Liderança em diálogo

Liderar para a sobrevivência

A vida é um assunto que desperta pouco interesse

Gosto dos títulos enigmáticos, do estranhamento que eles provocam. Tenho esperança de que atraiam curiosos para a leitura de algo que, se o assunto estivesse explícito, não leriam.

A vida é um assunto que desperta pouco interesse, especialmente em um caderno de negócios. O interesse é claro, estrito e explícito nos documentos: fins lucrativos. Que a vida se curve e não atrapalhe.
Será que aqueles com quem tenho mais interesse em falar já pararam de ler este texto?

Quem mais me interessa é quem acredita que a vida será salva por descobertas tecnológicas, oferecidas a um valor acessível. São pessoas que têm essa confiança seletiva nos cientistas: confiam em seu sucesso, mas não em seus alertas.

Quem mais me interessa são aqueles que se empenham em dar uma vida boa para os seus, mas pouco se empenham em manter as condições de vida para distantes e desconhecidos.

Se você se reconhece nessas frases e ainda está comigo, minha admiração por se manter aqui apesar do incômodo.

O assunto é importante, vocês sabem. A vida está em risco e exige cuidado. As melhores escolhas muitas vezes vão no sentido contrário ao lucro.

O cuidado consome recursos para ser oferecido. Madeira extraída com cuidado tem o custo do manejo. Comida produzida com cuidado tem o custo da perda de parte da produção. Comprar com cuidado tem o custo de permitir que a cadeia de fornecedores sobreviva com dignidade.

Não vá ainda. Fique um pouco mais. Apenas concluir que este texto é sobre ESG e lembrar que você está fazendo algumas ações em ESG não é suficiente. Precisamos de mais do que isso. É preciso trazer essa sensibilidade para nossas ações em todos os momentos.

É preciso que encaremos o rastro de destruição que deixamos a cada passo: todo o lixo, as pessoas e seus sofrimentos, as mazelas, os transtornos, as doenças, a pandemia. Obras do homem, muito mais numerosas do que gostaríamos de contar.

É isso? Vou ficar aqui falando mais do mesmo, chateando todo mundo sem apresentar uma solução?
Passarei à solução, então: proponha-se a exercitar um tipo de cuidado mais amplo do que vem exercitando até aqui.

Fui a um salão de cabeleireiros na minha nova cidade outro dia. Tudo muito bem cuidado: café e bolo oferecidos na entrada, ambiente limpo, cheiro agradável, equipamentos e produtos da melhor qualidade. A cabeleireira (e também dona do salão) pegou a capa que protegeria minha roupa: uma capa plástica. Pelo menos um metro quadrado de plástico destinado ao lixo a cada atendimento. Pedi para deixar minha capa recém-aberta para outra cliente, pois minha consciência ecológica não me permitiria aceitar. Ela resistiu, mas terminou por embolar aquele plástico todo para jogar no lixo, sem uso. Nova intervenção minha: para reduzir o dano, ela precisaria utilizar a capa em outra cliente. A resposta foi que outra cliente não gostaria de receber uma capa descartável já aberta.

Não dá para dizer que essa pessoa não preze pelo cuidado naquilo que faz. Mas é um cuidado extremamente circunscrito ao pequeno, que prioriza o curtíssimo prazo, a relação mais próxima, o território contido dentro das quatro paredes de seu pequeno empreendimento.

Conclamo meus leitores a fazerem mais. Por mim, pelo menino pobre em terras distantes, pelo exemplar de uma outra espécie, pela vida.

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