Dominância fiscal volta ao debate no Brasil: o que fazer para lidar com esse desafio
Thomas Hobbes, em Leviatã, descreve a necessidade de um poder centralizado para evitar o
caos da natureza humana em estado bruto. De certa forma, o governo, como Leviatã fiscal,
enfrenta o desafio de equilibrar suas necessidades de sustento (a dívida pública) com sua
obrigação de proteger o bem-estar social (estabilidade econômica). Quando a dívida cresce
descontroladamente e submete a política monetária às suas demandas, cria-se um estado de
“guerra” entre duas forças: o Banco Central, com sua política monetária e o Governo, com
sua política fiscal.
Esse conflito ecoa o dilema hobbesiano: sem regras claras e cooperação, o sistema entra em
um ciclo de desordem. No caso brasileiro, a luta para evitar a dominância fiscal é
semelhante à busca pela construção de um pacto social no pensamento de Hobbes. Um
governo que gasta sem limites, enquanto pressiona a política monetária, abdica do
equilíbrio necessário para o progresso coletivo. Assim como Hobbes argumenta que o poder
deve ser disciplinado para evitar o caos, a economia brasileira depende de um arcabouço
fiscal crível para evitar o desequilíbrio entre dívida e inflação.
No início desta semana o banco Morgan Stanley emitiu um relatório ‘rebaixando’ o Brasil
em sua avaliação. Segundo a instituição, o panorama fiscal doméstico não é nada bom,
suscitando o risco de dominância fiscal. Esse quadro descreve um cenário onde a política
fiscal compromete a eficácia da política monetária. Nesse contexto, o aumento dos juros,
em vez de conter a inflação, agrava a dívida pública, dificultando o controle inflacionário e
gerando um círculo vicioso de deterioração econômica.
Ainda que este cenário não constitua realidade no momento, temos elementos para nos
preocupar, tornando a dominância uma possibilidade não tão remota. A dívida bruta
alcançou 78,3% do PIB, com projeções de superação de 80% em breve. Isso ocorre num
contexto de elevados gastos públicos, enquanto a meta do arcabouço fiscal enfrenta desafios
de credibilidade. O custo da dívida também cresce, com 45% dos papéis atrelados à taxa
Selic, que está acima de 11% ao ano, pressionando o orçamento público.
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Apesar desses desafios, a atual política monetária permanece ativa e comprometida com a
meta de inflação. No entanto, é preciso fortalecer as bases fiscais, sobretudo com a redução
de gastos obrigatórios e uma melhor gestão da dívida pública. Medidas urgentes incluem
um controle mais rigoroso sobre os gastos obrigatórios; a revisão de renúncias fiscais; e
provar a viabilidade do arcabouço fiscal, sem a constante flexibilização.
A combinação de uma política monetária ativa com medidas fiscais efetivas pode conter os
efeitos negativos de expectativas de inflação desancoradas. Embora o cenário de
dominância fiscal (ainda) não seja realidade, a continuidade da trajetória fiscal
expansionista pode levar a um quadro desafiador.
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