Muito além da Inteligência Artificial

Nos últimos anos, a tecnologia passou de mera auxiliar de serviços para a posição de CEO das empresas. Sim, foi isso mesmo que você leu, CEO. Ela é capaz de realizar tarefas em tempo recorde, dar informações precisas e até recriar cenários mais otimizados. Em meio a esse emaranhado de algoritmos e processamento quântico, surge a necessidade de calibrar os papéis para entender e agir frente a essa dicotomia do presente e do futuro. E, nessa balança entre humanos e IA, pode-se afirmar que os humanos sempre estarão à frente? Pelo que tudo indica, sim, justamente porque o cérebro reptiliano é, ainda, uma das maiores tecnologias da natureza.
No dilema secular “se a vida imita a arte ou a arte imita a vida”, as tensões sobre a capacidade da IA de superar humanos cai feito uma luva como no filme “AlphaGo” (2017). Como acontece hoje, a trama aborda a relação entre humanos e máquinas na decisão sobre quem é melhor no jogo de tabuleiro Go, considerado um dos jogos mais complexos já criados. Ao terminar de assistir, é possível no mínimo duas formas distintas de pensar: uma delas é a de que a IA pode, de fato, superar humanos, ao menos no processamento rápido de informações, como fez ao derrotar o campeão mundial de Go, Lee Sedol. Por outro lado, é possível pensar que toda essa tecnologia e “inteligência” ainda não pode sentir, uma faculdade humana essencial.
Esse vasto debate sobre a potência das máquinas e os seus futuros possíveis, já vem desde a Revolução Industrial, no século XVIII. Se apenas o lado exponencial da IA for levado em consideração, os próximos anos tem um potencial que, para alguns, soa temerário. Um exemplo disso é o relatório do grupo financeiro Goldman Sachs publicado neste ano, que estimou que a inteligência artificial pode fazer um quarto de todo o trabalho atualmente realizado por humanos. Somente na União Europeia e nos Estados Unidos, 300 milhões de empregos podem ser perdidos para robôs.
Por um lado menos alarmista, contudo, o Fórum Econômico Mundial apontou no estudo Futuro do Trabalho 2023, que cerca de 83 milhões de postos de trabalho deixarão de existir nos próximos cinco anos em decorrência da IA. O número é bem menos expressivo que o proposto pela Goldman Sachs, ainda mais se for levado em consideração que a pesquisa estimou que, ao mesmo tempo que exclui, a tecnologia deve criar 97 milhões de empregos. Nos resta aguardar cenas dos próximos capítulos.
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Ao contrário do que alguns imaginam, a inteligência artificial não deve ser vista como um substituto para as habilidades humanas, mas sim como uma ferramenta complementar. A IA possui características únicas, como processamento de grandes volumes de dados e aprendizado rápido, que podem acompanhar a eficiência e a precisão em várias tarefas. Entretanto, ela ainda carece da capacidade criativa, de empatia e do discernimento ético inerentes ao ser humano.
Na atual conjuntura, no qual os algoritmos conseguem captar os gostos, desejos e hábitos dos usuários, a IA acaba sendo uma potente fortalecedora de preconceitos existentes, violando a privacidade e criando dilemas éticos difíceis, que vão desde opiniões políticas até temas de Direitos Humanos. Por isso, o papel da pessoa de carne e osso aqui é garantir que as decisões relacionadas ao campo artificial sejam tomadas de forma ética e responsável, buscando minimizar os danos potenciais e maximizar os benefícios sociais.
E é nesse pensamento fora da cloud que a humanidade ganha, pois a criatividade é uma das características mais distintas e valiosas. A capacidade de pensar “fora da caixa” e experimentar novas ideias continua sendo habilidades exclusivamente humanas. Nesse sentido, a tecnologia acaba sendo uma ferramenta para aprimorar e acelerar o processo de criação, analisar grandes conjuntos de dados, encontrando padrões e insights que os humanos não podem processar em um curto espaço de tempo.
O McKinsey Global Institute divulgou recentemente um relatório sobre a Inteligência Artificial Generativa e o futuro do trabalho nos EUA. O estudo apontou que os avanços na IA têm o potencial de acelerar a automação na economia em 29,5%, ajudando na dinâmica do trabalho. Apesar da ajuda, bem-vinda em muitos casos, vale ressaltar que os números não mentem, mas também não sentem.
Mas nem de todo belo será o futuro da IA lado a lado aos humanos. Em consonância às preocupações sobre o desemprego tecnológico, estudiosos de todo o mundo já apontam para um aumento da desigualdade econômica se os benefícios do progresso tecnológico não forem distribuídos equitativamente. Em um país como o Brasil, por exemplo, onde cerca de 36 milhões de pessoas sequer tem acesso à internet, de acordo com pesquisa do TIC Domicílios 2022, os postos de trabalhos que utilizam uma IA mais avançada não vão conseguir ser alcançados pela grande massa de trabalhadores, formada especialmente por pessoas negras e com mais de 60 anos. Por isso, as lideranças das empresas não podem ser artificiais e precisam desenvolver mecanismos de equiparação. Em suma, precisam sentir e querer para agir.
Nesse ponto, as lideranças das empresas ganham destaque e importância ainda maiores: se você chegou a uma posição de líder, é porque tem, no mínimo, boas habilidades técnicas de gerência. Então, o que pode faltar ou ser melhorado é a habilidade de saber extrair o melhor das pessoas. No cenário atual, a inteligência emocional e as soft skills como um todo são as características mais relevantes.
Já parou para imaginar uma gestão de conflitos gerada pela relação humano vs IA? — Bom, antes era preciso fazer um super MBA. Agora, ir ao museu da empatia pode ser a melhor coisa a se fazer.
Lideranças conscientes e inclusivas são necessárias não somente quando o assunto são os temores ou a empolgação relacionados à IA, mas também pela grande responsabilidade social para fazer com que as empresas estejam preparadas para se adaptar com agilidade aos inúmeros desafios da era moderna, que afetam as pessoas e os negócios em uma velocidade nunca antes vista. É por isso que o self-awareness — que pode ser traduzido como autoconhecimento, em bom português — é uma habilidade essencial a qualquer profissional, mas principalmente para aqueles que lideram pessoas.
O essencial é dizer que, muito além de conhecer a IA, conhece-te a ti mesmo.
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