O que a catástrofe do Rio Grande do Sul pode nos ensinar
O Rio Grande do Sul está vivenciando aquela que talvez seja a maior catástrofe natural de sua história. Com dezenas de mortos e desaparecidos, centenas de feridos, milhares de desabrigados, dezenas de milhares de deslocados, e centenas de milhares sem acesso básico a serviços públicos, a calamidade pública instalada nos obriga a questionar: já não passou da hora dos líderes públicos incluírem a resiliência climática no ciclo de políticas públicas?
Muito se diz a respeito da necessidade de redução das emissões de gases de efeito estufa para combater as mudanças climáticas, processo a que chamamos mitigação climática. Porém, muitas pessoas esquecem de um outro conjunto de medidas tão ou mais importantes que não objetivam eliminar as causas das mudanças climáticas, mas sim diminuir os impactos negativos delas para as pessoas e demais seres vivos: a resiliência climática.
O Brasil nunca teve como seu forte o planejamento, prova disso é que não é raro ouvirmos por aí que a melhor forma de planejar é fazendo. Essa mentalidade, provavelmente oriunda de um país abençoado por Deus, com poucas catástrofes e abundantes recursos naturais, precisa modificar urgentemente se quisermos sobreviver em tempos de mudanças climáticas e de intensificação dos eventos naturais extremos.
É inconcebível que os municípios e estados brasileiros ainda não tenham planos de resiliência climática. É inconcebível que autoridades ainda se mostrem surpresas com a ocorrência desses fenômenos, quando o Centro Nacional de Desastres Naturais (Cemaden) tem registrado o crescimento do número de desastres no Brasil (1.161 só no último ano). A urgência cresce quando consideramos que, em média, um desastre ocorrido no Brasil afeta diretamente cerca de 4 mil pessoas e que esse número também vem aumentando.
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Não há, portanto, nenhuma novidade ou surpresa no que está acontecendo. O que há é uma completa letargia do poder público que, mesmo diante de robustos indícios científicos, ainda se omite na construção das bases para a resiliência climática.
A gestão de riscos relacionados às mudanças climáticas já é uma obrigação pelo menos desde 2015, com o Acordo de Paris, e não há outro caminho para se construir essa gestão a não ser baseando-a em dados e evidências. Os municípios e estados precisam mapear com precisão as áreas que possuem maior potencial de serem afetadas pelos efeitos adversos das mudanças climáticas. Em paralelo a isso, é necessário que adotem medidas efetivas para reduzir a vulnerabilidade de pessoas e animais nessas áreas, além de criar condições e canais seguros para atuação, quando esses eventos acontecerem.
A catástrofe do Rio Grande do Sul demonstra que as pessoas não estão preparadas. De um lado, a maior parte dos cidadãos não sabe o que fazer diante do infortúnio. De outro, as autoridades não possuem meios adequados para agir. Em muitos municípios não há espaços públicos preparados para evacuação, os meios de monitoramento dos riscos são frágeis, os meios de alerta da população praticamente inexistentes.
É claro que, neste momento, nossas atenções estão voltadas para as inundações, mas há outros eventos extremos, como as secas intensas e as ondas de calor, para os quais também devemos estar preparados. A água que abunda e destrói agora é a mesma que faltou há alguns meses nesse mesmo Rio Grande do Sul.
Nunca foi tão necessário que os líderes públicos, empresas e cidadãos assumam suas responsabilidades e façam sua parte, pois os grandes prejudicados serão pessoas e animais, independentemente de classe social, cor ou gênero.
Como dizia Gandhi: “Não agir diante do mal é se tornar cúmplice desse mesmo mal.”
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