Direito para Pequenos Negócios

A cobrança de metas e o dano moral

Saiba por que não há mais espaço para amadorismo e improvisos ao disciplinar o ambiente de trabalho

A sociedade é dinâmica. Evolui e avança com velocidade impressionante. E no ambiente empresarial não é diferente. A globalização, as inovações tecnológicas, os novos nichos de mercado, o incremento do comércio virtual e o aumento do poder de compra dos consumidores, entre tantos outros fatores, atuam na modificação deste cenário, exigindo dos empresários ainda mais preparo e habilidade para se adaptar aos novos tempos e não perder o rumo da história.

E o que isso tem a ver com o título proposto para este artigo? Tudo. Neste novo contexto, a competição entre as empresas se acirra acentuadamente e a procura pela margem de lucro se torna tarefa ainda mais difícil. Os empresários e gestores são obrigados a adotar novas práticas junto às suas equipes, incorporando, cada vez mais, um conjunto de ações focado na produtividade, captação de novos clientes e ampliação dos negócios.

Não há mais espaço para o amadorismo e improvisos. Definição e alcance de metas de vendas – individuais e coletivas –, equipe qualificada, motivada e bem treinada, produtos de qualidade e processos produtivos sustentáveis são hábitos que, atualmente, fazem parte da rotina de qualquer organização empresarial que pretende superar os desafios do dia a dia e se manter ativa no mercado.

Porém, nesta atual perspectiva, as empresas se deparam, frequentemente, com algo indesejado: a pressão exagerada e abusiva por metas e resultados, fora dos limites normais do poder diretivo do empregador, pode, eventualmente, causar abalo psíquico ao trabalhador e, conforme o caso, gerar condenações ao pagamento de indenizações por danos morais.

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É inquestionável que o empregador, enquanto proprietário da empresa e na condição daquele que assume os riscos do empreendimento, dirige a prestação de serviços com a prerrogativa de organizar e disciplinar o ambiente de trabalho, na busca por resultados eficientes. No entanto, esse não é um direito absoluto (aliás, como não é nenhum outro) e deve ser exercido com moderação, dentro dos limites, sem excessos ou abusos.

Logo, todo o cuidado é pouco. O Judiciário trabalhista, quando acionado, repele e pune procedimentos patronais que, a pretexto de exigir e estimular a observância de metas, acabam por atacar a integridade moral e psíquica do trabalhador.

Abaixo, apenas para ilustrar, relaciona-se alguns casos concretos julgados pelo Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (Minas Gerais), divulgados no site do próprio tribunal (www.trt3.jus.br), em que as empresas reclamadas foram condenadas ao pagamento de indenização por danos morais, em função de excessos e abusos cometidos por gestores na cobrança de metas e produtividade dos funcionários:

  • Empresa é condenada por cobrança abusiva de metas, com exposição dos empregados por meio de ranking colocado em local de acesso dos outros trabalhadores e divulgado nos grupos de WhatsApp (Processo 010001-31.2020.5.03.0003);
  • Empresa que apelidou de “ofensores” trabalhadores com baixa produtividade é condenada a pagar indenização por danos morais (Processo 0010267-35.2021.5.03.0180).
  • Empresa que ameaçou passar “pente-fino” em filiais por cumprimento de metas pagará indenização a ex-empregada (0010881-89.2019.5.03.0057).
  • Empresa é condenada pela prática de gestão por estresse (0010796-40.2017.5.03.0036).
  • Trabalhadora chamada de “lenta” e “tartaruga”, chegando a ser tratada também como “cavalo paraguaio”, receberá indenização (0011782-21.2016.5.03.0006).
  • Vendedora será indenizada por exposição de resultado improdutivo em grupo de WhatsApp (0010224-34.2018.5.03.0009).


Naturalmente que a simples fixação de metas pelo empregador, exercida de forma adequada e nos limites de seu poder diretivo e disciplinar, não atinge a honra e dignidade do trabalhador, até mesmo porque este presta serviços de forma subordinada, estando sujeito às ordens do patrão.

Neste sentido, no julgamento do processo 0010651-68.2023.5.03.0134, o desembargador José Marlon de Freitas lembra que “a mera estipulação e cobrança de metas de produtividade, mormente em setores competitivos, não se revela suficiente para a caracterização do dano moral, inserindo-se no âmbito do poder diretivo patronal”.

Conclui-se, portanto, que o exercício do poder diretivo e disciplinar por parte do empregador é legítimo, mas não pode extrapolar seus limites e ser usado como ferramenta para ridicularizar, discriminar, ameaçar, perseguir ou humilhar o empregado. A dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho são fundamentos previstos na Constituição Federal de 1988, que também assegura a redução dos riscos inerentes ao trabalho como um direito social, além de proteger a honra, imagem, intimidade, vida privada e demais atributos da personalidade.

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