Entenda por que a arrecadação recorde de impostos federais é apenas um alívio momentâneo
Em janeiro deste ano, a Receita Federal do Brasil (RFB) divulgou que a arrecadação federal de impostos atingiu R$ 280,6 bilhões, representando um aumento real de 6,6% em comparação com o mesmo período do ano anterior. Esse valor é o mais alto já registrado desde que os registros começaram, em 1995.
A estabilidade do mercado de trabalho continua contribuindo para o bom desempenho das receitas previdenciárias e do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), com a influência adicional dos tributos relacionados ao pagamento antecipado de precatórios. Porém, não há como negligenciar que o montante recorde arrecadado foi impulsionado por três fatores específicos e não recorrentes devido a mudanças nas legislações tributárias. Isso inclui o pagamento do Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ) e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), a tributação dos Fundos Exclusivos e a reoneração dos combustíveis.
A Receita Federal destacou que uma parcela de R$ 4 bilhões foi arrecadada através de ajustes nas declarações de IRPJ e CSLL das empresas, um processo que irá ocorrer até março. Isso porque empresas que recolhem impostos pelo Lucro Real têm os três primeiros meses para ajustar suas declarações do ano anterior.
No que diz respeito à tributação dos Fundos Exclusivos, o governo arrecadou R$ 4,1 bilhões em janeiro, como parte das medidas propostas pelo Ministério da Fazenda e aprovadas pelo Congresso. A arrecadação total, sem considerar a inflação, aumentou 11,5%. Aqui, é importante analisar mais detalhadamente a mudança regulatória ocorrida nesse veículo de investimento.
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Os Fundos Exclusivos são destinados a investidores com alto patrimônio líquido, sejam indivíduos ou famílias. No Brasil, existem atualmente cerca de 1.650 fundos exclusivos, com um capital investido próximo a R$ 250 bilhões. Anteriormente, esses fundos desfrutavam de vantagens tributárias relevantes, sendo tributados somente quando os investidores retiravam seus lucros, isto é, no momento do resgate.
Porém, com a introdução da Lei 14.754/23, o governo federal passou a tributar esses fundos de forma semestral, usando o sistema “come-cotas”, como é feito com os fundos de investimentos comuns, como os de renda fixa, cambiais e multimercados.
A mudança na tributação dos Fundos Exclusivos tem dois objetivos principais: padronizar a tributação dos fundos e aumentar as receitas do governo. Com a medida, o Estado poderá antecipar uma parte delas, ajudando a cobrir seu déficit primário projetado para os próximos anos. Mas será que essa antecipação da tributação irá gerar mais eficiência?
Para responder esse questionamento, podemos imaginar a seguinte dinâmica: se um investidor pudesse manter investida a parte do seu rendimento que lhe é cobrado como antecipação do tributo, ele teria mais incentivos para gastar ou guardar, gerando mais renda futura. Poupar mais pode impulsionar investimentos, visto que mais recursos disponíveis normalmente significam que as taxas de retorno exigidas serão menores. Com a mudança, porém, os impostos antecipados serão usados pelo governo de acordo com suas regras orçamentárias. E isso nos leva ao seguinte questionamento: será que o governo administra esses recursos de forma mais benéfica do que se estivessem nos fundos de investimento? De outro modo, a administração do recurso pelo poder público gera mais bem-estar que sua manutenção nos Fundos Exclusivos?
Essa investigação deve ser mais profunda, sendo analisada empiricamente. Um ponto de partida, porém, pode ser observado nas experiências de países desenvolvidos. Estas, sugerem que a tributação no resgate tende a constituir um modelo mais eficiente.
De todo modo, isso já foi mudado. E apesar de, no Brasil, até o passado ser incerto, dificilmente teremos uma reversão da pauta. Olhando para o cenário, os números mostram que a arrecadação com as medidas de 2023 tem sido positiva, o que melhora as previsões fiscais. Isso diminui a probabilidade de mudanças nas metas no início do ano. No entanto, o debate sobre as metas fiscais pode ressurgir no segundo trimestre, quando o orçamento de 2025 estiver sendo elaborado. Enquanto o mercado absorve a reforma tributária do consumo, o governo faz, silenciosamente, sua reforma na renda.
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