Capitalismo Consciente

Maternidade e carreira

Estudo divulgado pela FGV mostra que a probabilidade de emprego das mães no mercado de trabalho formal aumenta gradualmente até o momento da licença-maternidade, e decai depois

“Provavelmente, suas gestações atrapalharam essas iniciativas, o que poderá ser compensado no futuro.” Foi esse o parecer que, no final de 2023, uma pesquisadora do curso de Relações Internacionais de uma universidade federal brasileira, recebeu do Conselho Nacional Científico e Tecnológico (CNPq). O parecer com a negativa foi dado em resposta à solicitação de uma bolsa de produtividade, que é concedida a cientistas que se destacam em suas áreas. O CNPq é um órgão vinculado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e uma das mais importantes instituições de fomento à pesquisa, tecnologia, educação e desenvolvimento do Brasil. Na situação em questão, faltou 0,2 ponto para a pesquisadora conseguir a bolsa.

O caso gerou grande repercussão, não apenas na comunidade científica, mas também fora dela, provocando um debate sobre o quanto, ainda hoje, as mulheres são prejudicadas em suas carreiras por terem filhos. Importante também refletirmos sobre como ser mãe ainda é considerado o propósito de vida das mulheres em nossa sociedade e que as expectativas são de que não existe nada tão importante na vida de uma mulher quanto seu trabalho como mãe.

Essa visão tem trazido profundas consequências para o avanço das mulheres no mercado de trabalho. Um estudo divulgado pela FGV identificou que a probabilidade de emprego das mães no mercado de trabalho formal aumenta gradualmente até o momento da licença-maternidade, e decai depois. Além disso, a queda no emprego se inicia imediatamente após o período de proteção ao emprego garantido pela licença (quatro meses). Após 24 meses, quase metade das mulheres que tiram licença-maternidade está fora do mercado de trabalho, um padrão que se perpetua inclusive 47 meses após a licença. A maior parte das saídas do mercado de trabalho se dá sem justa causa e por iniciativa do empregador e não por iniciativa da própria mulher, como muitos pensam.

Como as empresas podem construir uma cultura e um ambiente de trabalho mais inclusivo para as mães? Há diversas iniciativas que podem ser realizadas, algumas já bem conhecidas, como a licença-maternidade estendida de 6 meses, a instalação de creches no ambiente da empresa, grupos de apoio para as mães, trabalho flexível, dentre outras. Mas quero hoje trazer uma questão que tem sido menos abordada, mas penso ser fundamental: iniciativas voltadas para os pais. Sim, isso mesmo, para eles, porque precisamos envolver mais os homens no cuidado com os filhos e com as tarefas domésticas para que as mulheres tenham melhores condições de se desenvolverem na carreira e com as mesmas condições dos homens. As mulheres ganharam espaço no mercado de trabalho, mas os trabalhos pelos quais eram responsáveis, os afazeres domésticos e cuidados com a família, não foram redistribuídos, gerando uma enorme sobrecarga para as mulheres, que dedicam o dobro do tempo dos homens às tarefas de domésticas, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio Contínua (Pnad Contínua). Caso todas essas horas fossem remuneradas, o PIB cresceria 13,1% por ano no período.
Em tempos em que tem se falado bastante sobre a importância da diversidade, equidade e inclusão nas organizações, seguem algumas iniciativas que podem ser desenvolvidas para criar um ambiente mais inclusivo para as mães envolvendo também os profissionais que são pais:

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  • Aderir ao Programa Empresa Cidadã, que possibilita às companhias cadastradas estender o benefício da licença-paternidade para 20 dias e 180 dias para as mães em troca de incentivos fiscais. A licença paternidade atual, de apenas cinco dias, é insuficiente para um pai compartilhar com a mãe as responsabilidades no cuidado com os filhos. Além disso, um tempo maior de licença paternidade possibilitaria que as mulheres concorressem em maior situação de igualdade com os homens, pois muitas empresas hesitam em contratar mulheres por temerem os períodos de afastamento relacionados à maternidade;
  • Estabelecer jornadas de trabalho mais flexíveis, em que não apenas as mães, mas também os pais, possam ter melhores condições de equilibrar trabalho e família;
  • Promover ações educativas sobre a importância da parentalidade responsável para os funcionários;
  • Atuar na identificação e mitigação dos vieses inconscientes tão presentes ainda nos processos de contratação e promoção das mulheres.

As empresas devem cumprir também sua função social, que é favorecer a construção de uma sociedade mais justa, equânime e próspera para todos.

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