Alguns avanços e muitos preconceitos

“A mulher pode ser definida como um homem inferior.” (Aristóteles num instante de insensatez machista)
Têm continuidade agora as considerações e reflexões deste desajeitado escriba a respeito das lutas empreendidas, desde sempre, em favor da valorização do papel da mulher na sociedade humana.
Periodicamente é realizada uma Conferência Internacional da Mulher. Encontros dessa envergadura são promovidos com o sentido de criar condições para a quebra de novos elos na gigantesca engrenagem que aprisiona a mulher, em extensas áreas geográficas, sociais, profissionais e culturais, a figurinos de concepção morbidamente machista. Quantas dezenas de eventos iguais, na estrutura e aspirações, se farão necessários ainda, ao longo dos tempos, para facilitar-lhe o acesso por inteiro a direitos naturais, independentemente de sexo, inerentes à condição humana? Alguém poderá argumentar que se está a falar, na verdade, de direitos não desfrutados na integralidade pela grande maioria dos seres humanos. Perfeito. Mas, não há como negar que, também no desfrute dos direitos, a força invasora masculina chegou primeiro e se apoderou dos melhores pedaços nos espaços liberados.
Embora estejam sendo significativos os avanços em conquistas associadas ao desenvolvimento pessoal da mulher, fruto da expansão da consciência coletiva quanto à verdadeira natureza do papel que toca a cada cidadão desempenhar no fascinante e complexo jogo da vida, existe ainda por aí um oceano inteiro de problemas a ser navegado na busca das soluções compatíveis com a dignidade humana.
É chegada a hora de colocar alguns itens do dia a dia nas reflexões. Homem divorciado e mulher divorciada. Homem adúltero e mulher adúltera. Têm, eles, as posturas avaliadas pela sociedade dentro de uma mesma ótica crítica? Desloquemo-nos para o capítulo dos métodos contraceptivos: alguém sabe dizer se o número de vasectomias equivale aos de ligaduras das trompas? E a pílula masculina? Já foi lançada? Se lançada, vai pegar rápido?
Em Estados do Nordeste, segundo denúncia da CNBB, existiam até bem pouco tempo processos de esterilização de mulheres pobres, sem que elas estivessem inteiradas do que se lhes acontecia. Algo inspirado em perversos esquemas importados da China, Índia e outros lugares. Outra denúncia da CNBB: existem penitenciárias – lugares em que já se vive tragédia inimaginável – onde as mulheres costumam se deparar com uma penalização extra. Na falta de absorventes femininos, utiliza-se miolo de pão. Hoje, a mulher já conquistou na maior parte dos países, seu espaço no mundo artístico. Não era bem assim antes. Artista e “rapariga”, para ficar com expressão mais branda, constituíam, na visão estrábica de muita gente, o verso e o reverso de uma mesmíssima moeda.
Montaigne (1580) dizia que lugar de mulher é só dentro de casa. Um mundão de gente reza por essa cartilha. Procedem na lida cotidiana que nem o pessoal lá da rua da minha meninice (episódio narrado no artigo anterior). As janelas ficam trancadas e figuras espectrais se põem a acompanhar, com tiques paranoicos, pela fresta da janela, usando candeeiro para aguçar a visão, o esfuziante processo que corre solto lá fora em favor da emancipação feminina. Fazem ouvidos moucos a justos clamores nascidos do inconformismo, da inteligência e da sensibilidade diante dos paradigmas rígidos bolados pelo farisaísmo na avaliação do comportamento feminino. Paradigmas engessados no tempo. Para pessoal tão retrógrado têm a mesma inexpugnável consistência das muralhas incas de Machu Pichu. Esse tipo de gente não consegue enxergar que se trata de paradigmas irremediavelmente condenados pela doença letal de “certezas” trazidas de momentos obscurantistas que já se imaginava sepultados na voragem da história.
O tema comporta desdobramentos.
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