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Supersalários: o privilégio que corrói o Estado

Levantamento mostrou que mais de 53,5 mil servidores ativos e inativos ultrapassaram o teto de aproximadamente R$ 46 mil mensais
Supersalários: o privilégio que corrói o Estado
Foto: José Cruz / Agência Brasil

O Brasil enfrenta um problema que já se tornou crônico, oneroso e profundamente injusto: os supersalários no serviço público. Em um país que convive com carências graves em saúde, segurança e educação, é inaceitável que milhares de servidores continuem recebendo acima do teto constitucional.
Levantamento nacional recente, com base em cerca de 50 milhões de contracheques, revelou que mais de 53,5 mil servidores ativos e inativos ultrapassaram o teto de aproximadamente R$ 46 mil mensais. Essa pequena elite, que representa apenas 1,34% do funcionalismo analisado, consumiu cerca de R$ 20 bilhões em um período de 12 meses. É um número que impressiona não só pelo volume, mas pela consequência direta: recursos que deixam de ser investidos onde a sociedade mais precisa.

O problema, no entanto, não é apenas fiscal. Ele expõe uma distorção ética e institucional. A maior parte desses supersalários não decorre de remuneração base, mas de um emaranhado de penduricalhos: verbas indenizatórias, retroativos, bônus de representação, auxílios e outros mecanismos que burlam o espírito do teto constitucional. A lei existe, mas é contornada de forma criativa por carreiras que, paradoxalmente, deveriam ser as primeiras a zelar por sua integridade.

O resultado é um Estado que opera em dois mundos. Os supersalários produzem um efeito corrosivo sobre a gestão pública, eles reduzem a capacidade de investimento em políticas estruturantes, restringem o espaço para modernização administrativa e ampliam a necessidade de ajustes fiscais que recaem sobre toda a sociedade. É um contrassenso: enquanto se discute a necessidade de aumentar arrecadação ou cortar gastos, mantém-se intocado um sistema que beneficia uma minoria amparada por brechas legais.
É hora de enfrentar esse problema com transparência e coragem. Não se trata de contestar carreiras ou funções, mas de corrigir uma distorção que pesa no presente e compromete o futuro.

O Brasil precisa eliminar brechas legais que permitem ultrapassar o teto, reforçar mecanismos de controle e auditoria, dar plena efetividade ao princípio constitucional da responsabilidade fiscal, assegurar que os recursos públicos sejam direcionados conforme critérios de racionalidade, necessidade e impacto social.
A superação dos supersalários é mais do que uma medida administrativa, é um gesto de respeito ao contribuinte e de compromisso com o País. Enquanto esse privilégio persistir, qualquer projeto de desenvolvimento estará condenado a operar com limitações impostas por um Estado que gasta mal e protege excessos em vez de promover eficiência.

O Brasil tem pressa. E a primeira etapa de qualquer agenda séria de modernização passa por tornar o teto constitucional uma regra efetiva, não uma ficção jurídica.

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