Giro pelo mundo

É possível para o Brasil sobreviver sem a China?

"É inimaginável o Brasil estar onde está economicamente sem essa intensa relação com a China, nosso principal mercado para commodities". Leia mais

Os primeiros chineses chegaram ao Brasil em 1812. E os portugueses que nos descobriram e colonizaram mantinham Macau como a sua colônia até recentemente. Agora, estamos comemorando oficialmente a mais recente fase de nossas relações diplomáticas, 50 anos desde que o General Presidente Geisel reatou as relações diplomáticas e todos os chineses que haviam sido expulsos alguns anos antes pelos militares como espiões, presos e torturados, voltaram como se nada tivesse acontecido. E mostraram um pragmatismo na política externa que segue até os dias de hoje nas relações entre os dois países.

Presidente do Brasil, Lula, é recebido pelo presidente da China, Xi Jinping, em 2023. Foto: Ricardo Stuckert/PR
Presidente do Brasil, Lula, é recebido pelo presidente da China, Xi Jinping, em 2023. Foto: Ricardo Stuckert/PR

No momento é inimaginável o Brasil estar onde está economicamente sem essa intensa e tensa relação com a China, nosso principal mercado para commodities. E essa relação gerou um superávit no balanço comercial de US$ 63 bilhões no ano passado, ou seja, 2/3 do total de nosso superávit comercial, enchendo o balaio de nossas reservas cambiais.

E os chineses têm investido mais de US$ 73 bilhões no Brasil, onde, segundo alguns dados, dominam 40% do setor de energia.

Sem falar que, enquanto a Ford saía da Bahia, compraram as instalações, e os automóveis chineses concorrem bem com as demais montadoras. Num mês desembarcaram no Brasil 40 mil containers de uma só marca chinesa de carros.

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Nossa interdependência – somos sustentáculo da segurança alimentar chinesa e de sua indústria siderúrgica, que vai exportar neste ano 100 milhões de toneladas, duas vezes a produção brasileira – deve ser examinada. Trinta e sete por cento de nossas exportações vão para lá. E nossos produtos industriais, com poucas exceções que confirmam a regra, são Made in China.

O consumidor brasileiro já não trata mais esses produtos como de segunda linha, mas em igualdade com produtos europeus. Não tem mais Feira do Paraguai em Brasília vendendo bugigangas chinesas, nem sacoleiras atravessando a Ponte da Amizade em Foz. Os chineses dominaram o mercado com produtos, serviços, preços compatíveis e qualidade.

O Brasil é um paraíso para a China. Enquanto tem restrição pelo mundo afora, além de disputa com os EUA, por aqui só tem alegria. E nós vivemos na ilusão de que entendemos porque temos meia dúzia de pessoas falando o mandarim de uma civilização de seis mil anos. Aprendemos pouco sobre como a China de hoje funciona, em especial na África, e como ajudou a quebrar e dominar a Venezuela. Nós vivemos na alegria de hoje e eles, pensando nos próximos cem anos.

O teste será a próxima visita de estado do Presidente Xi em novembro, com insistência chinesa para que o Brasil faça parte da Rota da Seda. E com isso se separa, independentemente de nossa associação nos BRICS, da UE e EUA. Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come.

A nossa relação com a China depende mais deles do que da nossa vontade política, já que não temos nem visão, nem projeto a longo prazo. Ao contrário da China. E os chineses são cruéis na persecução dos seus objetivos estratégicos. Hoje eles determinam o preço do minério, usam instrumentos de pressão diplomática e política, veja as licenças para exportação de carne, momentos de controle mais rigoroso da importação de soja e recusa das cargas de minério. Agora aparentemente precisam de nós. Mas a segurança alimentar para eles é fundamental e ela será desenvolvida com a agricultura na China, notadamente no extremo norte do país, beneficiada com clima quente e terra fértil.

Vale a pena lembrar o episódio da construção de usina de Três Gargantas, para a qual os empreiteiros brasileiros forneceram toda a engenharia de Itaipu, esperando que iam ter acesso à construção. O então Governador de Minas, Eduardo Azeredo, foi à China, onde foi recebido pelas mais altas autoridades, tentando vender serviços de empreiteiras. Nada.

O Brasil, em troca de nada, apoiou a entrada da China na OMC como economia de mercado, contra os Estados Unidos, e por causa disso os chineses sequer abriram mais mercado para produtos ou commodities brasileiros. Aliás, fora do vinho Miolo, o Brasil não vende produtos com marca na China. Temos uma fábrica de WEG, representação da Suzano e dos exportadores de minério e carnes. Das entidades empresariais, a FIEMG tinha um escritório na década de 90, nenhuma notícia.

Revendo a posição brasileira no caso da Rota da Seda, será difícil escapar de não fazer parte. E será muito mais difícil fazer parte. Xi não pode voltar para China do Brasil sem um ganho diplomático significativo. Então a pressão será enorme e a visita cobrirá o dia a dia dos negócios.

O fato é que analisar quanto a China é dependente do Brasil, a teoria de meio copo cheio, meio copo vazio aqui não se aplica. Do ponto de vista chinês, são eles que dão o copo cheio ao Brasil. E do nosso lado, nós hoje não sobrevivemos sem a China.

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