Reflexões em tempos de NR-1 atualizada
Tive uma organização cliente com um risco psicossocial altíssimo. Pressionada por múltiplos atores, sempre presente na imprensa (especialmente quando algo não ia bem), alvo de aproveitadores e de interesses políticos, vítima frequente de decisões judiciais desfavoráveis.
Esta organização realizava um trabalho que nunca havia sido feito de forma tão completa antes, com uma equipe que cresceu vertiginosamente num curto espaço de tempo. Cuidava de áreas tão diversas quanto suas respectivas formas de compreender e de se comportar no mundo.
Tomar decisões se assemelhava a cumprir a jornada do herói: sua governança era tanto complexa quanto violenta.
Não havia uma só pessoa que trabalhasse tranquilamente. Alguns chegaram a ter sua integridade física ameaçada – e este não foi um fato isolado.
Quando chegou a hora da partida (essa organização que tinha dias contados para acabar) seus colaboradores sofreram um luto generalizado. As pessoas não imaginavam que pudessem se realizar tanto profissionalmente quanto lá.
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O que pode explicar esse milagre? “Emicida” explica: “Tudo tudo tudo que nóis tem é nóis”.
Nessa organização, a gestão de pessoas era estratégica e não tapava o sol com a peneira. Os líderes eram, em sua grande maioria, pessoas sinceramente preocupadas com a saúde mental de seus colaboradores. A alta liderança não se eximia de falar abertamente sobre qualquer desconforto que estivesse em pauta, com coerência e coragem. Cada conversa gerava novas ações e reposicionamentos por parte dos responsáveis.
A estrutura também se organizou para proteger e evitar o adoecimento de seus colaboradores. Os canais de denúncia eram sérios. O apoio psicológico estava presente desde sua criação. Protocolos de segurança foram criados.
Todos os colaboradores cresceram. E cuidaram, sem tréguas, uns dos outros (é claro, houve exceções, mas exceções que confirmam a regra).
Além disso, havia o sonho. Havia o propósito.
“Marina Lima” explica: “Você me abre seus braços e a gente faz um país.”
É factível que, numa sociedade anônima ou limitada com fins lucrativos, uma história como essa pudesse acontecer? Muito provável que não.
Isso significa que, nas sociedades anônimas ou limitadas com fins lucrativos, nada dessa história poderia acontecer? Definitivamente – e felizmente – essa resposta também é não.
Também para gerar lucro temos uns aos outros. Também para gerar lucro a gestão de pessoas pode ser estratégica e não tapar o sol com a peneira. Também pode haver preocupação sincera com a saúde mental dos colaboradores, abertura, coragem e ação da liderança para lidar com o que não está bom. Também pode haver estrutura de apoio e também é possível sonhar com a contribuição que aquela organização pode dar ao mundo.
Desde que os valores estejam bem posicionados. Desde que não topemos tudo por dinheiro. Desde que não abramos mão de tudo tudo tudo que nós temos de mais importante.
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