O que está por trás do terremoto nas bolsas de valores ao redor do mundo
O mundo financeiro balançou feio nesta semana. Num terremoto nas bolsas de valores, sumiram US$ 6,4 trilhões, ou seja, três vezes o PIB brasileiro. As bolsas caíram na segunda-feira e foram recuperando devagar na semana. Todo mundo pedindo calma, e cheio de especialistas explicando que está tudo bem. Bem, perdendo dinheiro nunca fica bem. A pergunta, mesmo assim, é por que aconteceu.
A desculpa foi a divulgação de dados do emprego nos Estados Unidos, que indicou que o desemprego lá está em 4,3%, ou seja, dos mais altos dos últimos tempos. Outro sinal foi que o FED, Banco Central dos Estados Unidos, não baixou os juros. E aí vem o outro sinal, que indicava que os preços de empresas de tecnologia estavam supervalorizados e se esperava uma correção. E o chute na correção foi a venda de US$ 90 bilhões de ações da Apple pelo trilionário Buffet, ícone dos investidores americanos. O fundo de investimento dele possui um total de ativos de US$ 3,3 trilhões e US$ 277 bilhões em caixa (aproximadamente dois terços das reservas cambiais brasileiras).
Nessa gangorra financeira, onde os números são assustadores, mesmo para um país como o Brasil, há também uso de algoritmos que acionam os computadores e geram, sem presença humana, uma avalanche de compra e venda de ativos absolutamente fora de controle. Mesmo com os chamados circuitbreakers, ou seja, “corta circuitos” que, quando as ações baixam muito de valor, param as operações, estamos vivendo num mundo de especulações cada vez mais sofisticado, vulnerável e assustador.
O mercado de capitais alimenta as empresas, democratiza os capitais, mas, como disse o físico Isaac Newton, que inventou a loteria, é um jogo para os tolos. O modelo econômico que foi fundado junto com as corporações é um modelo onde os ganhos provêm mais de especulação do que do real valor da empresa, do seu produto ou serviço, ou até de quanto ela produz de lucro. Chegamos ao ponto em que um executivo, Musk, da Tesla, cujo lucro é ínfimo em relação ao capital, convence seus acionistas, fundos de pensão entre eles, de que é merecedor de um salário anual de US$ 46 bilhões. Merece porque o valor das ações vai subir, não porque a empresa será mais lucrativa.
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Teremos ainda muitos terremotos, porque o modelo econômico, de livre mercado, adotado não só pelas democracias, mas também por países como a China, é o sistema que escolhemos e é um sistema especulativo. Individualmente, investir no mercado acionário exige pelo menos um pouco de conhecimento. Mas os maiores investidores são os fundos de pensão, e seus resultados afetam em muito as pessoas e suas vidas. Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come.
A imprevisibilidade no mercado acionário, apesar de análises sofisticadas, é enorme. Às vezes empresas com excelentes resultados operacionais e boa gestão não satisfazem os analistas, que procuram uma agulha no celeiro para poder aumentar o valor da ação ou baixar, são desvalorizadas e, presa dos especuladores, de forma assustadora. Esses mercados não funcionam com cabeça de pessoas cujos valores de trabalho seriam considerados normais. É um outro mundo. Um mundo que inclui sofisticação matemática e equipamentos que há muito superam a inteligência humana.
São vários episódios na história econômica – basta lembrar o crash de 1929 e as muitas crises posteriores e o episódio desta semana, onde se vê que os fundamentos econômicos da maior economia do planeta são sólidos, mas sujeitos a uma manipulação livre do mercado financeiro simplesmente assustadora. E os governos ficaram pequenos comparando com esse poderio. Sem poder regulador. É um desafio que temos como sociedade.
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