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Não podemos dobrar essa meta

Não podemos dobrar essa meta
Guilherme Almeida, colunista do Diário do Comércio | Crédito: Arquivo Pessoal/Divulgação

Nos últimos meses, muito tem se falado em alterar as metas de inflação. O principal apelo para a mudança é que uma alteração, via aumento das metas, permitiria que o Banco Central cortasse a taxa de juros de forma mais acelerada, sendo menos rígido na condução da política monetária. Porém, será que essa alteração teria o efeito desejado?

Para começar, vamos entender o sistema de metas para a inflação. Esse sistema é adotado por muitos países para gerenciar a inflação e promover a estabilidade econômica. Ele envolve a definição de uma meta específica de inflação a ser alcançada em um determinado horizonte de tempo. A ideia é que a manutenção da estabilidade de preços é um objetivo fundamental da política monetária e, ao estabelecer uma meta, é definido um valor desejado para a taxa, valor no qual a autoridade monetária do país se compromete a alcançá-lo. O Banco Central, então, monitora os indicadores econômicos e ajusta sua política monetária, via taxa de juros, para atingir a meta estabelecida.

O sistema se baseia em princípios de transparência e comunicação clara do Banco Central em relação às suas estratégias para alcançar as metas. Reconhece que choques econômicos e fatores externos podem influenciar temporariamente a inflação, não exigindo o cumprimento estrito da meta em todos os momentos. Nesse contexto, também reconhece que pode levar algum tempo para que as mudanças nas taxas de juros tenham efeito sobre a inflação. Portanto, a política monetária, além de reagir a dados recentes, considera projeções de médio prazo para a pressão sobre o nível de preços.

No Brasil, o regime de metas foi adotado em 1999, via Decreto Nº 3.088, e tem se mostrado efetivo: foram 17 anos entregando uma inflação dentro do estipulado e sete anos acima dos patamares estabelecidos. Pela sistemática atual, até junho de cada ano, o Conselho Monetário Nacional (CMN) se reúne e define a meta de inflação para o ano-calendário, três anos à frente. Essa meta é referenciada no IPCA, tendo um intervalo de tolerância de 1,5 ponto percentual, para cima ou para baixo. Para 2025, por exemplo, a meta é de 3% e o intervalo é de 1,5% a 4,5%. Se a inflação ao final do ano se situar fora do intervalo, o presidente do Banco Central tem de divulgar as razões do descumprimento.

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Hoje, 29 de junho, o Conselho estará reunido para a definição da meta de 2026, podendo revisar as de 2024 e 2025. À mesa, estarão o ministro da Fazenda e presidente do CMN, Fernando Haddad, a ministra do Planejamento, Simone Tebet, e o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Inicialmente, Haddad apontava para o interesse em aumentar a meta dos anos posteriores. Porém, parece ter desistido da ideia. No lugar, pretende sugerir a implantação de um calendário móvel. Ou seja, ao invés de considerar o final do ano para atingir a meta, o objetivo seria perseguido num período mais longo. Assim o Banco Central poderia ser mais suave na aplicação da política monetária.

Sobre esses pontos, cabem algumas ponderações. Começando pelo segundo, creio que esse tema já é bem aceito pelo mercado. Desde a gestão de Ilan Goldfajn, antecessor do atual presidente do Banco Central, falava-se em alterar o período para o atingimento da meta de ano-calendário para algo mais estrutural, considerando 18 a 24 meses à frente. Essa alteração apenas irá oficializar uma prática já adotada. Como a política monetária age com defasagem, o Banco Central entende que um movimento feito hoje nos juros, só tem efeito trimestres à frente. O problema está no primeiro ponto: mudanças nas metas.

Agentes do mercado, incluindo o governo, argumentam que o Brasil é um país que não está à altura de uma meta de 3%, sugerindo um aumento para cerca de 4,5%. No entanto, essa mudança causaria um problema de ancoragem, pois aumentos na meta resultariam em maiores expectativas de inflação de longo prazo, o que dificultaria a redução rápida da taxa de juros. Simulações indicam que, se a meta for mantida em 3%, as expectativas de longo prazo convergirão para 3,5% e permitirão que os juros cheguem em 8,5%, em 2026. Já, se a meta for elevada, os juros ficariam em 9,5% e a inflação em 4%.

O sistema de metas de inflação tem se mostrado eficaz no controle da pressão sobre o nível de preços nas economias que o adotaram, proporcionando estabilidade e previsibilidade econômica. Ao cumprir os objetivos estabelecidos, as autoridades monetárias reforçam a confiança no sistema financeiro, promovendo um ambiente propício ao crescimento sustentável e à manutenção do poder de compra da moeda.

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