Capitalismo Consciente

Segurança psicológica como estratégia da sustentabilidade

Segurança psicológica como estratégia da sustentabilidade

Tiago Fantini*

A sustentabilidade corporativa exige da empresa muito mais do que textos reflexivos de uma integridade escrita, mas não vivenciada, muitas vezes feitos unilateralmente pela alta gestão, sem uma escuta ativa dos seus stakeholders e, muito menos, sem um lugar de fala, que deveria naturalmente pertencer àqueles que, desde que engajados, viabilizam o sucesso da empresa, os colaboradores.

De que adianta contratar pessoas inteligentes e capacitadas se a elas não é concedida a oportunidade de uma contribuição dinâmica, materializada no compartilhamento de experiências, dúvidas, conhecimentos e erros, que envolve uma interdependência daqueles que formarão uma equipe eficaz? E aqui nem se fala de falta de estímulo, mas, pior, fala-se de constrangimento e retaliação sofridos por quem ousa se manifestar perante um sistema despreparado para ouvir.

O tema foi enfrentado por Amy C. Edmondson (2020), “A organização sem medo”, que nos apresenta a ideia da “segurança psicológica”, que, amplamente, é a possibilidade das pessoas se sentirem à vontade para se expressar e serem elas mesmas, compartilhando suas preocupações e erros sem medo de represálias e humilhações.

Assim, “segurança psicológica não é imunidade às consequências, tampouco é um estado de autoestima elevada. Em locais de trabalho psicologicamente seguros, pessoas sabem que podem falhar (2020)”. Algumas falhas, como as “evitáveis” e as “complexas” não são comemoradas, mas, em um ambiente seguro e de franqueza, elas autorizam em essência o aprendizado e realçam o crescimento, não a punição, que pode até acontecer, conforme o caso. Já as falhas denominadas de “inteligentes”, ocorrem como resultado de uma tentativa de inovação e, em alguns casos, são premiadas e festejadas, pois permitem a análise dos resultados e consequências, verificação das hipóteses e projeção dos desdobramentos e experimentos adicionais.

Ainda, há culturas empresariais nas quais somos impelidos a não perguntar, para não parecermos ignorantes; a não admitir erros ou fraquezas, para não parecermos incompetentes; a não fazer sugestões, para não parecermos desagradáveis. Somos, intuitivamente, direcionados à “(…) evitar comportamentos que possam levar outros a pensar mal de nós” (2020).

Em ambientes maduros, as pessoas se engajam e se sentem psicologicamente seguras para relatarem, além das suas ideias, seus erros, mesmo que sejam adequadamente responsabilizadas, pois, sabem que estarão contribuindo para o aperfeiçoamento dos procedimentos, mitigação dos riscos, inovação, aprendizado e crescimento e, principalmente, porque é o certo a se fazer. Em ambientes inseguros, o que prevalece é o medo da responsabilização e da perda do emprego ou de posições, permanecendo as pessoas numa perigosa zona de conforto na qual os relatos de falhas minguam e os procedimentos a serem implementados para a mitigação de riscos deixam de ocorrer. Na visão tradicional, costuma-se dizer que a “ocasião passa e ninguém é o mais sensato, além daquele que se conteve” (2020).

No livro, a autora relata um episódio ocorrido numa UTI Neonatal de um hospital cujo nome foi omitido e que nos mostra a importância de um ambiente seguro de fala para o enfrentamento adequado do risco. Ao perceber a omissão de um médico neonatologista na prescrição de um remédio essencial para a formação dos pulmões de gêmeos prematuros, a enfermeira responsável, apesar do impulso de alertá-lo, não o fez, pelo comportamento agressivo do médico, presenciado diversas vezes. Diante do risco de uma situação vexatória, advinda de uma provável repulsa do médico à sua contribuição, a enfermeira hesitou e preferiu não falar, mesmo sabendo do risco que os bebês corriam com o não recebimento da medicação.
O medo da repreensão humilhante é paralisante e gera o silêncio. “Nenhuma paixão rouba os poderes de ação e raciocínio da mente com tanta eficácia quanto o medo”, é o que nos apresenta Edmundo Burke (1756).

Quantas vezes, muitos de nós, nas respectivas áreas de atuação, optamos pelo silêncio quando tínhamos uma contribuição a dar, em situações mais simples e menos perigosas do que a descrita acima, pela insegurança quanto à receptividade e medo às críticas de um grupo e/ou uma chefia com baixa capacidade de escuta e não afeitos às manifestações dos indivíduos?

Às vezes, equipes melhores, conscientes, confiantes e maduras parecem cometer mais erros do que equipes piores, inconsistentes. O que se constata é que, em regra, as primeiras não cometem mais erros do que as segundas, simplesmente, os relatam, enquanto as segundas os escondem. A cultura empresarial precisa criar condições seguras para que todos se sintam confiantes em relatar os problemas de todas as naturezas que enfrentam, em prol da evolução das práticas que mitigarão a diminuição da ocorrência dos referidos eventos, mesmo que isto implique em consequências.

A lição trazida na obra de Edmondson se traduz na construção de uma organização madura que se prima por um lado na minimização do medo interpessoal e na maximização do desempenho organizacional em equipe “em um mundo de conhecimento intensivo”.

  • Conselheiro da Filial Regional do Capitalismo Consciente em Belo Horizonte,Professor Universitário, Doutor em Direito Privado pela PUC-MG, Mestre em Direito Empresarial pela UFMG, Conselheiro de Empresas, certificado pelo IBGC e pela FDC. Linkedin: Tiago Fantini Magalhães e Instagram: @fantinimagalhaes
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