Quando o divórcio chega à empresa: governança consciente na entrada de ex-cônjuge em sociedade limitada
Quando um casamento termina, o vínculo afetivo se dissolve, mas o societário pode permanecer, ainda que de forma involuntária ou diante da ausência de uma estrutura jurídica adequada. Isso ocorre porque as quotas que um dos sócios possui em uma sociedade limitada podem gerar direitos econômicos ao ex-cônjuge.
No Brasil, o regime de casamento padrão é o de comunhão parcial de bens, no qual os bens adquiridos durante o matrimônio são considerados comuns ao casal. Se as quotas de uma sociedade foram adquiridas nesse período, em caso de separação ou divórcio, essas quotas regem-se pelo instituto do condomínio e podem integrar a partilha de bens, por serem consideradas bens comuns. Assim, é possível que o ex-cônjuge, ainda que não seja sócio de fato e, portanto, não ingresse na sociedade nessa condição, reivindique sua meação sobre as quotas.
O recente julgamento do Recurso Especial nº 2.223.719/SP, pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em setembro de 2025, reforçou a importância de uma governança societária preventiva. O Tribunal reconheceu que o ex-cônjuge tem direito não apenas à meação das quotas do sócio, mas também à parcela dos lucros distribuídos entre a separação de fato e a efetiva apuração dos haveres. O entendimento evidencia que o direito econômico decorrente da sociedade não se extingue automaticamente com o fim do casamento e que cabe à estrutura societária prever os desdobramentos dessa partilha. Em outras palavras, a ausência de um contrato social bem elaborado pode expor a empresa a disputas prolongadas, comprometer o fluxo de caixa e desalinhar a gestão dos interesses legítimos dos sócios e de terceiros envolvidos.
Sob a ótica do Capitalismo Consciente, a governança deve servir como instrumento de equilíbrio, garantindo que os direitos individuais sejam respeitados sem comprometer o propósito maior da empresa. Isso significa antecipar cenários, criar cláusulas que preservem a harmonia entre os sócios e definir mecanismos claros para apuração de haveres, prazos de pagamento e regras de ingresso de novos quotistas. O contrato social e o acordo de sócios, quando elaborados com responsabilidade, tornam-se expressões práticas de transparência, equidade e prestação de contas.
Empresas conscientes compreendem que a previsibilidade jurídica é parte essencial de sua sustentabilidade. Regras claras para situações de separação ou divórcio não apenas evitam litígios, mas demonstram maturidade institucional. Elas protegem o negócio e evitam decisões de urgência, conflitos públicos e perda de valor.
Em última análise, a consciência empresarial também se revela na forma como a sociedade lida com as relações privadas de seus sócios. O que, à primeira vista, poderia parecer um tema alheio ao âmbito societário, mostra-se, na prática, determinante para a estabilidade e a reputação da empresa. Em um ambiente de negócios cada vez mais orientado pela governança e pela confiança entre stakeholders, tratar esses aspectos com transparência e previsibilidade não é apenas uma questão de conformidade, é um diferencial estratégico e uma vantagem competitiva.
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