Meio século depois do desaparecimento de Beto
“Lembro-me com saudade do tio Beto, tocando violão e cantando nas festas da família.” (Maria Claudia, sobrinha de Beto)
Conforme já relatado, em fevereiro de 1971, o sociólogo e jornalista mineiro Carlos Aberto Soares de Freitas, o Beto, 31 anos, líder universitário com forte carisma, engajado em movimentos culturais, políticos e sociais, “desapareceu” sem deixar vestígios. Mais de meio século depois, agora em agosto, em concorrida solenidade, realizada na ALMG, o Estado brasileiro, com pedido de perdão incluso, entregou aos seus familiares e de outros “desaparecidos políticos”, certificado reconhecendo que sua morte foi provocada por agentes públicos, de forma cruel, durante o trevoso período do autoritarismo. Sobrinhos de Beto receberam o documento. Seus pais e seus 7 irmãos, que, por anos a fio, se empenharam em extenuantes, doloridas e frustrantes buscas pelo seu paradeiro, não estiveram presentes ao histórico ato por já terem – para valermo-nos de magistral conceito camoniano – “partido primeiro”.
Filho caçula do casal Jayme Martins de Freitas e Alice soares de Freitas, morava com familiares à rua Espírito Santo, no centro de Belo Horizonte, próximo à Imprensa Oficial. A ruptura democrática em 64 desencadeou detenções em massa, em todo o País. Cassou mandatos, destituiu governantes, suspendeu direitos políticos, implantou clima de medo e sobressalto, incentivando a desonrosa prática do “dedo-durismo”. O meio universitário foi inclementemente alvejado na ocasião. Por fazer públicas suas críticas ao regime recém-instaurado, Beto foi preso nos instantes prefaciais do movimento, sendo libertado por força de habeas corpus, retornando às suas atividades sociais e profissionais, até o fatídico dia de seu “desaparecimento”. A circunstância de haver integrado grupo de estudantes que visitou Cuba, tempos antes concorreu, ao que se imagina, para colocá-lo na lista dos suspeitos, ou então, como se costumava dizer “subversivos”.
Quando se deram conta de que alguma coisa mais grave havia ocorrido com filho mais novo, os pais, irmãos, primos e amigos lançaram-se numa frenética peregrinação por locais utilizados para o encarceramento dos chamados presos políticos. Determinado dia, irmão de Beto deparou-se numa delegacia de polícia, Rio de janeiro, com um cartaz de “procurados”. Entre outras fotos estampadas, chamava a atenção a de Beto assinalada com enigmático X em tinta vermelha. Paralelamente a isso, o chefe da família Freitas, recebeu uma carta assinada pelo próprio Carlos Alberto. Da carta constava a revelação de que o autor a escrevera com antecedência, para remessa, na hipótese de vir a ser preso.
Outros lances da história ficam para o próximo artigo.
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