Por que a transição energética levará a um novo ecossistema econômico

A recente crise no Oriente Médio e o medo da escalada militar envolvendo o Irã fizeram com o que preço do Petróleo voltasse a subir. Com isso, a transição energética ficou novamente em foco.
Nos últimos 15 anos, muito tem sido falado sobre tecnologias verdes. A razão para esta transição normalmente é a redução do impacto ambiental, em particular a diminuição nas emissões de gás carbônico na atmosfera. Uma motivação real, mas apenas uma das três razões para fazer a transição.
Em 2008, o barril do petróleo atingiu US$ 140, gerando trava na economia global, uma das causas da crise daquele ano. Ficou claro para os EUA e Europa que a dependência de petróleo era um empecilho para o crescimento econômico. E pior ainda, o petróleo alto dava força para uma série de ditaduras que, em geral, eram antagônicas ao ocidente.
Assim sendo, havia três incentivos fortes para uma transição energética: econômico, geopolítico e ambiental. Para se livrar dos combustíveis fósseis e poder crescer em geração de energia em grande escala, a saída eram estações de energia solar em órbita (SBSP- space based solar power) das quais já falei nesta coluna. O problema é que em 2008 tais tecnologias estavam ainda muito longe, pelo menos 30 anos no futuro. Eram necessários passos intermediários.
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O primeiro desses passos foi o gás de xisto nos EUA. Entre 2008 e 2011 se desenvolveram as tecnologias de perfuração horizontal e a de fraturamento hidráulico, permitindo que este recurso começasse a ser economicamente viável. Em 2014, o preço do petróleo voltou a baixar.
O segundo passo foi o desenvolvimento de energia solar em terra, o que já existia, mas ainda era caro economicamente. Entre 2010 e 2018 o preço de painéis solares por watt gerado caiu de US$ 2, para menos de US$ 0,5, acompanhado da evolução de baterias mais eficientes de lítio-íon. O preço deste tipo de bateria caiu de US$450/kwh em 2010, para US$ 181/kwh em 2018, permitindo o desenvolvimento mais barato de carros híbridos (HEV) operados por bateria (BEV).
Isso gerou um aumento na produção de energia solar, que cresceu 35 vezes entre 2010 e 2020, e continua crescendo anualmente acima de 20%. Por consequência, gerou uma demanda nos metais usados para a construção dos painéis solares, mas sobretudo nos que são matéria-prima para as baterias, em especial o lítio e o cobalto.
O pico do preço do cobalto foi em 2018, do lítio em 2023. O movimento forçou várias empresas a repensarem o uso excessivo de bateria de lítio-íon. E os carros híbridos começaram a ser vistos como uma saída mais viável do que os operados puramente a bateria.
O terceiro passo intermediário é o hidrogênio. Embora células de combustível de hidrogênio (FCEV) existam há anos, elas sempre foram vistas como uma solução secundária devido ao volume de armazenagem. A comparação do hidrogênio em geral é feita com o diesel, um tipo de energia voltado mais a veículos de grande porte, como caminhões, trens e navios.
Embora a Toyota seja a empresa mais associada às células de combustível de hidrogênio, existem outras desenvolvendo esta tecnologia, como Hyundai, GM e BMW. O interesse cresceu por conta da percepção de que não será possível resolver todos os problemas de mobilidade a partir de carros operados a bateria. A visão da Toyota me parece ser referência, pois possibilita utilização de diversos tipos de energia em veículos compatíveis com cada um deles.
Neste sentido, para pequenas cargas e distâncias, o mais lógico é utilizar os veículos de bateria, já para grandes cargas e distâncias,faz mais sentido utilizar o hidrogênio.No meio do caminho com cargas e distâncias médias os veículos híbridos fazem mais sentido. Sairemos de um ambiente utilizando uma solução única para problemas diferentes, para um em que temos soluções diferentes para problemas diferentes.
Tais soluções, na percepção da Toyota, vão ficar mais baratas do que o combustível fóssil no final desta década, e depois deve levar cerca de 20 anos para todas as frotas serem trocadas, completando a transição por volta de 2050.
Os passos finais são as tecnologias ainda não viáveis economicamente, mais especificamente energia solar em órbita (SBSP) e fusão nuclear. Ambas em estágios avançados de pesquisa e já tecnologicamente viáveis, no entanto, ainda caras.
O desenvolvimento de tecnologias espaciais deve acelerar estas duas tecnologias nas próximas décadas levando a uma redução muito forte da dependência de combustível fóssil até o final do século.
No final o objetivo desta transição é triplo. Existe uma vantagem em reduzir a pegada carbono e com isso os impactos no ambiente terrestre. Mas tão importante quanto isso é reduzir a dependência de um recurso cada vez mais escasso que é o petróleo, utilizando outros mais abundantes. E finalmenteo incentivo geopolítico de reduzir a dependência de ditaduras.
A transição energética está em andamento e é inevitável. Ela se conecta com uma mudança nas indústrias de baterias, mineração e espacial, levando a um novo ecossistema econômico.
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