Estamos preparados para o urbanismo de IA?

Demos a largada para uma nova era: a do urbanismo de inteligência artificial (IA). O que até pouco tempo era visão futurista, começa a moldar a forma como cidades brasileiras tomam decisões. Mais do que automatizar dados, a inteligência artificial está assumindo um papel ativo nos rumos urbanos.
Esse movimento marca o fim do “urbanismo inteligente”, centrado na coleta de dados em tempo real, e o nascimento de um modelo ainda mais disruptivo: o urbanismo de IA.
O termo foi proposto em 2024 por Federico Cugurullo, da University of Manchester. Segundo o artigo “The Riseof AI Urbanism in Post-SmartCities”, publicado no “Urban Studies Journal”, estamos diante de uma inflexão crítica. A inteligência artificial deixa de ser mera ferramenta e torna-se agente decisório no espaço urbano. Sistemas passam a aprender com o comportamento da cidade, cruzar múltiplas bases de dados e sugeriu até executar ações.
A diferença é sutil, mas revolucionária. O modelo smart priorizava eficiência e resposta em tempo real. O urbanismo de IA adiciona autonomia adaptativa: as máquinas aprendem, reagem, antecipam.
E é nesse ponto que a transformação se torna mais profunda: a IA vem redesenhando as próprias funções do Estado. O poder público, como o conhecemos, não sobreviverá ileso à lógica algorítmica. Governos que hoje se ocupam de emitir licenças, despachar documentos e operacionalizar processos burocráticos estão a caminho da obsolescência. Uma IA fará isso de forma incomparavelmente mais eficiente e mais justa, claro, se for bem treinada.
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Isso exige uma pergunta radical: qual será o verdadeiro papel da administração pública em um cenário de automação total? Como o Estado se fará presente, necessário e relevante à vida dos cidadãos? Certamente, emitir licenças não será mais parte do escopo de um gestor público em cinco anos.
A cidade exige outro tipo de resposta, uma que não seja técnica, mas humana, sensível, estratégica. O futuro exige do gestor uma reinvenção de si: não mais executor de rotinas, mas mediador de conflitos, tradutor de demandas e guardião do bem comum.
Infelizmente, seguimos presos a uma estrutura arcaica. Muitos gestores ainda operam como se estivéssemos no século passado: perdidos em funções sem sentido coletivo, emaranhados em leis obsoletas e processos jurássicos. Mas o futuro está arrombando a porta. E, se não compreendermos essa nova dinâmica, seremos o quê? Testemunhas inertes de nossa própria irrelevância institucional? Ou atores por exclusão, desprovidos de função pública?
Não basta digitalizar a burocracia. Precisamos transcender a lógica burocrática. A pergunta-chave para qualquer gestor público na esfera do urbanismo, daqui em diante, será: como posso ser necessário à cidade?
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