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 Nova lei do uso de celulares é um reflexo da sociedade brasileira

Questão central vai além da tecnologia e das escolas: trata-se de um comportamento que vem criando raízes na cultura brasileira
 Nova lei do uso de celulares é um reflexo da sociedade brasileira
Foto: Sam Balye / Unsplash

O retorno às aulas este ano trouxe um cenário inusitado: a entrada em vigor da Lei no 15.100/2025, que proíbe o uso de aparelhos celulares por estudantes da educação básica no ambiente escolar. A medida reacendeu debates sobre disciplina, educação e a crescente dependência tecnológica, dividindo opiniões, como sempre, mas também nos conduzindo a uma reflexão acerca da nossa sociedade.

A nova legislação chama a atenção por dois aspectos principais: primeiro, pela necessidade de se criar uma norma para proibir algo que há muito já se sabe prejudicial ao ambiente escolar e ao aprendizado de crianças e jovens. Segundo, pela resistência de alguns pais, que alegam que o celular é indispensável para os filhos, seja por motivos logísticos, seja por razões de segurança. Mas o que se vê, paradoxalmente, é que os responsáveis pela formação dos jovens questionam uma regra que busca justamente resgatar a essência da escola como espaço de aprendizado e de convívio.

Nos últimos anos, as instituições de ensino deixaram de ser apenas locais de transmissão de conhecimento para se tornarem um espelho das dificuldades de nossa organização social. As indisciplinas e transgressões no ambiente escolar são amplificadas pelo uso constante dos celulares, que transformam conflitos e intimidades em conteúdo para redes sociais e o bando de seguidores.

Por sua vez, pais que deveriam cuidar da cidadania de seus filhos se revezam em transgressões e indisciplinas que começam na porta das escolas, sobretudo as particulares, onde o trânsito caótico é sua marca mais notória.

A pergunta que fica é: se no ambiente escolar não estamos conseguindo estabelecer limites de modo organizado e autônomo, dependendo de leis para tanto, o que esperar da sociedade como um todo?
Vivemos num país onde o excesso de leis é frequentemente criticado, mas nos recusamos a cumprir as mais básicas. Como dizia o escritor Fernando Sabino, “No Brasil, lei é igual vacina: umas pegam, outras não”. Pois o cipoal de normas que se acumula ao longo dos anos é resultado direto dessa resistência coletiva em respeitar convenções sociais fundamentais. Se não houvesse tanta dificuldade em acatar regras simples – como a proibição do celular em sala de aula ou o respeito à figura do professor – talvez não precisássemos de tantas imposições legais, de tanta intervenção do Estado.

A questão central vai além da tecnologia e das escolas: trata-se de um comportamento que vem criando raízes na cultura brasileira. Muitos não rejeitam as leis pelo que representam para a coletividade, mas pelo impacto que geram sobre seus próprios interesses. Em uma sociedade em que cada um quer um direito exclusivo para chamar de seu, perde-se a noção do bem comum.

Se quisermos um país menos violento, corrupto e desigual, precisamos começar por onde tudo se forma: dentro da sala de aula. Ensinar as novas gerações a respeitar as regras desde cedo, e ser o exemplo delas, é um passo essencial para a construção de uma sociedade mais justa e organizada. Afinal, uma comunidade só se fortalece quando entende que disciplina e respeito são bases para o progresso coletivo e o bem comum.

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