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O custo invisível da maternidade no Brasil

O Dia das Mães movimenta bilhões no comércio brasileiro, mas esse mesmo país ignora o preço enfrentado pelas mães diariamente.
O custo invisível da maternidade no Brasil
Foto: Reprodução Adobe Stock

No Brasil, o Dia das Mães é a segunda data mais lucrativa do comércio, atrás apenas do Natal. Segundo a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), o faturamento em 2023 ultrapassou R$ 13 bilhões.

O varejo comemora mas, no Brasil, um custo silencioso continua sendo ignorado: o da maternidade como fator de empobrecimento e sobrecarga para milhões de mulheres.

Dados do IBGE mostram que cerca de 30% das mulheres com filhos de até 3 anos estão fora do mercado de trabalho — não por escolha, mas por falta de apoio. Sem acesso a creches públicas, sem redes de suporte, e com empregadores que ainda enxergam a maternidade como obstáculo, muitas são demitidas ou nem chegam a ser contratadas.

A Fundação Getulio Vargas estima que quase metade das mulheres perde o emprego em até dois anos após a licença-maternidade. Isso tem nome: penalidade da maternidade — e consequência direta no aumento da feminização da pobreza, termo que descreve como a pobreza atinge desproporcionalmente mulheres, especialmente negras, chefes de família e mães solo. Segundo o IBGE (2022), 63% dos lares chefiados por mulheres negras vivem com até um salário mínimo per capita.

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O impacto econômico do cuidado

A maternidade no Brasil é tratada como uma escolha pessoal, não como uma função social de altíssimo impacto — inclusive econômico.

Segundo a Oxfam (2020), o trabalho de cuidado não remunerado realizado por mulheres no mundo ultrapassa US$ 10,8 trilhões por ano — mais do que a soma das receitas das 50 maiores empresas globais. No Brasil, esse trabalho representa cerca de 11% do PIB, segundo o IPEA (2020), ainda que não entre nas contas oficiais da economia.

Enquanto isso, países que entenderam que cuidar de quem cuida é estratégico — não só justo — já avançam com políticas públicas robustas:

  • Suécia: 480 dias de licença parental remunerada e compartilhada, com parte intransferível para cada genitor, estimulando a divisão real do cuidado (OECD Family Database).
  • França: rede pública e subsidiada de creches, com vagas garantidas desde os 3 meses de idade, permitindo que mulheres retornem ao trabalho com dignidade (France Stratégie, 2022).
  • Uruguai: política nacional de cuidados com incentivos fiscais para empresas e centros públicos de atenção para pessoas dependentes (Sistema Nacional Integrado de Cuidados, 2015).

No Brasil, quem volta ao mercado após a maternidade enfrenta cortes salariais, estagnação profissional e ambientes que pouco acolhem a parentalidade. Mas há sinais de mudança. Algumas empresas começam a tratar a economia do cuidado como uma agenda estratégica, não apenas social. Oferecem jornadas flexíveis, políticas de retorno humanizadas e culturas organizacionais mais empáticas.

A transformação cultural, porém, não depende apenas de CEOs. Colegas de trabalho também têm um papel fundamental na transformação da cultura em relação à parentalidade, nas pequenas ações do dia a dia: parar de medir produtividade por tempo de tela ou pela permanência física no escritório; dividir responsabilidades no time com mães e pais; entender que o cuidado não atrasa — ele forma caráter, constrói futuro, sustenta a sociedade.

As mães não deixaram de ser profissionais — mas tendem a se tornar ainda mais competentes na gestão do tempo, da energia e da vida. A maternidade não é um problema. O problema é um sistema que não reconhece o valor de quem cuida — e que insiste em cobrar caro por isso.

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