Caminhos sustentáveis

Momento da realidade: chegamos ao fim do idealismo climático?

Não importa o quanto na realidade física os interesses se subordinam ao clima

Essa semana, li um artigo escrito por Mike Hulme, um dos cientistas climáticos mais renomados do mundo. Segundo ele, sua jornada de 40 anos com as mudanças climáticas mudou de idealista para pragmática e agora para realista. E a realidade é que “a verdade científica de um mundo em aquecimento e a crença de que o mundo se alinhará, guiado pela ciência e pela diplomacia se alicerçam em um racionalismo ingênuo, que não considera a verdade geopolítica de que o poder e os interesses prevalecem”.

Uma mensagem extremamente pessimista de um dos ícones da luta pelo combate às mudanças climáticas e que nos leva a pensar sobre o que está acontecendo. Mike é taxativo: “Em vez de a geopolítica se dobrar às realidades de um clima em mudança, o oposto aconteceu.”

Nesse período, a geopolítica mudou substantivamente. Há 40 anos, ainda vivíamos a Guerra Fria. De lá para cá, o Muro de Berlim caiu, a globalização se acelerou e depois regrediu, duas crises financeiras globais aconteceram, a China se tornou uma grande potência tanto em termos econômicos quanto políticos, movimentos nacionalistas se espalharam pelo mundo, as instituições multilaterais perderam eficácia. E enquanto tudo isso acontecia no cenário geopolítico, o mundo ainda precisava aprender a como lidar com o desafio global do clima.

É claro que, em um contexto dinâmico como esse, a linguagem, a retórica e a “propaganda” em torno das mudanças climáticas precisava se adaptar, mas isso não aconteceu. A falta de estratégias bem construídas para lidar com a questão climática ou o fracasso das pseudo-estratégias criadas impediram que os elementos necessários para adaptação do caminho (conciliação de interesses e decisão pragmática) se formassem e, com isso, qualquer alteração colocava em risco o objetivo principal.

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Isso não coloca dúvidas sobre a importância da questão climática, não há mais espaços para questionamentos a respeito da veracidade da crescente influência humana no clima. E, também, é nítido que esta é uma realidade que todas as nações precisam confrontar. Portanto, não há mais problema sobre conhecimento da realidade.

O que há é uma enorme incapacidade de reconhecer que os interesses dessas nações precisam ser conciliados e que, na abstração da mente humana, não existe subordinação entre os interesses e o clima. Não importa o quanto na realidade física os interesses se subordinam ao clima. Yuval Noah foi preciso ao afirmar que é a propensão humana à ficção que deu aos Sapiens a capacidade de reunir grandes bandos e isso só é possível porque a ficção é tão forte que se sobrepõe à realidade física.

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