Saúde mental e empresas: um alerta necessário com perspectiva positiva e consciente
A saúde mental se tornou um dos temas mais urgentes da nossa era. No Brasil, os sinais são alarmantes: o País lidera os índices de depressão e ansiedade na América Latina, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Um levantamento recente do Ministério da Previdência Social revela um crescimento de 67% nos afastamentos por transtornos mentais em 2024 – o maior número desde 2014, com quase meio milhão de casos.
Embora a crise seja global, os impactos não são distribuídos de maneira uniforme. A pesquisa “Calendário da Saúde”, do Instituto Ipsos, indica que 45% dos brasileiros relatam ansiedade – entre as mulheres, esse número sobe para 55%. Há razões estruturais para isso: a sobrecarga de trabalho, o acúmulo de responsabilidades profissionais e domésticas, o trabalho de cuidado não remunerado e a pressão constante para corresponder a múltiplas expectativas sociais. Tudo isso compõe um cenário desafiador que afeta, sobretudo, mulheres em posições de trabalho e liderança.
Estamos vivendo o paradoxo de uma geração que precisa cuidar dos filhos, dos pais e de si mesma. A chamada “geração sanduíche”, que equilibra múltiplas frentes de cuidado, sente diretamente o impacto dessa pressão constante. A tragédia silenciosa da saúde mental entre adolescentes – com o suicídio sendo a segunda maior causa de morte nessa faixa etária – só agrava essa equação.
Nesse contexto, empresas devem estar especialmente atentas às condições sistêmicas que afetam sua força de trabalho – com atenção específica para colaboradoras. Isso significa romper com a lógica da performance a qualquer custo, valorizar o cuidado e criar espaços seguros para o diálogo sobre saúde mental – sem estigmas e com equidade.
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O mundo corporativo precisa reconhecer esse cenário como um chamado à ação. E há caminhos possíveis, sobretudo quando nos apoiamos em premissas do Capitalismo Consciente, modelo que propõe que empresas devem operar com propósito elevado, orientação para stakeholders, liderança consciente e cultura de responsabilidade. É a partir dessa perspectiva que conseguimos transformar um alerta em oportunidade de evolução coletiva.
A legislação trabalhista brasileira também aponta nessa direção. A recente atualização da Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), que trata das disposições gerais em segurança e saúde no trabalho, determina que as empresas considerem os riscos psicossociais no seu Gerenciamento de Riscos Ocupacionais (GRO). Ou seja, a saúde mental deixou de ser apenas uma questão de responsabilidade social ou boa prática: tornou-se uma obrigação legal. Identificar, avaliar e agir sobre os fatores que impactam o bem-estar psíquico dos trabalhadores é agora parte integrante das obrigações de qualquer empregador.
O viés positivo que precisamos reforçar está justamente na capacidade das empresas de liderar essa mudança. Quando acolhemos com empatia, flexibilizamos jornadas, reconhecemos o valor do cuidado (inclusive o realizado fora das paredes do escritório), criamos programas de apoio psicológico e estimulamos a escuta ativa, estamos não apenas promovendo bem-estar, mas fortalecendo vínculos, propósito e engajamento.
Para o ecossistema econômico regional, como o de Belo Horizonte, que abriga organizações inovadoras, indústrias tradicionais e uma crescente economia de impacto, essa é uma oportunidade de se posicionar como referência em cultura corporativa consciente. Empresas que cuidam das pessoas prosperam de forma mais sustentável – e têm mais capacidade de atrair e reter talentos, sobretudo das novas gerações que demandam coerência entre discurso e prática.
Enfrentar a crise de saúde mental é um dever social, mas também uma decisão estratégica. E isso passa, necessariamente, por um olhar atento às desigualdades de gênero, pela valorização do cuidado e pela implementação efetiva das normas legais – como a NR-1 – que fortalecem a cultura de prevenção e bem-estar.
A boa notícia? Temos à nossa disposição conhecimento, ferramentas e, sobretudo, uma geração de lideranças dispostas a fazer diferente. Que saibamos transformar o alerta em ação – com consciência, coragem e cuidado.
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