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Tragicomédia distorce os limites entre ficção e realidade para refletir sobre a cultura do consumo

Em “Teatro à Venda”, de Pedro Tancini, tudo pode ser transformado em mercadoria pela lógica capitalista, inclusive a própria arte e os seres humanos
Tragicomédia distorce os limites entre ficção e realidade para refletir sobre a cultura do consumo

Quatro atores encenam uma peça que mais parece um grande comercial de televisão. Eles interpretam a típica “família margarina”: pai, mãe, filho e filha em um cotidiano perfeito anunciando produtos dos mais diversos e miraculosos. Parece que as propagandas invadiram todos os lugares e nem o teatro escapou. É o “Teatro à Venda”, como provoca o título do livro do dramaturgo e poeta Pedro Tancini, onde tudo pode ser transformado em mercadoria pela lógica capitalista, inclusive a própria arte e os seres humanos.

A obra literária, que teve sua primeira encenação em 2023 pelo Coletivo Parêntesis de Teatro, trata sobre as consequências do sistema na vida de trabalhadores que abdicam de tempo, saúde e individualidade para sobreviver. Em uma tragicomédia que distorce os limites entre ficção e realidade, o autor reflete sobre cultura do consumo, desigualdade, epidemia de depressão, crise ambiental e a insensibilização como projeto social.

Pedro Tancini
Em uma tragicomédia que distorce os limites entre ficção e realidade, o dramaturgo e poeta Pedro Tancini reflete sobre cultura do consumo | Crédito: Divulgação Coletivo Parêntesis de Teatro

Nesta sátira ao mundo maravilhoso das narrativas publicitárias, os leitores são convidados a refletir sobre as contradições do capitalismo. A crítica nasce dos conflitos dos quatro protagonistas que se tornam, ao mesmo tempo, as personagens e os atores que os representam. Aos poucos, desmoronam as percepções de cada um deles sobre a própria existência dentro da máquina de produção de lixo e mentiras onde habitam.

O pai descobre que vive uma vida de fachada e, em busca de algum afeto verdadeiro, vende-se pelo telefone. Já a mãe insiste em manter o papel de mulher ideal para fugir da própria infelicidade, até que ela própria se torne uma máquina. O filho, o maior orgulho da família, se mostra um excelente vendedor ao deduzir que não é necessário responsabilidade ou sensibilidade para lucrar nesse mundo de ilusões. A filha, por outro lado, sente-se desamparada porque nenhum produto é capaz de preencher seu vazio e, à procura de um propósito, encontra significado apenas no que é descartado pelo sistema, o lixo.

Pesquisador sobre os impactos do capitalismo nas sociedades do século XXI, Pedro Tancini publica a obra não somente como um retrato da contemporaneidade, mas também como uma maneira de ensaiar caminhos possíveis de superação do sistema. Ele comenta: “Não é difícil criticar o capitalismo. Difícil é ter esperança, quando o sistema está dedicado a nos convencer de que ele é o único possível, que as tragédias que produz são inevitáveis para a existência da civilização. Mas, até para ter esperança, é preciso responsabilidade. E esta obra é um texto que convida a uma esperança ativa, realizada também pelo poder da arte, da literatura e do teatro”.

Primeiro volume da coleção de dramaturgias autorais publicadas pelo Coletivo Parêntesis, Teatro à Venda tem o apoio do governo do Estado de São Paulo, por meio da Secretaria de Cultura, Economia e Indústrias Criativas. Em 2024, também é publicado o segundo livro da coleção: a dramaturgia “Professores Online”, de Pedro Tancini e Caio Caldas.

FICHA TÉCNICA

Título: Teatro à Venda
Autor: Pedro Tancini
Editora: Coletivo Parêntesis de Teatro
Páginas: 96
Preço: R$ 30 (físico)

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