Opinião

As neves do Chacaltaya (II)

As neves do Chacaltaya (II)
Crédito: Pixabay

“Chacaltaya, Kilimanjaro, rios Jordão e Colorado são prova de que a Natureza não está nada satisfeita com as aprontações humanas agredindo o meio ambiente.” (Antônio Luiz da Costa, educador)

Retomemos a narrativa sobre Chacaltaya, a imponente montanha com 5400 metros de altitude situada na parte andina da Bolívia, a curta distância de La Paz. De seu topo tem-se uma visão panorâmica de estonteante beleza da Cordilheira. Mas a estação de esqui com as pistas mais elevadas do mundo, do fascínio dos apreciadores do emocionante esporte, não existe mais. A neve se desfez, como já foi dito. Até o final dos anos 80 e começo dos anos 90 o espetáculo soberbo dos tapetes de neve ainda podia ser contemplado pelo olhar extasiado daqueles que chegavam, por uma estrada encaracolada até a parte superior do monte.

Em determinada ocasião, pela televisão, chegou a notícia de que Chacaltaya deixara de existir como referência para os adeptos da esquiagem. O aquecimento global foi apontado como a causa da transformação que se operou no cenário. Ou seja, a situação foi provocada pela apavorante e incontrolada ação predatória humana, responsável por mudanças climáticas que começam a cobrar, em tudo quanto é canto deste planeta azul, pesadíssimos tributos à sociedade. Colocando em xeque, ao mesmo tempo, a própria sobrevivência da espécie.

Chacaltaya reprisou a tragédia ecológica do Kilimanjaro, na Tanzânia. As neves do Kilimanjaro – recordam-se? – inspiraram um conto famoso de Ernest Hemingway. Por muitos, considerado o mais belo texto do genial autor. O enredo rendeu também filme assistido por milhões. Lá, também, no Kilimanjaro – com seus 5.891 metros (ponto mais alto da África) e 75 mil hectares de florestas, fauna rica e grande número de espécies ameaçadas de extinção –, patrimônio da humanidade na classificação da Unesco, neve não tem mais. O degelo retirou a camada alva que emprestava beleza singular ao lugar. As causas são as mesmíssimas: efeito estufa.

Os estragos provocados pela insensibilidade humana no uso das dádivas que a Natureza concede podem ser detectados ainda em outros sítios legendários. O rio Jordão, cenário de acontecimentos transcendentes na história da civilização, não passa hoje de um filete d’água. O Mar Morto, desaguadouro natural do rio, está se transformando num estéril depósito de cristais salínicos, onde a vida vem parando de pulsar.

O que acontece com o rio Colorado, que atravessa os territórios estadunidense (o Grand Canion incluído) e mexicano, com seus 2.320 quilômetros de extensão, é igualmente inacreditável e atordoante. O lendário rio alimenta numerosas represas, barragens, diques, canais de irrigação, está aberto à navegação, mas vem perdendo a olhos vistos sua capacidade caudalosa. A tal ponto que já não dispõe de condições para despejar água no oceano. Está morrendo antes de chegar ao estuário! Não é o único nessa condição. Segundo os especialistas, um em dez rios, nos vários continentes, já não corre mais em direção ao mar.

Resumo da ópera: o quadro de avisos do Planeta está repleto de recados. Recados para serem ouvidos. Falam de coisas diversificadas e relevantes. Coisas a serem também enxergadas. Advertem dos perigos à vista. Alertam sobre urgentes e inadiáveis correções de percurso.

Bravia, indômita, indócil, a Natureza não para de passar recados. Perturbadores, aterrorizantes, muitas vezes. O ritmo das informações derivadas de fenômenos singulares, registrados na terra, na água e no ar, é, a cada momento, mais frenético. Chacaltaya é prova disso.

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