento espiritual e também desenvolver sua sabedoria.

Eu sempre digo às pessoas: se você deseja mudar o mundo, é melhor você mudar a si mesmo. Se você não deseja mudar nada, por favor, não se esqueça de tentar mudar os outros. Espero que  minhas palavras sejam de alguma ajuda. Obrigada!

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