As várias dimensões da memória e sua importância para as pessoas e a coletividade

Nossa memória é um sistema complexo que envolve diferentes processos e áreas do cérebro. Ela pode ser sensorial tal como o que se vê e se ouve; pode ser de curto prazo e fugaz como um número de telefone que discamos, mas não temos nenhum interesse em reter; ou pode ser de longo prazo. Esta última é a responsável por armazenar informações por um longo período e vai congregar os eventos passados, habilidades e conhecimentos.
As emoções, a atenção e a repetição dos eventos são fatores que podem influenciar de modo muito importante os significados, o armazenamento e a recuperação das informações. Acontecimentos e experiências pessoais são armazenadas no cérebro em uma região específica chamada hipocampo. Já as habilidades motoras como andar de bicicleta são guardadas no cerebelo e gânglios da base. Outros conhecimentos gerais do mundo e seus significados são estocados em áreas espalhadas do cérebro. É uma evolução, pois uma área pode eventualmente sobrepor a outra em caso de uma lesão parcial.
Um tipo de memória muito conhecida e valorizada, pois pode ser desenvolvida de acordo com nossa dedicação é a memória motora ou muscular. Ela é especialmente evidente em atividades que envolvem a coordenação motora fina, como tocar um instrumento musical, praticar esportes, dançar ou realizar tarefas manuais específicas. Mesmo após um período de inatividade, podemos ser capazes de resgatar aquelas atividades já aprendidas, porque nossos sistemas estruturaram fortemente os caminhos que servem de comando para aqueles movimentos.
Além do cérebro, muitas outras células de nossos tecidos possuem memória de seu funcionamento normal. Por exemplo, as células musculares, os fibroblastos (produzem colágeno e conexão entre os tecidos) e as células ósseas se moldam e se adaptam aos estímulos vividos. Desta forma conseguem responder positivamente aos exercícios físicos, sendo capazes de aumentar a sua velocidade de reação, força e resistência na medida que os eventos se repetem. É por isso que apresentamos melhora de nossa performance à medida que perseveramos em nossas metas.
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A memória de onde estávamos e onde chegamos é uma ferramenta preciosa para nos orientar sobre a melhor trajetória a seguir porque ao analisar as lembranças do passado podemos tirar lições para o presente e para o futuro. Os troféus já recebidos no decorrer de nossa jornada devem merecer um destaque especial. Quero significar como troféu qualquer evento positivo tal como o nascimento de um filho, um resgate de um amor, uma formatura, a pacificação de um conflito etc. Cultivar a lembrança desses momentos de realização nos mantém acesa a chama da vida plena, da solidariedade e da gratidão, uma vez que ninguém consegue nada sozinho.
Recordar experiências positivas, momentos de generosidade e atos de bondade que vivenciamos ou somos gratos nos levam a melhorar nossa resiliência emocional, reduzem nosso estresse e aumentam nosso bem-estar geral. Cultivar essa dieta mental cria um ambiente de otimismo dentro de nós mesmos, o que tem impacto direto na qualidade de nosso sono e redução de pensamentos negativos recorrentes. Quando nos deparamos com pisos escorregadios nas várias circunstâncias da vida, nossa experiência nos leva a ter mais cautela, pois já aprendemos a antecipar o futuro.
Para a medicina o tema da perda da memória é recorrente, desde a degradação biológica do envelhecimento até situações médicas do quotidiano como a anemia, depressão, ansiedade, traumas, distúrbios do sono, uso de substâncias psicoativas bem como o efeito adverso de medicamentos de variados tipos tal como antidepressivos, anticonvulsivantes, soníferos e certos analgésicos. Há ainda um importante conceito a ser lembrado para o adoecimento que é a memória reprimida, em que experiências dolorosas são guardadas no inconsciente. Essa situação pode depois influenciar ocultamente o comportamento ou produzir sintomas. Seu reconhecimento e tratamento pode ser a chave para a resolução de conflitos de origem psíquica.
Socialmente, várias dimensões da memória são consideradas, pois toda coletividade reinterpreta e revive narrativas do passado. São tantas as datas comemorativas, tradições, rituais, mitos, símbolos, monumentos, cerimônias, paradas, tradições orais, artefatos materiais, roupas típicas, máscaras etc. que servem como veículos para a preservação da memória e transmissão da identidade cultural de cada povo ou região. É importante ressaltar as manifestações das artes tradicionais como a construção dos jardins, as representações teatrais, as cantigas de roda, a caligrafia, a pintura e a música. E não se pode esquecer ainda das bibliotecas e museus.
Como canta o conjunto Roupa Nova em “Lembranças”: “Ver fotos antigas, ter ao meu lado você”. São memórias eternizadas. Cultivemos as memórias que nos marcaram e construíram uma razão para nosso viver!
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