Como lidar com a “quiet ambition”
Um dos desafios mais presentes no mundo corporativo é lidar de forma madura e construtiva com o choque geracional. Por um lado, a nova geração, tipificada como Z, invade os escritórios trazendo sua reivindicação por mais qualidade de vida e bem-estar.

Por outro lado, gestores da chamada geração X, mais tradicionais, trazem um viés de total adequação à aspereza das relações corporativas, que caracterizam o foco prioritário e incondicional na busca por resultados.
Nessa relação, invariavelmente conflituosa, não param de proliferar tendências de comportamento que deixam clara essa dicotomia de visão de mundo. A mais conhecida é o quiet quiting, demissão silenciosa, que discute o limiar das tarefas profissionais atrelado ao que está estritamente definido no job description, ou ainda, fazer o mínimo para concluir o trabalho necessário, mas fazendo isso bem.
Ainda na esteira dessa polarização, mais um movimento emerge, o chamado quiet ambition, caracterizado pela falta de interesse dos profissionais, principalmente jovens da Geração Z, em assumir posições de liderança.
O conteúdo continua após o "Você pode gostar".
A que se deve esse movimento? Seria uma tendência? Até esse momento o máximo que podemos fazer é especular. E, nesse exercício de “achologia”, podemos citar prováveis causas que levam a geração Z a optar por não se tornarem líderes. Vamos a algumas possibilidades:
1. Pressão e estresse crescentes: A ciência já provou que quanto maior a altitude, menor a pressão atmosférica. Essa lógica não se aplica as leis do mundo corporativo. Nele, quanto mais próximo do topo da pirâmide, maior a pressão por resultados. A busca por qualidade de vida e bem-estar parece fazer com os “Zs” evitem essa carga emocional adicional.
2. Jornadas de trabalho ampliadas: A experiência prática de décadas nos mostra claramente que cargos de liderança geralmente exigem mais horas de dedicação, o que tende a interferir no equilíbrio entre vida pessoal e profissional.
3. Problemas em liderar times: A gestão de pessoas pode ser um desafio para alguns jovens talentos, e nem todos se sentem confortáveis ou preparados para isso, especialmente se convidados a assumir times que, até pouco tempo, eram formados pelos colegas com os quais se acostumaram a colaborar e cocriar.
4. Modelos estereotipados de liderança: O mito de que a liderança é uma posição solitária pode desencorajar jovens que veem na colaboração a chave para produzir resultados consistentes e duradouros.
5. Desejo de autenticidade: Os novos profissionais buscam uma vida profissional equilibrada e autêntica e assumir posições de liderança pode suscitar dúvidas sobre qual identidade eles deverão assumir prioritariamente na empresa: a do líder que abre mão do que pensa pela defesa dos interesses corporativos ou do profissional que não abre mão, em qualquer circunstância, de dizer o que acredita.
Proponho trazer essa discussão para a ótica do movimento global conhecido como Capitalismo Consciente, cujo objetivo está na transformação do modelo econômico atual, focando não apenas no lucro, mas também na responsabilidade social e ambiental das empresas. Ele é baseado em quatro pilares: liderança consciente, orientação para stakeholders, propósito maior e cultura consciente.
A liderança consciente, um dos pilares do Capitalismo Consciente, enfatiza a necessidade de pensar no coletivo e estimular o engajamento e a colaboração da equipe. Isso contrasta com a mentalidade individualista tradicionalmente associada a cargos de liderança.
A lógica da liderança consciente vai ao encontro do posicionamento da Geração Z diante da realidade dos negócios e que, em última análise, motiva o quiet ambition, confirmando uma rejeição à mentalidade individualista e ao foco exclusivo no lucro que caracterizam o capitalismo tradicional.
Tanto o Capitalismo Consciente quanto a Geração Z questionam e buscam transformar as práticas tradicionais de negócios. Ambos valorizam a colaboração, a sustentabilidade e o bem-estar coletivo em vez do lucro a todo custo.
Diante do exposto, proponho nesse texto a defesa de uma visão articuladora e conciliadora. O que precisamos, de fato, é reinventar o papel do líder, dar a essa posição a devida humanidade e sensibilidade para migrar da visão heroica e solitária de comandante para outra, de agente de transformação “com” os times e não “por meio” deles.
Nesse sentido, o Capitalismo Consciente, uma vez integrado ao mindset empresarial, pode cumprir sua missão de gerar bem-estar a todos os stakeholders, internos e externos à organização, oferecendo a Geração Z, finalmente, o pano de fundo perfeito para motivá-los a liderar.
O senso de propósito presente nesse movimento traduz a ambiência perfeita para que os jovens profissionais entendam a liderança como uma oportunidade única de transformar o que eles combatem, oferecendo a chance real de gerar resultados consistentes e fazendo do lucro uma consequência natural e não um fim em si mesmo.
Estarei sonhando? Acredito que não. Mais do nunca, a real transformação é possível e até mesmo os descrentes podem se tornar os grandes aliados.
Ouça a rádio de Minas