Banco Central permanece vigilante em relação à política fiscal
O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central decidiu, como esperado pelo mercado, manter a taxa Selic em 15% ao ano. No entanto, quem leu a ata da 274ª reunião em busca de sinais para futuras quedas de juros encontrou o oposto: um documento duro, defensivo e que mantém o tom das críticas à condução da política fiscal.
A ata revela um Banco Central desconfortável, travando uma batalha em duas frentes. De um lado, uma inflação de serviços resiliente, impulsionada por um mercado de trabalho que segue dinâmico. Do outro, e talvez mais grave, a percepção de que o esforço de controle de preços está sendo minado pela política fiscal. O Copom foi direto ao apontar que o “esmorecimento no esforço de reformas estruturais e disciplina fiscal” e as “incertezas sobre a estabilização da dívida pública” estão atrapalhando o trabalho. Em termos claros, o BC avalia que o risco fiscal eleva a taxa de juros neutra da economia, tornando a Selic de 15% menos eficaz do que deveria ser para conter a inflação.
Esse divórcio entre o monetário e o fiscal reflete-se no principal “desconforto” admitido pelo Comitê: a desancoragem das expectativas. Mesmo com juros nesse patamar contracionista, as projeções da pesquisa Focus para 2025 e 2026 seguem estacionadas muito acima da meta, em 4,5% e 4,2%, respectivamente. O próprio BC projeta uma inflação de 3,6% para 2026 e de 3,3% no segundo trimestre de 2027, indicando uma convergência lenta e que sequer atinge o centro da meta no horizonte relevante. O Comitê admite que, nesse cenário, é preciso manter os juros restritivos por muito mais tempo.
A aparente contradição nos parágrafos finais da ata é, na verdade, a chave da comunicação. O Copom afirma ter “maior convicção de que a taxa corrente é suficiente” para garantir a convergência, um aceno ao cenário-base de que o trabalho está sendo feito. Contudo, essa frase é imediatamente seguida pela principal advertência do documento: o Comitê “seguirá vigilante e não hesitará em retomar o ciclo de alta se julgar apropriado”. Esse não é um comunicado de quem se prepara para cortar juros. É um recado ao mercado, e especialmente a Brasília, de que o platô atual é frágil. Se a inflação ou as expectativas não cederem, ou se a percepção de risco fiscal piorar, o dedo do Banco Central permanece no gatilho para subir os juros novamente.
Não acredito que esse último cenário venha a se concretizar, considerando que a inflação tem apresentado resultados benignos para a condução da política monetária, alguns indicadores de atividade já sinalizam certo desaquecimento, e as expectativas, embora ainda desancoradas, continuam convergindo para o intervalo da meta. Ainda assim, tratando-se de um período mais volátil, afinal, teremos eleições no próximo ano, é sempre importante avaliar cuidadosamente as probabilidades.
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