Mentiras cartográficas: por que o Atlas Geográfico precisa de correção?

“O mapa mente!” (Eduardo Galeano, escritor uruguaio)
A União Africana está reivindicando correção no Atlas Geográfico. Anos atrás, escrevi artigo a respeito. Tomo a liberdade de reproduzi-lo.
Confesso que nunca, em tempo algum, passou-me de leve pelo bestunto a estapafúrdia ideia de que o mapa múndi utilizado em consultas, desde os começos escolares, seja incorreto, oferecendo noção falsa, superavaliada, da grandeza geográfica dos países do chamado 1° mundo. Provocado pelo que conta Eduardo Galeano no livro “De pernas pro ar – a Escola do mundo ao avesso”, resolvi conferir, constatando, arregalado de espanto, que a denúncia do escritor uruguaio está absolutamente certa. A linha do Equador não atravessa a metade do mapa, como aprendemos. O rei da geografia está nu, afirma o autor. E não é que isso já havia sido comprovado, na moita, debaixo de silêncio sepulcral, há mais de meio século, por um cientista alemão de nome Arno Peters?
O mais adequado é deixar a palavra escorrer pela boca do próprio escritor: “O mapa-múndi que nos ensinaram dá dois terços para o norte e um terço para o sul. (…) A Europa é mais extensa do que a América Latina, embora, na verdade, a América Latina tenha o dobro da superfície da Europa. A Índia parece menor do que a Escandinávia, embora seja três vezes maior. Os Estados Unidos e o Canadá, no mapa, ocupam mais espaço do que a África, embora correspondam apenas a duas terças partes daquele território”.
Adotando-se a mesma perspectiva da análise, dá pra ver que a configuração do Brasil, detentor da quarta ou quinta maior extensão territorial entre os demais países, está igualmente desproporcional no atlas. Qual razão dessa desconcertante distorção geográfica? Galeano não deixa por menos: “O mapa mente! A geografia tradicional rouba o espaço, assim como a economia imperial rouba a riqueza, a história oficial rouba a memória e a cultura formal rouba a palavra”. Ele fala do processo espoliativo incessante que tem como alvo os países do Hemisfério Sul. Ou seja, os países do 3° mundo também classificados de “emergentes” pelos “donos do planeta”.
Essa cabulosa história do atlas mutilado deixa-nos com aquela mesma sensação de insuportável desconforto, de tempos atrás, face à revelação de que livros didáticos nos EUA retratam a Amazônia sob controle internacional. Uma coisa parece ter tudo a ver com a outra coisa. O inacreditável, imoral e ilegal redimensionamento cartográfico há que ser visto como um instrumento da mais de irradiação de mensagens subliminares insistentes com propósitos que deixam sob ameaça, em seus direitos, sua cultura, soberania e integridade os países da banda de cá do Equador. Essa é a leitura a extrair dos fatos. Melhor dizendo, dos mapas.
Voltarei a diante a comentar com mais por menores as reivindicações da Comunidade das Nações Africanas.
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