COP30: o último dia
Demorei a escrever este último artigo sobre a COP30 porque ainda alimentava a esperança de que os líderes mundiais adotassem uma visão de futuro mais inspiradora e conseguissem produzir um texto final capaz de superar a triste imagem do incêndio. Mas, apesar das negociações terem avançado madrugada adentro, a publicação do documento não trouxe alívio.
O resultado revela, por trás de palavras suaves, a dura verdade: seguimos presos a atitudes vazias. Nem mesmo as supostas boas notícias conseguiram sustentar a “COP da Verdade”, como foi chamada pelo presidente Lula. Um exemplo é o das NDCs. À primeira vista, poderia parecer positivo que as novas contribuições nacionais tenham reduzido a projeção de aquecimento de 4 °C para cerca de 2,5 °C. Porém, essa leitura ignora que a meta real é 1 °C menor. Em outras palavras, trata-se apenas de uma forma elegante de admitir que não alcançaremos o objetivo estabelecido no Acordo de Paris.
Outro propósito da COP30 era fortalecer a implementação. A submissão das NDCs de 122 países e de 71 planos nacionais de adaptação poderia soar como avanço. Mas a realidade é que 75 países ainda não apresentaram seus compromissos, a maioria deles em desenvolvimento, e grande parte dos que o fizeram evitou reforçar metas de curto prazo, empurrando o problema para o futuro. O Brasil seguiu essa lógica: não agir agora e deixar a responsabilidade para quem vier depois. Para os 181 mortos do Rio Grande do Sul, não houve um depois. Para quantos de nós ele existirá?
O mesmo padrão se repete no tema do financiamento. Todos sabem que não há implementação sem recursos, mas quando o assunto é dinheiro os países ricos recuam. O texto reconhece a necessidade de ampliar o apoio financeiro aos países em desenvolvimento e alerta que o custo da inação será muito maior do que o de agir de forma eficaz e oportuna. Na prática, porém, nem mesmo os 300 bilhões de dólares prometidos na COP anterior foram repassados. O documento aprovado insiste em reafirmar a meta de mobilizar esse valor até 2035, mas trata como se fosse uma aspiração, quando na verdade deveria ser uma obrigação.
Não é preciso insistir na ausência de referências ao fim dos combustíveis fósseis e ao desmatamento, já amplamente apontada. O que impede que o resultado seja considerado um fracasso absoluto é a atuação propositiva da diplomacia brasileira, que apresentou instrumentos e caminhos voluntários com potencial de se tornarem relevantes. Entre eles estão o TFFF, o mecanismo de transição justa, o Acelerador Raiz para recuperação de terras degradadas, o Desafio Azul voltado aos oceanos, a Rede Global de Paisagens Marinhas, o Painel de Implementação de Soluções Oceânicas, o Kit de Ferramenta da Biodiversidade Marinha e Saúde dos Oceanos, o Global Biochallenge para a bioeconomia, o Global Implementation Accelerator e a ampliação da coalizão JREDD+.
Com tantas iniciativas, seria possível chamar a COP de sucesso? A resposta é não, por duas razões. Primeiro, porque todos esses mecanismos são voluntários: se os países não quiserem participar, nada os obriga e os instrumentos morrerão de inanição. Segundo, porque não enfrentam as causas centrais da crise climática e tampouco têm força suficiente para construir os sistemas de adaptação necessários. Eles ajudam, mas não resolvem. Pior: podem reduzir a pressão política e aumentar a letargia diante das soluções que realmente importam, aquelas que passam obrigatoriamente pelo abandono dos combustíveis fósseis e pela contenção do desmatamento.
Infelizmente, nem o fogo foi capaz de ensinar aos negociadores que, diante de uma urgência, não basta reconhecer que as chamas avançam, falar sobre a urgência de apagá-las, prometer baldes de água para o futuro, discutir quem carregará a água e de onde ela virá. As mudanças climáticas são um incêndio que continua a consumir vidas humanas e a COP30, que poderia mudar esse panorama por ser a COP da Verdade, a COP da Floresta, a COP da Ação, termina apenas com a fumaça das promessas e ficará gravada para sempre como a COP do calor, do despreparo, da incompetência, da falta de água, do incêndio, da insegurança.
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