Investimento anjo tem retração de 2% no Brasil
Pesquisa realizada pela Anjos do Brasil – organização sem fins lucrativos que fomenta o investimento anjo e apoia o empreendedorismo inovador no País – mostra o quão difícil foi o ano de 2022 para as startups brasileiras iniciantes. O relatório revela que o volume de investimento anjo recuou 2% em 2022 em comparação ao ano anterior (2021), mesmo superada a pandemia. No ano passado foram aportados em startups cerca de R$ 984 milhões pelos investidores-anjos brasileiros.
De acordo com o presidente e fundador da Anjos do Brasil, Cassio Spina, fatores como a guerra da Ucrânia, o ano eleitoral no Brasil, as elevadas taxas de juros e a alta da inflação ajudam a explicar a pouca disposição dos investidores que não têm nenhum incentivo para investir.
“Podemos dizer que ficamos estáveis e que diante do recuo nas outras modalidades de investimento em startups (-44% no total) o investimento anjo se mostrou resiliente. Ainda assim, o resultado é preocupante. Não tivemos uma queda maior porque o número de investidores também cresceu 2%. Precisamos ter um tratamento mais justo e equitativo com outros investimentos. O investimento em startup é tratado como renda fixa. Países parecidos com o Brasil, como os do Brics, por exemplo, têm políticas de incentivo”, explica Spina.
As políticas de equiparação no tratamento tributário foram retiradas do Marco Legal das Startups e especificamente o artigo 7º que previa a compensação de perdas com ganhos, como é feito em investimentos em ações de empresas listadas na bolsa, foi vetado pelo governo e teve confirmado o veto pelo Congresso Nacional em abril de 2022.
“O investimento em startups é penalizado enquanto outros investimentos em empresas bem maiores, como as listadas em bolsa e emissoras de debêntures incentivadas é isento, o que cria um desestímulo para as startups. Temos agora o PL 3466/2019, que voltou a tramitar no Congresso, como uma esperança de que essa situação seja resolvida. O projeto precisa de alguns ajustes para se adequar ao Marco Regulatório, que não existia em 2019, mas é um bom começo”, pontua.
O Projeto de Lei 3466/2019 dispõe sobre o Fundo de Financiamento às Empresas Startups (FiStart) e altera a Lei nº 9.250, de 1995, para permitir que seja deduzida da base de cálculo do Imposto de Renda das Pessoas Físicas (IRPF) parcela dos valores investidos na integralização de capital social em sociedades empresárias startups.
A proposta foi uma iniciativa do senador Randolf Rodrigues (Rede AP) e agora é relatado pelo senador Carlos Viana (Podemos/MG). O texto está pronto para entrar na pauta da Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação e Informática (CCT).
A pesquisa mostra, ainda, que esse panorama não deve progredir este ano. Ao contrário, a perspectiva dos investidores para 2023 é uma redução de pelo menos 4%. Essa é a pior expectativa desde o início da série histórica em 2011, sendo a primeira vez que projetam uma redução nos seus investimentos.
“Apesar da conjuntura ter melhorado, os investidores continuam receosos, especialmente, com a taxa de juros. Acredito que se as promessas de redução da Selic se cumprirem a partir de agosto, o humor dos investidores pode melhorar. Ainda assim, não teremos uma mudança radical. O que pode, realmente, alterar o cenário é uma política de incentivo. Infelizmente ainda enfrentamos uma falta de vontade política. Falta sensibilidade para entender que esse incentivo não é renúncia fiscal, mas investimento em inovação e desenvolvimento econômico”, pontua.
O estudo incluiu pela terceira vez um levantamento de raça ou cor dos respondentes que aponta que a maioria dos investidores-anjos brasileiros são brancos (86%), com 6,6% se declarando pretos, pardos ou indígenas e 5% amarelos. Este dado, associado com a participação de 18% versus 16% em 2021 de mulheres no universo de investidores, traz um sinal de evolução, ainda é lento no ecossistema brasileiro.
Baixa competitividade
O volume de investimento no Brasil é apenas 0,7% do que é investido em startups nos Estados Unidos, que somam aproximadamente US$ 29 bilhões anualmente, por exemplo. Apesar da evolução alcançada na última década no volume de investimento anjo, ainda estamos muito aquém do potencial do País. Considerando que a relação do PIB dos países é de cerca de 14 vezes, o investimento anjo no Brasil deveria ser de pelo menos R$ 10 bilhões.
O relatório da Anjos do Brasil mostra que cada real investido retorna em R$ 5,84 para a economia, sendo R$ 2,21 em impostos; R$ 2,89 em salários e R$ 0,73 em despesas.
O baixo volume de investimentos dialoga diretamente com o vexaminoso desempenho do Brasil no Anuário de Competitividade 2023, produzido pelo International Institute for Management Development (IMD) em parceria, no Brasil, com a Fundação Dom Cabral (FDC).
Entre 64 nações, o Brasil ocupa a 60ª colocação geral, à frente apenas da África do Sul, Mongólia, Argentina e Venezuela. No subfator de infraestrutura tecnológica, o País recuou duas posições, alcançando a posição 57ª, destacando-se nos resultados relacionados à infraestrutura de rede móvel. A rede móvel, sobretudo com a expansão do 5G, é habilitadora para a operação de tecnologias disruptivas e sua escalabilidade. Nesse contexto, o Brasil é o 37º país com mais assinantes de banda larga 4G e 5G e 7º em eficiência dos custos de telefonia móvel para a geração de receita por empresas de telefonia.
“Inovação e empreendedorismo só funciona com investimento. Os investidores, de modo geral, só vão correr o risco se isso for atrativo, ainda que o investimento anjo conte com o fator propósito. A própria OCDE indica que os governos incentivem o investimento anjo. Quem ganha no final é o País. Nenhum país consegue ser competitivo se não tiver inovação. O Brasil tem vocação e capacidade, mas falta condições de estímulo”, completa o fundador da Anjos do Brasil.
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