As filmagens em Machu Picchu

CESAR VANUCCI *
“Como que por milagre, um raio de sol rasgou a cortina de chuva…” (Relato de Augusto Cesar Vanucci, no livro “De Ave Cesar a Ave Cristo”)
Adonde estávamos mesmo? Ao interromper nossa conversa, falávamos de lembranças suscitadas pelos especiais de fim de ano de Roberto Carlos, tendo em vista os fortes laços de amizade que uniam o consagrado cantor e compositor ao saudoso mano Augusto Cesar Vanucci, premiadíssimo diretor e produtor de televisão. Prometemos pra hoje, por inteiro, a história de inusitada ocorrência vivida por ambos, junto com todo o pessoal engajado na produção do programa, no teto majestoso dos Andes, por ocasião das gravações feitas nas fascinantes e místicas paragens de Machu Picchu.
Voltamos a dizer, com convicção plena, que ali se viveu, com certeza, o mais empolgante momento da vitoriosa série de espetáculos. A equipe liderada por Augusto chegou a Cuzco para as gravações numa hora bastante conturbada. O Peru achava-se mergulhado em grave crise político-militar. No aeroporto da antiga capital do chamado império inca não havia ninguém para receber a comitiva. Muitas horas se escoaram antes de se conseguir o transporte de passageiros e bagagens para o hotel. Roberto Carlos foi levado numa viatura, fortemente armada, do Exército. O comandante militar da área, seu admirador, aquiesceu ao pedido de transportá-lo. Alguns carros e motos, pilotados por pessoas que ousaram “furar” a greve geral decretada, conduziram o restante da tropa da Globo debaixo de muita correria e apreensão, ao local de destino. Durou mais de semana a retenção forçada de todos no hotel, até que pudessem pegar o trem que, serpenteando lindíssimas paisagens da cadeia montanhosa andina, os deixasse em Machu Picchu.
Lá chegados, os visitantes se defrontaram com outra circunstância adversa. Chuva que Deus dava. O temporal – descreve Augusto Cesar – “atirava sobre nós pedras de gelo, como se nos estivesse sendo recriminada a invasão do soberbo santuário”. Por causa disso, a gravação ia se tornando quase impossível. Os equipamentos foram colocados ao abrigo da tempestade. Pesada lona envolveu o helicóptero cedido pelos militares para as tomadas aéreas da apresentação de Roberto Carlos no ponto mais elevado da “cidade sagrada”. Uma expectativa nervosa dominava o ambiente. Todo mundo ficou de prontidão à espera de que os elementos da Natureza, àquela hora em perturbadora ebulição, se aquietassem. O improvável, o imprevisível, o inesperado, ou que outro nome exista para designar o fato, aconteceu. Num dado momento, apoderado de fervorosa e serena certeza, diante da estupefação dos companheiros e demais pessoas à sua volta, Augusto Cesar anunciou: “Preparem-se todos, porque vamos gravar daqui a instantes.”
Ele, Augusto Cesar, com a palavra: “Caminhei, decidido, até o centro da cidade, erguida no ar como uma prece e fiz uma oração. Pedi aos espíritos dos Incas que intercedessem junto às forças indomáveis da Natureza”.
Evocando lances da invasão e saques sangrentos promovidos, no passado, pelos espanhóis, na conquista do território peruano que levaram à derrocada do chamado “império inca”, Augusto, conforme registra em seu livro, acentuou em sua oração que os acontecimentos tristes daquela época precisavam ser redimidos pelas gerações. Era o que se propunha a fazer, levando a todos os cantos do mundo, como fruto do trabalho de comunicação e arte que estava produzindo, “a beleza da cultura de um povo que acreditou numa nova vida, num mundo melhor”.
O que se segue é o texto integral, sobre o episódio, relatado na página 40 do livro “De Ave Cesar a Ave Cristo”.
“Como que por milagre, um raio de sol rasgou a cortina de chuva e iluminou a bela cidade de Machu Picchu. Fiz sinal para os companheiros. Em instantes, lá estava Roberto Carlos cantando uma canção que falava de latinidade e de esperança. Após a gravação, a chuva voltou a cair, copiosa. Todos que participamos do extraordinário acontecimento, achávamo-nos extenuados, mas emocionados e felizes.”
O fecho da história não é menos desconcertante. Augusto Cesar ainda falando: “Quando estive no Egito na realização de outro trabalho profissional, liguei a TV e lá estava Roberto Carlos cantando em Machu Picchu. Naquele momento, Machu Picchu me pareceu monumento mais importante que as pirâmides. O mesmo aconteceu, depois, no México e na Itália. Acredito ter sido cumprida a promessa feita aos deuses incas. Singular coincidência essa de assistir a espetáculo vivido num sítio arqueológico importante, que tudo tem a ver com a aventura humana, em países que se notabilizaram por localizar outros centros arqueológicos ricos em cultura e mistério. Ou não terá sido, simplesmente, coincidência?”
* Jornalista ([email protected])
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