(Im)potência dos juros: política monetária ainda tem força para conter a inflação?
Na última superquarta, o Comitê de Política Monetária (Copom) e o Fomc definiram suas decisões de juros. Com taxas já em níveis bastante restritivos – especialmente no Brasil –, volta à cena uma pergunta: a política monetária ainda tem força para conter a inflação? Para entender esse debate, é essencial compreender o conceito de potência da política monetária.
Potência, aqui, significa o quanto a autoridade monetária consegue influenciar a economia real, como o nível de atividade, crédito, câmbio e expectativas, por meio da taxa básica de juros. Na teoria, juros mais altos encarecem o crédito, reduzem o consumo e o investimento, valorizam o câmbio e, assim, enfraquecem a demanda e aliviam a inflação.
Mas o que se vê atualmente no Brasil desafia essa lógica. Mesmo com a Selic em patamares elevados, a atividade segue aquecida e a inflação, resistente. O IPCA acumula 5,32% em 12 meses, acima do teto da meta. E o PIB cresceu 1,4% no primeiro trimestre, uma das maiores altas entre as principais economias globais.O que está por trás desse aparente enfraquecimento dos juros?
Um dos fatores é a política fiscal expansionista. O governo aprovou medidas que adicionam bilhões de reais em despesas anuais, por meio de renúncias tributárias e aumento de benefícios. Soma-se a isso um novo arcabouço fiscal que permite crescimento real do gasto público. Esse impulso fiscal vai na contramão do aperto monetário e reduz sua efetividade, pois mantém a demanda interna aquecida.
Outro ponto importante é o crédito direcionado, que responde pouco ou nada à Selic. Programas de financiamento rural, habitacional e operações do BNDES seguem regras próprias e representam cerca de 49% do crédito total no país, enfraquecendo o canal tradicional da política monetária.
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Há ainda fatores estruturais. A economia brasileira possui alto grau de indexação – contratos, tarifas e aluguéis são frequentemente reajustados com base em índices de inflação passados. Isso torna a desaceleração de preços mais lenta. Além disso, choques externos, como a desvalorização cambial, seguem pressionando preços e exigem mais do Banco Central.
Por fim, o papel das expectativas é central. Quando o mercado duvida da capacidade do governo de controlar gastos, as expectativas de inflação sobem. Isso contamina decisões de preços e salários, alimentando o processo inflacionário.
Política fiscal expansionista, crédito insensível aos juros, indexação e ruído institucional enfraquecem a transmissão da política monetária. Para restaurar sua potência, será necessário maior coordenação entre política fiscal e monetária, revisão de subsídios ao crédito e fortalecimento das âncoras institucionais. Sem isso, os juros elevados continuarão impondo custo à economia sem a devida contrapartida no controle da inflação.
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