Chega de heróis solitários nas empresas

Crescer é verbo que se conjuga com dor. Toda trajetória de crescimento envolve desconforto, não tem como “correr” disso. Estou mentindo? Quem já ousou ter a própria empresa, independente do tamanho, sabe que essa é uma sentença honesta com a qual esbarramos com frequência. Não por acaso, empreender costuma significar tomar decisões importantes com menos informação do que se gostaria e mais pressão do que seria prudente. A dor, nesse contexto, é compreensível. A solidão, nem sempre, não mais.
Muitas vezes, essa solidão vem disfarçada de autossuficiência. É comum encontrar líderes que associam maturidade à capacidade de resolver tudo sozinhos. Muitos hesitam em admitir incertezas, como se reconhecer limites fosse comprometer sua autoridade. Ledo engano! Na prática, claramente, o efeito costuma ser o oposto. Os líderes mais eficazes que conhecemos, geralmente, são aqueles que identificam com clareza suas lacunas e sabem, de forma estratégica, buscar os recursos e repertórios que não possuem.
Abrir espaço para o aprendizado, no entanto, ainda é confundido com fragilidade, mas existe uma diferença relevante entre resiliência e rigidez. A primeira permite o aprendizado com o impacto. A segunda insiste em repeti-lo, sob a justificativa da coragem.
No cotidiano das empresas, o fator decisivo em momentos críticos raramente é a genialidade individual. Raramente, mesmo! O que faz diferença é a capacidade de acessar repertórios confiáveis e aplicáveis. Esses repertórios, na maioria das vezes, estão nas experiências acumuladas por outros profissionais e empreendedores que já enfrentaram desafios semelhantes. Chamo isso, habitualmente, de “dom do outro”, entendido aqui não como talento inato, mas como domínio prático, que acelera decisões e reduz riscos.
Ambientes que favorecem a troca de experiências, inclusive sobre falhas, geram um tipo raro de aprendizado: aquele que vem do erro que não se cometeu. Embora esse ganho não apareça diretamente nos indicadores contábeis, ele se expressa na margem, na cultura e na agilidade da empresa ao reagir a mudanças.
A ideia de que vulnerabilidade gera desvantagem ainda persiste em muitas culturas organizacionais. Reconhecer limites não enfraquece uma liderança. Pelo contrário, pode fortalecê-la ao ampliar sua capacidade de conexão e mobilização. No allhands, observamos com frequência situações em que uma dúvida compartilhada leva a uma solução que já foi testada por outra empresa. Essa inteligência distribuída gera valor, reduz desperdícios e evita a repetição de erros comuns.
Veja bem, o que move empresas hoje não é a visão isolada, mas a capacidade de combinar olhares, decisões e competências distintas em torno de um mesmo objetivo. Isso exige estrutura, generosidade e método. Não se trata de abdicar da autonomia, mas de reconhecer que a interdependência pode ser, também, uma forma de liderança lúcida.
Crescer continuará exigindo esforço, mas enfrentar esse processo de forma coletiva costuma ser mais eficaz e menos oneroso. Afinal, é justamente no dom do outro que muitas vezes encontramos o alívio, e até o sentido, da nossa dor.
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