As cores da vida

O colorido do mundo sempre causou fascinação. Foi um frisson, por exemplo, a primeira transmissão de TV em cores no Brasil por ocasião da Copa de Mundo de Futebol de 1970, ocorrida no México, em que nosso país se consagrou como tricampeão. O surpreendente é saber que nem todas as pessoas são capazes de usufruir das cores do mundo.
A percepção das cores melhora durante a adolescência, atinge seu ponto máximo por volta dos trinta anos de idade e depois diminui gradativamente, e mais aceleradamente após os sessenta anos de vida. A interpretação da cor azul é a mais afetada, justamente a mais preferida de forma geral pelas pessoas. Mas por que isso ocorre? Entre os vinte e oitenta anos o envelhecimento faz diminuir em 25% a quantidade de neurônios da retina. Cai também pela metade a densidade dos nervos em nosso córtex visual, localizado na região posterior do nosso cérebro, no chamado lobo occipital.
Porém, as pessoas jovens gostam de cores mais brilhantes, em relação às pessoas mais maduras. E à medida que envelhecemos passamos a optar por tons mais escuros. Essa ocorrência universal é natural. Mulheres jovens adoram um roxo ou um vermelho, e homens jovens costumam escolher o verde. Já o amarelo escuro ou marrom são as tonalidades mais preteridas. Agrega-se a isto o fato que cerca de oito por cento dos homens brancos, mas apenas meio por cento das mulheres já nascerem com um defeito congênito que resulta na incapacidade ou uma distorção na percepção das cores. Assim, é muito compreensível a crítica que nós homens às vezes recebemos ao escolher certas combinações de camisas, calças e meias! Com certeza, muitos não têm mesmo a “magia” da capacidade de fazer estas escolhas!
Para a Medicina, as cores têm uma importância especial. A começar pela Educação Médica. Pesquisas demonstram que falta representação da condição de apresentação das várias doenças nas diferentes cores de pele. O diagnóstico na pele mais escura tende a ser mais difícil, e isto é recorrente em certas especialidades como a Dermatologia, Ginecologia, Reumatologia e Urologia, apenas para citar as de maior impacto neste contexto. Com o aprofundamento da compreensão da importância da diversidade, e da inclusão, novos esforços conscientes já se iniciaram. Deve-se superar o etnocentrismo vigente, e dar lugar às ilustrações com casos clínicos e exemplos nas diversas etnias que de fato representam nossa gente.
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Quando ocorre um adoecimento, em várias circunstâncias ocorrem a diminuição da percepção das cores. Isto pode acontecer em até um terço dos Diabéticos, em 78% dos portadores de um tumor cerebral, na vigência de uma Catarata (opacificação de uma estrutura em forma de lente dentro do olho), no Glaucoma (aumento da pressão dentro do olho), nos Autistas, no HIV (AIDS), na Esclerose Múltipla, e até mesmo em enfermidades psiquiátricas como a Psicose e Depressão. Nesta última, o índice de alteração da percepção das cores pode chegar a surpreendentes 63%. Nas doenças relacionadas ao trabalho a deficiência da percepção das cores pode ocorrer nos trabalhadores que lidam com o abastecimento de combustíveis de avião ou outros solventes químicos, e em quinze por centro dos soldadores dentre outras lesões específicas próprias.
Mais instigante é compreender as alterações que ocorrem nos nosso corpo ou em nossos hábitos fisiológicos. Na Cirurgia Ortopédica um cirurgião pode se surpreender com um osso negro. Então passa a pensar nas várias possibilidades, tais como distúrbios do metabolismo, deposição de metais, metástases ósseas, ou até mesmo o uso de certos antibióticos como a Minociclina. Embora raro, mas felizmente reversível é um paciente em tratamento para Tuberculose com o fármaco Etionamida começar a enxergar tudo em tons de azul, condição denominada cianopsia! No Alpinismo de grandes altitudes, após 5.400 m um quarto dos praticantes apresenta diminuição da percepção das tonalidades de azul. Essas alterações felizmente são reversíveis quando retornam.
Outro evento que entrará cada vez mais em cena com o avanço demográfico da senilidade é a síndrome da bolsa coletora com urina roxa. Ela acontece em pacientes em uso de sondas urinárias e com várias doenças crônicas ao mesmo tempo, tais como Diabetes, infecção urinária resistente aos antibióticos, demência, em hemodiálise, e constipação intestinal na concomitância de insuficiência renal. As causas são a produção bacteriana de certas substâncias da cor azul que tingem a urina, um pH urinário mais alcalino, ou o supercrescimento de certas bactérias intestinais que produzem o pigmento azul que por vias metabólicas passam para a urina.
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