A devastação da Amazônia

Na Amazônia, além da devastação ambiental desastrosa, está se registrando um fenômeno significativo, que afeta diretamente as populações regionais: índices elevados de hospitalizações por doenças respiratórias relacionadas com a fumaça!
A devastação da Amazônia, em ritmo acelerado, trouxe em 2020 um aumento de 77% de queimadas em terras indígenas, num total de 11.088 km quadrados de desmate; no inicio de 2021, um aumento de 216%; em abril, um recorde: 778 quilômetros quadrados devastados, 45% a mais do que em abril de 2020 (Carta Capital, 21/04/21, 28042021; e 26/05/21).
Segundo dados da Fiocruz e da ONGWWF-Brasil (FSP 30/04/21), uma pesquisa realizada pela OMS mostra que 68% a 70% das internações são atribuídas à presença elevada de material particulado derivado, proveniente das queimadas (100 microgramas por metro cúbico, muito acima do nível normal, 25 microgramas).
Apesar de todas as promessas feitas na Cúpula do Clima, cortou-se quase R$ 240 milhões no orçamento de 2021 destinado ao Ministério do Meio Ambiente, prejudicando os recursos destinados às pesquisas sobre mudanças no clima e efeitos de desertificação, prevenção e controle de incêndios florestais, projetos referentes a áreas de conservação ambiental federais, projetos de desenvolvimento sustentável e conservação do meio ambiente, inclusive urbano. E ainda: um projeto de lei complementar aprovado pela AL de Rondônia no último dia 20, retira 219 mil hectares de duas de suas unidades de conservação (FSP, 22/05/2021).
Grilagem, desmatamento, queimadas, venda de madeira, garimpo, invasões de terras indígenas e de conservação, ameaças de morte e mesmo assassinato de líderes, constituem a realidade corriqueira da Amazônia, sobretudo nesses últimos anos, com o total apoio de políticos da região ligados aos negócios que aí se estabelecem, inclusive a grilagem e a mineração do ouro.
Vale ressaltar que o garimpo tem lugar especial nesse contexto: ligado à lavagem de dinheiro e ativos de corrupção, ao tráfico internacional de drogas e de armas e mesmo à prostituição possibilitam um lucro fabuloso. O comércio ilegal do ouro, fonte inesgotável de riqueza, é estimado em 4,5 bilhões de reais por ano (CartaCapital,21/04/21). Por isso mesmo, os grileiros insistem, juntamente com os outros interessados, na aprovação da regulamentação da mineração em terras indígenas (Projeto de Lei 191), e na regulamentação fundiária de terras ocupadas ilegalmente (Projeto de Lei 510/2021), com lobbies fortes e reuniões frequentes com os responsáveis, inclusive com o vice-presidente, escalado por Bolsonaro para organizar e acompanhar as ações do Ministério do Meio Ambiente. Contam com o apoio das personalidades políticas e partidos políticos da região, tanto municipais como estaduais e mesmo nacionais.
No início do mês de maio, a Polícia Federal e o Ministério Público Federal deram início a uma investigação que buscava desvendar as ligações do ministro do Meio Ambiente com integrantes de duas famílias importantes da região que ocupam grandes áreas de terra e atuam como grileiros, madeireiros, comerciantes de madeira (proprietários da Rondobel Madeiras Ltda, que teve 200 mil metros cúbicos de madeira ilegal, avaliada em R$ 130 milhões, apreendida em novembro 2020)*. A denúncia foi feita pelo delegado federal Alexandre Saraiva, acusando o ministro de favorecimento aos madeireiros, inclusive anulando multas milionárias e antigas das famílias em questão.
Essa denúncia lhe custou o cargo: foi exonerado logo após a notícia-crime ter sido encaminhada ao STF. Sabe-se que a ministra Cármen Lúcia considerou os fatos de uma «gravidade incontestável» e encaminhou processo à PGR (IstoÉ, 5/5/2021).
O ministro continua no seu posto, na qualidade de braço forte da política do Estado, agindo abertamente como protetor dos madeireiros, garimpeiros, reconhecidos devastadores desse patrimônio mundial que é a Amazônia. Nos últimos 12 meses foram 721 canetadas (76 reformas institucionais, 36 medidas de desestatização, 36 revisões de regras, 34 de flexibilização, 22 de desregulação e 20 revogações). Em consequência, desmonte e sucateamento total dos órgãos responsáveis (Ibama, FunaiI, Agencia Nacional de Mineração) pela defesa e proteção da região, pelo orçamento e normas na área ambiental. Consequência? um aumento de 216% no desmatamento (810 quilômetros quadrados, avanço do garimpo em terras indígenas, 12% de focos de incêndio (CartaCapital 5/5/2021). Do outro lado, fiscais, ambientalistas, biólogos e lideranças indígenas são ameaçados, perdem seus cargos e veem suas ações e seus direitos desrespeitados e seus pedidos de socorro não atendidos .
Junta-se a esses horrores o famoso projeto da ferrovia (930 quilômetros), ligando Mato Grosso ao Pará, para a exportação de commodities pelo Norte, que atravessará parques nacionais, florestas e áreas indígenas. Defendido ardorosamente pelos diferentes setores produtivos e grandes multinacionais, e ainda a brasileira Amaggi, Ferrogrão é também um projeto do coração do ministro do Meio Ambiente, que afirma a sua realização, de qualquer forma.
Se não nos unirmos às organizações ambientalistas, humanitárias ou indígenas, se não defendermos com unhas e dentes uma política de defesa da Amazônia, levando em conta a posição dos poderes europeus e suas redes varejistas decididos a evitar importações de commodities provenientes de ecossistemas degradados (com possíveis reflexos nas nossas relações com o Mercosul) vai ser difícil enfrentar esse debacle!
Temos que lembrar que o nosso futuro, do Brasil e do mundo, passa não só pela defesa e a proteção das comunidades indígenas, como, fundamentalmente, pela preservação da floresta amazônica, que leva a umidade e a chuva a todo o planeta, como pulmão do mundo que é!
*O Grupo Rondobel Serviços Florestais esclarece que a sua madeira apreendida, retirada de forma lícita, a partir do manejo florestal sustentável, corresponde apenas a 1/3 de 200 mil metros cúbicos.
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