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Redes sociais e comportamento eleitoral

Redes sociais e comportamento eleitoral
Crédito: Adobe Stock

Todos sabemos que as redes sociais aumentaram a capacidade de socialização e de comunicação entre os indivíduos. Contudo, ainda existem poucos estudos sobre a influência dessas novas formas de interação social digitais no comportamento eleitoral.

A pergunta é: como a nova dinâmica de socialização e de consumo de informação on-line, baseada na atuação de pessoas que produzem, disseminam, consomem e compartilham conteúdo digital influencia na construção da imagem de lideranças, na formação da opinião e afetam a decisão de voto?

Para responder a esta indagação é bastante interessante acessar a Teoria dos Laços, de Mark Granovetter(1973). O autor sustenta que na internet são estabelecidos laços interpessoais e que estes podem ser fortes ou fracos. A força de um laço é definida por Granovetter como “a combinação de tempo, intensidade emocional, intimidade e serviços recíprocos que caracterizam o laço”. Laços fortes são aqueles estabelecidos entre amigos próximos e familiares. Eles formam grupos mais homogêneos e conectados, em que as pessoas se relacionam umas com as outras. Laços fracos são aquelas relações mais casuais, profissionais e entre os amigos dos amigos. Atuam como “pontes” com grupos mais fechados, porque representam o contato de alguém que não está ligado aos seus grupos de amigos próximos, mas a outros grupos. É por meio destes contatos que se conseguiria atingir outros grupos com quem não se tem conexão direta.

Politicamente, laços fortes são importantes para os indivíduos reforçarem as suas crenças, valores e opiniões, uma vez que têm como base semelhanças como classes sociais, relações familiares, religião, proximidade geográfica ou interesses em comum. Laços fracos permitem maior contato com a pluralidade e as diferenças e, muitas vezes, perspectivas conflitantes.

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Nas redes sociais predominam os laços fracos – relações sociais mais difusas e com baixo grau de intimidade. Portanto, o seu estudo mostra-se particularmente interessante para se compreender a dinâmica do debate político, dos movimentos na opinião, como os argumentos circulam nos grupos e como a decisão de voto vai sendo formada.

Alguns autores sustentam que a exposição à diversidade de opiniões, que a interseção com pessoas através de laços fracos propicia é fundamental para a formação de opinião e tem potencial para produzir níveis mais elevados de participação política.

Um aspecto que é necessário destacar, como uma das grandes diferenças que a chegada da internet introduz na política, é a possibilidade de formação de opinião em rede. Uma vez que as pessoas estão interconectadas, um indivíduo com maior poder de influência pode ter aumentada sua capacidade de persuasão, sobretudo em grupos mais homogêneos. Contudo, esta influência, também, poderia “vazar” para outros grupos através das “pontes”, representadas pelos laços fracos.

Neste sentido, a internet, com suas infinitas conexões em rede, potencializa e aumenta exponencialmente a velocidade da propagação da opinião. É desta forma que se pode entender o fenômeno da “viralização” de um conteúdo. E com um agravante, com os chamados “bots” podem-se aumentar, artificialmente, ainda mais o potencial de viralização de um conteúdo que se deseja propagar.

Historicamente, a campanha de Barak Obama, em 2008, à presidência dos Estados Unidos é um divisor de águas na importância do uso da internet nas eleições. O candidato do Partido Democrata utilizou de maneira pioneira a internet para diversas funções: arrecadação de fundos, captação de voluntários digitais, engajamento e mobilização de simpatizantes, geração de conteúdo com objetivo de despertar dúvidas e comentários, provocação de polêmicas para debates e uso intensivo de uma vasta rede de sites e landing pages para disseminação destes conteúdos.

E a campanha de Obama foi além. Criou redes de diálogos, ou seja, promoveu verdadeiramente a interação com os eleitores-internautas, com conversa de mão dupla. E fez a gestão do relacionamento com os eleitores através de ferramentas de CRM (CustomerRelationship Management). Os eleitores eram atendidos, muitas vezes de forma personalizada, eram segmentados, recebiam respostas (através de atendentes físicos ou de ferramentas de marketing de automação) e seguiam sendo monitorados através de um fluxo de relacionamento. Havia o entendimento de que, cada pessoa bem atendida, que fazia uma pergunta e recebia uma resposta atenciosa,representava um voto. 

Contudo, há uma inovação introduzida pelos estrategistas de Obama, que dialoga diretamente com a Teoria dos Laços de Granovetter. O estímulo ao compartilhamento de informações através das próprias redes de interações dos indivíduos, especialmente através dos laços fortes. Mas na medida que a estratégia se mostrava assertiva, a campanha foi ampliando os compartilhamentos para os laços fracos.

A campanha estimulou e usou a tecnologia para intensificar o compartilhamento de informações entre as redes de amigos e pessoas com preocupações semelhantes. Por exemplo, se um eleitor tinha uma preocupação com segurança, e tinha, por hipótese, 100 ou 150 amigos na rede social, que, possivelmente, compartilhavam das mesmas indagações sobre o tema e que poderiam ser possíveis eleitores, ele recebia uma resposta sobre a proposta do candidato sobre a segurança e era estimulado a compartilhar esta informação com seus amigos. 

As pesquisas na Web integradas a essas redes de relacionamentos foram intensamente usadas pela campanha de Obama. As informações geradas pelas pesquisas passaram a ser fatores chaves para a elaboração das estratégias para o direcionamento do discurso, procurando abordar o conteúdo que iria dialogar com os eleitores de forma segmentada e micro segmentada, além de conversar com nichos étnicos e minorias.

A campanha de Obama nos Estados Unidos fez escola no Brasil e muitas das inovações introduzidas por lá foram aplicadas na campanha presidencial de 2010, no Brasil. Inclusive alguns dos estrategistas de Obama ou fizeram palestras por aqui ou prestaram consultorias para alguns candidatos. E mesmo com todas as limitações, sobretudo de abrangência da internet brasileira, as campanhas de Dilma Rousseff e José Serra, em especial, foram os que mais tentaram aplicar as novas técnicas de marketing digital em terras tupiniquins.

Outra campanha nos EUA, em 2016, que garantiu a vitória de Donald Trump a presidente, também foi bastante emblemática no uso das redes sociais, especialmente pela participação da empresa de consultoria Cambridge Analytica, com o uso indevido dos dados de 87 milhões de usuários do Facebook. Mas vamos deixar este tema para um próximo artigo.

O resumo é o seguinte: ainda há muito a se pesquisar sobre a real influência da internet na construção da imagem de lideranças, formação da opinião e decisão de voto. Mas uma coisa é certa, a internet hoje tem um papel decisivo nas campanhas, especialmente nas pré-campanhas, quando as imagens precisam ser moldadas e formadas.

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