Qual a relação entre os ciclos de Kondratieff e o Brasil?

Ao pensar sobre o futuro, inevitavelmente vem o Brasil à mente. Os ciclos de Kondratieff explicam bem a história do Brasil nos últimos 250 anos e nos oferecem hipóteses acerca do futuro. Isso é o que bons modelos fazem, gerando hipóteses sobre eventos futuros, mas por outro lado, levando a novas perguntas, uma vez que nem sempre conseguem prever com exatidão o que irá acontecer.
Os ciclos de Kondratieff sempre terminam numa crise geral do sistema global, que força a busca por novas tecnologias. No Brasil, isso se refletiu na forma de uma crise econômica e política que forjou mudanças estruturais. O padrão de comportamento foi sempre o mesmo: o Brasil passa por uma crise interna, surge uma externa que leva ao agravamento desta situação, em geral, causando uma aguda crise econômica e fiscal, o que gera uma mudança estrutural na política brasileira.
O primeiro ciclo (1770-1820) terminou na crise geral das guerras napoleônicas. Neste contexto, Portugal foi invadido pela França em 1808, forçando a vinda da família real para o Brasil e, assim, começou uma crise interna no País, que ainda nem era independente. Ao final das guerras napoleônicas, o imperador português retornou para a Europa deixando seu filho aqui e a crise se aprofundou, gerando uma mudança estrutural que culminou na independência. A consequência foi o Brasil assumir as dívidas de Portugal com a Inglaterra, já nascendo em condições financeiras difíceis.
No final do segundo ciclo (1820-1870), ocorreram uma série de guerras nacionalistas tais como a guerra civil dos EUA, a unificação da Itália e Alemanha e a restauração de Meiji no Japão. Na América do Sul, a guerra do Paraguai (ou Tríplice Aliança) criou uma situação desafiadora para o Império do Brasil. Para sobreviver, o império criou os batalhões de voluntários da Pátria, essencialmente tropas compostas por escravos que se tornaram libertos como prêmio por sua contribuição na guerra. Para substituir a mão de obra escrava, uma onda de imigração estrangeira se fez necessária e, assim, o Brasil recebeu uma classe média composta de alemães, italianos, japoneses e sírio-libaneses.
Isto alterou a estrutura social brasileira de uma sociedade basicamente dividida entre proprietários de terra e escravos para uma sociedade com uma classe média nascente composta de escravos recém-libertos e imigrantes recém-chegados. O império nesta altura estava fortemente endividado com as despesas da guerra. A situação era tal que inevitavelmente houve uma mudança estrutural na política – a declaração da república em 1889.
O terceiro ciclo (1870-1930) foi marcado no mundo pela Primeira Guerra Mundial e o período entre guerras, culminando com a crise financeira de 1929. No Brasil, este período foi caracterizado pela crise final da primeira república e o País quebrou com a crise de 1929 devido à sua dependência excessiva de exportação de commodities. Mais uma vez, isto levou a uma mudança estrutural na forma do Estado Novo, que basicamente consistia em uma ditadura e a substituição da oligarquia rural pela urbana, que passou a incentivar a urbanização e a industrialização.
O quarto ciclo (1930-1980) é representado pelo auge da Guerra Fria, corrida espacial e guerras do Oriente Médio. O Brasil na década de 1970 se endividou para bancar o crescimento e acabou entrando em crise com o choque do petróleo em 1973. Isso causou uma crise política e social no regime da ditadura que se viu forçada a fazer a transição democrática que culminou na constituição de 1988 e nas eleições de 1989.
Mais uma vez, ocorreu uma mudança estrutural política por conta de uma crise econômica gerada inicialmente aqui dentro e alavancada por uma crise externa. Estamos agora no final do quinto ciclo (1980-2030), que está sendo marcado por guerras na Ucrânia e no Oriente Médio e por uma crescente tensão entre países democráticos e ditaduras.
Não há ainda uma guerra geral, mas, sim, uma guerra indireta, que força todos os países a aumentarem seus gastos e, com isso, suas dívidas, além da impressão de dinheiro. O processo de crise não está completo ainda e, portanto, fica a possibilidade de levantar a hipótese do que pode vir a ocorrer baseado nas estruturas causais vistas nos quatro ciclos anteriores.
Se o passado for um bom preditor do futuro, o Brasil deverá continuar a aumentar seu endividamento para atenuar as tensões políticas e econômicas internas. Isto aumenta a vulnerabilidade à uma crise externa, especialmente pela dependência de commodities e de alguns poucos clientes, sobretudo China e Estados Unidos, que por sua vez estão cada vez mais tensionados entre si.
Até o final da década é provável que uma crise chinesa ou norte-americana, ou entre ambos países, possa eclodir, criando uma situação de crise extrema para o Brasil e, seguindo a lógica dos ciclos, forçando a mudança política depois de alguns anos.
Como eu pontuei no começo do texto, este cenário gera respostas, mas também perguntas. Qual é a natureza da crise e quando ela ocorrerá? Qual é a mudança política que ocorrerá no Brasil e quando?
O método dos ciclos de Kondratieff não nos oferece pistas sobre isso, pois como todo método ele tem suas limitações, não conseguindo explicar plenamente a realidade, mas apenas uma parcela dela.
O mais provável, me parece, é que uma crise externa ocorra entre 2025 e 2030, com data mais provável de 2029, gerando uma interna que levará a uma nova constituição, algo que já vem sendo discutido há alguns anos. Isto provavelmente causará um regime parlamentar, algo que também vem sendo conversado recentemente.
Não existe uma certeza do que vai ocorrer, uma vez que modelos não geram certezas, mas indicam estruturas causais que nos fornecem hipóteses e perguntas. No entanto, estas, por sua vez, nos ajudam a pensar sobre o futuro e a reduzir o nível de incertezas sobre o mesmo.
Ouça a rádio de Minas