Caminhos sustentáveis

Como orientar a reconstrução do Rio Grande do Sul?

Neste momento, um dos elementos mais importantes é fazer com que as ajudas recebidas cheguem o mais rapidamente possível a quem precisa

Tem sido reconfortante ver como a esperança está vencendo a tristeza nessa tragédia que assola o Rio Grande do Sul. Não se trata apenas de ajuda material, mas de grupos grandes de pessoas se deslocando para ajudar, da maneira como podem, a resgatar pessoas e animais em perigo. Uma força e uma união que dão esperança de que as coisas podem mudar.

Com base nesse espírito de solidariedade, gostaria de te convidar a refletir comigo a partir de três perguntas e suas possíveis respostas.

Como estabelecer parcerias capazes de receber e alocar recursos de forma ágil e honesta?

Neste momento, um dos elementos mais importantes é fazer com que as ajudas recebidas cheguem o mais rapidamente possível a quem precisa delas.

Dado o rigor burocrático que a administração pública tem, na minha visão, essa responsabilidade deve ser assumida por um conselho de entidades da sociedade civil que sejam reconhecidas como idôneas. Esse conselho deve estabelecer os critérios para seleção de beneficiados, para quantificação do benefício a ser recebido por cada família e, também, determinar critérios de transparência, fiscalização, prestação de contas e monitoramento de resultados.

O conteúdo continua após o "Você pode gostar".


A participação da administração pública nessa governança deve ser apenas a de oferecer suporte, principalmente com logística, infraestrutura e segurança. Seu foco deve ser no restabelecimento, o mais rapidamente possível, dos serviços públicos interrompidos.

Quais são as áreas que podem ser habitadas e quais não devem?

Dado que eventos extremos como este devem se tornar cada vez mais comuns, a pergunta, embora incômoda, precisa ser respondida neste momento, pois depois as pessoas esquecem e a sua importância decairá.

Esse questionamento é importante por pelo menos 3 razões: A primeira é que é melhor prevenir do que remediar. Estudos das Nações Unidas demonstram que os investimentos em prevenção são de 4 a 10 vezes menores do que os danos causados pelas tragédias. Assim, ao evitar a construção em áreas de alto risco, podemos prevenir desastres antes que eles ocorram. Isso não apenas economiza dinheiro, mas também salva vidas.

A segunda é que o dinheiro gasto na reconstrução de áreas propensas a desastres se perderá quando novas tragédias acontecerem. O Brasil ainda é um país com muitas deficiências em uma série de serviços públicos, como educação, saúde e infraestrutura, e não pode se dar ao luxo de jogar dinheiro fora.

E a terceira é que, hoje, temos à disposição uma série de modelos 3D e outras técnicas capazes de identificar com precisão quais são as áreas que mais correm risco. Ignorar conscientemente essas informações é ação dolosa que causa perda patrimonial e dano ao erário e está prevista no artigo 10 da Lei 8.429/21 como ato de improbidade administrativa.

Por fim, o que será feito com as áreas que não podem ser habitadas?

As prefeituras possuem diversas opções.

Tokio, no Japão, investiu pesado na construção de um enorme sistema subterrâneo de escoamento de água para resolver o problema das enchentes.

Nanchang, na China, e Copenhagen, na Dinamarca, construíram parques urbanos que se alagam para armazenar água, prevenindo enchentes e realimentando o lençol freático. Os parques também ajudam no controle de temperatura, poluição do ar e umidade urbana. Eles também auxiliam na manutenção da biodiversidade, uma vez que possuem diversas árvores nativas e animais, e ainda servem como local de lazer para a população. Além de tudo isso, sua construção é muito mais barata.

Ainda em Copenhagen, na Dinamarca, e em Bangkok, na Tailândia, os governos optaram por fazer as duas coisas ao mesmo tempo. Na superfície, um grande parque que coleta e armazena água e, embaixo dele, um enorme sistema de tanques com capacidade para armazenar água extra que supere a capacidade de armazenamento do parque.

Amsterdam e Rotterdam, na Holanda, aproveitaram seus muitos canais e terras inundadas para construir casas flutuantes. De maneira que quando a água sobe o único efeito sobre as pessoas é uma possível turbulência.

As Maldivas levaram a ideia de casas flutuantes ainda mais longe. A 30 km da capital, Malé, está sendo construída uma cidade inteira que flutua sobre água.

Londres, na Inglaterra, resolveu remodelar ruas, reduzir o espaço para carros e expandir as áreas verdes com a criação de novos jardins e plantio de novas árvores.

Seul, na Coreia do Sul, decidiu mexer diretamente no rio Cheonggyecheon, que além de ter sido descanalizado, recebeu às suas margens um parque linear com 400 hectares repleto de opções de lazer e áreas verdes. Além disso, diminuiu as ruas ao redor para ampliar as margens e fez trabalho similar em seus afluentes.

A Bósnia e Herzegovina, depois da maior inundação de sua história, em 2014, alargou, desassoreou e aumentou a profundidade do rio.

No Brasil, nas áreas rurais, é muito frequente encontrarmos buracos, piscinas, lagos e lagoas que são cavados para armazenar a água nos meses mais chuvosos e garantir o seu fornecimento em períodos de estiagem. Alguns desses sistemas já utilizam uma cobertura feita de placas solares flutuantes que diminuem a evaporação e aumentam o provimento de energia sustentável.

Diante de tantas opções, espera-se que a administração pública não considere deixar as áreas abandonadas. Em diversos lugares, já se observou que, quando essas áreas são deixadas de lado, pessoas com dificuldades habitacionais tendem a ocupar esses espaços, o que resulta em uma situação ainda mais trágica quando as águas voltam a subir.

Rádio Itatiaia

Ouça a rádio de Minas