As expectativas de inflação no Brasil estão bem ancoradas?
A ancoragem da inflação, termo originalmente cunhado por John B. Taylorem 1979, é um conceito fundamental na economia, especialmente para os monetaristas, que consideram a oferta de moeda como o principal determinante da inflação. Trata-se da capacidade de um país ou região de manter a inflação estável e sob controle através de políticas monetárias e fiscais eficazes.
De forma didática, tomemos como analogia um barco ancorado. Pense na inflação como as ondas do mar, em constante movimento e capazes de gerar instabilidade econômica. Nessa analogia, as políticas econômicas funcionam como a âncora do barco, mantendo a estabilidade mesmo com as ondas. Quando essa âncora está forte, o barco permanece estável, da mesma forma que a inflação se mantém em níveis controlados quando as políticas econômicas são eficazes.
Uma inflação excessivamente alta ou baixa pode causar danos à economia, prejudicando o poder de compra das pessoas, afetando os investimentos e o crescimento econômico. Portanto, o objetivo da ancoragem da inflação é estabilizar os preços e reduzir a incerteza dos agentes econômicos, permitindo decisões mais previsíveis sobre investimentos, preços e salários.
No Brasil, o Banco Central utiliza, desde 1999, o sistema de metas de inflação como referência para sua política monetária. Nesse sistema, a ancoragem das expectativas é tida como um importante objetivo a ser perseguido. Aqui, a credibilidade da política é essencial para obter esta ancoragem, de forma a promover inflação baixa e estável, menores impactos decorrentes dos choques e menores custos de desinflação.
Recente relatório do World Economic Outlook, do FMI, aborda os desafios enfrentados pela política monetária dos países emergentes, especialmente diante da normalização das condições financeiras nas economias centrais. Um dos estudos referenciados no relatório analisa a ancoragem das expectativas de inflação e revela que os países com expectativas mais firmemente ancoradas mostraram-se menos sensíveis a pressões externas. Isso, por sinal, lhes permitiu manter uma política monetária mais flexível no período pós-crise. Alinhado a essa perspectiva, é relevante notar que um dos elementos destacados no Relatório Trimestral de Inflação do Banco Central, de setembro de 2018, foi a redução do pass-through cambial, decorrente de expectativas mais ancoradas.
Para avaliar a situação dessa ancoragem no contexto brasileiro, podemos examinar os últimos boletins Focus do Banco Central, uma ferramenta valiosa para avaliar as expectativas do mercado em relação à economia nacional. Essas expectativas influenciam as decisões da autoridade sobre a política monetária, incluindo a definição da taxa de juros. Na última divulgação, o boletim indicou uma expectativa de inflação oficial de 3,81% para 2024 e 3,5% para cada um dos próximos três anos. Embora esses números sejam relativamente baixos, estão acima do centro das metas estabelecidas pela autoridade monetária em todos os anos (3%, com intervalo de tolerância de 1,5 ponto percentual, para mais ou para menos).
De forma complementar, a partir de um exercício econométrico, podemos verificar o impacto que variações nas expectativas para o ano corrente provocam sobre as expectativas para prazos mais longos.

A ideia é que, na presença de expectativas bem ancoradas, deve haver baixa relação entre as expectativas de inflação de longo prazo e as de curto prazo. O gráfico acima retrata o resultado desse exercício, demonstrando que, após um choque observado em meados de 2022, as expectativas de inflação encontram-se relativamente estáveis, ainda que denotem certo grau de desancoragem. Isso reflete uma certa desconfiança do mercado em relação à eficácia de algumas medidas, especialmente na esfera da política fiscal, que acabam por interferir na efetividade da política monetária.
A inflação é influenciada por uma série de fatores, sendo as expectativas um dos mais relevantes, em grande parte relacionados à política monetária. Expectativas ancoradas, que permanecem em torno da meta mesmo após choques relevantes, tornam mais fácil para o Banco Central agir contra pressões inflacionárias. Por isso, a ancoragem das expectativas é considerada um elemento chave para a política monetária.
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