Wine Expo BH: vinho mineiro conquista espaço e vira negócio promissor com apoio do enoturismo e eventos

Minas Gerais vive um novo capítulo na história da vitivinicultura brasileira. Com mais de 100 vinícolas em operação em todas as regiões do Estado, o vinho mineiro começa a se firmar como negócio, atraindo turistas, investidores e consumidores em busca de rótulos locais. A 1ª edição da Wine Expo BH, que começou nesta terça-feira (5) na Capital, reúne produtores, especialistas e empresários para discutir o crescimento do setor e os gargalos que ainda limitam seu desenvolvimento.
Com o objetivo de gerar conexões e oportunidades de negócio, o evento também buscou dar visibilidade à produção mineira de vinhos, que vem conquistando prêmios e reconhecimento dentro e fora do Brasil. O Diário do Comércio é media partner da Wine Expo BH, que vai até esta quarta-feira (6).
Segundo o organizador da Wine Expo BH, Dennis Carvalho, a expectativa é de que aproximadamente 1.700 pessoas participem dos dois dias da feira, que conta com cerca de 50 expositores. “A proposta é criar um ambiente acessível para pequenos, médios e grandes produtores. Recebemos desde donos de restaurantes até distribuidores interessados em conhecer os vinhos locais”.
Ele destaca ainda a importância de incluir Minas Gerais no circuito nacional de grandes feiras do setor. “A gente estudou muito o mercado antes de fazer esse evento. Minas já tem protagonismo em número de vinícolas e em qualidade dos vinhos. Faltava um espaço como esse para fortalecer os negócios e consolidar a imagem do vinho mineiro no mercado”, afirma.
Técnica da dupla poda possibilitou vinicultura em Minas
A história do vinho mineiro como negócio é recente, mas acelerada. A técnica da dupla poda, desenvolvida pela Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig), permitiu adaptar o cultivo da uva ao clima de inverno da região Sudeste, garantindo uvas de alta qualidade e maturação lenta. Isso abriu espaço para a produção de vinhos finos em regiões antes inimagináveis, como Cerrado mineiro, Zona da Mata, Serra da Mantiqueira, Campo das Vertentes, entre outras.
“Elas são pequenas, mas espalhadas por todo o Estado e quase todas com foco no enoturismo”, resume o presidente da Associação dos Produtores de Uva e Vinho de Minas Gerais (UVA) e proprietário da vinícola Stella Valentino, José Procópio Stella.
A vinícola Stella Valentino, em Andradas, no Sul de Minas, tem uma história que remonta a 1888 com a chegada de imigrantes italianos no Estado. Após mais de um século dando continuidade ao plantio de uvas, a família iniciou a produção de vinhos em 2002.
Procópio explica que a expansão da vitivinicultura mineira só foi possível após o desenvolvimento da técnica da dupla poda, pela Epamig. “Antes, só se produzia vinho em Andradas. A partir dessa técnica, o cultivo se espalhou”, explica.

O embaixador da Stella Valentino, Marcel Gomes, destaca que a vinícola foi a primeira do Brasil a obter o selo ESG em sua categoria. “Reutilizamos tudo, inclusive os resíduos da vinificação. Reflorestamos áreas e recuperamos nascentes. É um trabalho de sustentabilidade pensando no futuro.”
Segundo o proprietário, o foco atual está no enoturismo. “Ainda não temos volume para exportar. A produção é pequena e direcionada à experiência do visitante. O vinho é um produto que atrai turistas no mundo todo, e Minas já tem uma vocação natural para o turismo, com sua gastronomia e cultura”, diz.
Enoturismo é o motor econômico dos vinhos mineiros
Para boa parte das vinícolas mineiras, o enoturismo ainda é o principal canal de vendas. É o caso da vinícola Mil Vidas, localizada em Ritápolis, no Campo das Vertentes. O proprietário Wander Oliveira conta que tudo começou em 2020, após encerrar uma carreira no setor elétrico. Hoje, a vinícola recebe turistas com um restaurante à la carte, degustações harmonizadas e visitas guiadas aos vinhedos.
“Nosso principal canal de vendas é o enoturismo. A experiência é completa: visita técnica, gastronomia regional e nossos vinhos”, conta Oliveira.
A produção, embora pequena, vem crescendo: foram 10 mil garrafas na primeira safra (2023) e 13 mil na segunda (2024). A expectativa é chegar a até 30 mil garrafas por ano, dependendo da demanda.
“A gente tem uma capacidade de dobrar o nosso plantio inicial. Então a gente pode chegar até um pouco mais de 30 mil garrafas por ano. Mas o ritmo desse crescimento vai depender muito do nosso mercado, do tempo que vai levar para a gente se tornar uma marca reconhecida”, explica o proprietário.

Impostos altos dificultam comercialização
A queixa dos produtores é unânime. Minas Gerais é um dos poucos estados que ainda mantém a cobrança da substituição tributária para o vinho, o que pode elevar a carga de impostos a mais de 20% sobre o valor do produto.
“A gente precisa fazer com que o vinho chegue de fato à mesa do mineiro. Existem entraves, como a carga tributária alta, que impacta diretamente a comercialização”, explica a vice-presidente da UVA, Elcy Caldas.
A UVA reúne atualmente 34 associados em um universo de cerca de 130 vinícolas em Minas. A associação tem dialogado com o governo estadual em busca de melhorias na carga de tributos. “Estamos apresentando dados e mostrando como esses impostos impactam a comercialização. É um setor novo e que precisa ser compreendido em sua especificidade”, conta Elcy Caldas.
“Ainda temos uma carga tributária pesada, como a substituição tributária, e nosso custo é elevado, mas o vinho tem qualidade e regularidade, o que nos torna competitivos”, afirma Wander Oliveira.
“Hoje, para vender com CNPJ dentro do próprio Estado, a gente paga 21,5% de imposto. Isso dificulta muito a competitividade do vinho mineiro”, explica o embaixador da vinícola Stella Valentino, Marcel Gomes.
A supervisora de vendas da Casa Bruxel, Aline Duarte, também destaca o peso dos tributos. “A dupla poda é mais cara, a gente produz com mais cuidado, e mesmo assim é difícil competir por causa da carga fiscal”.
Valorização do vinho mineiro
Em Patos de Minas, no Cerrado mineiro, a Casa Bruxel aposta na diversidade de produtos: além dos vinhos, a marca produz café especial. A supervisora de vendas, Aline Duarte, conta que a vinícola nasceu do sonho da família em produzir seu próprio vinho. “Em 2020, fizemos 3 mil garrafas. Hoje temos potencial para 32 mil, mas priorizamos a qualidade”, relembra.
A maior parte das vendas acontece por e-commerce e também na loja própria, além de distribuição para restaurantes e casas especializadas. Ela acredita que o vinho mineiro precisa ser mais valorizado pelo próprio consumidor. “O brasileiro ainda tem aquele complexo de que o produto de fora é melhor. Mas temos vinhos premiados, feitos com muito cuidado. Falta incentivo do governo e abertura para o consumidor experimentar.”
Elcy enfatiza a importância de o Estado promover o vinho local. “Valorizar o que é nosso não é apenas uma demanda de Minas Gerais, mas do Brasil. O apoio institucional e a redução de barreiras fiscais são fundamentais para que o vinho mineiro ganhe espaço no mercado nacional e, futuramente, internacional”, diz.
Perspectivas e oportunidades
A produção de vinho em Minas ainda é recente, a maior parte das vinícolas tem menos de 15 anos. Mas o setor cresce com consistência, apoiado no enoturismo e na qualidade dos rótulos. A expectativa é que eventos como a Wine Expo BH, ao fortalecer a rede de negócios e dar visibilidade à produção mineira, ajudem a consolidar o vinho como um produto competitivo e cada vez mais presente na taça do consumidor.
Segundo o organizador, a Wine Expo BH já tem data para uma segundo edição, que vai acontecer no ano que vem. “O evento não é só de exposição e degustação. É um evento de conexão e negócios. E conteúdo também”, conclui Dennis Carvalho.
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