Vinho da Casa

Uma bênção na taça

Vinhos litúrgicos seguem normas rígidas e só podem ser vendidos com a permissão da Cúria Metropolitana.

Quem bebe vinho canônico se sente abençoado. E não é exagero dizer que uma garrafa na Ceia de Natal dá um toque quase sagrado ao momento. Pelo Redemptionis Sacramentum, regra da Igreja Católica sobre a Santíssima Eucaristia, o vinho da missa “deve ser natural, do fruto da videira, puro e dentro da validade, sem mistura de substâncias estranhas”. Se houver qualquer dúvida sobre a origem, está automaticamente fora do altar.

Por isso, vinhos litúrgicos seguem normas rígidas e só podem ser vendidos com a permissão da Cúria Metropolitana.

Aqui no Brasil, essa história toda começou no final do século XIX, quando freis capuchinhos chegaram à Serra Gaúcha e trouxeram o hábito de produzir seus próprios vinhos. Por muitos anos, o vinho da missa era feito apenas em mosteiros, mas, com o tempo, alguns produtores foram ganhando a confiança da Igreja para elaborar e comercializar o vinho litúrgico.

Foi assim que, na década de 1920, o primeiro enólogo da família Salton, Antonio “Nini” Salton, criou — com o pároco de Bento Gonçalves — um vinho especial para a liturgia. Nascia o Canônico, que até hoje aparece em igrejas de todo o País. Segundo Gregório Salton, enólogo da vinícola, ele é um vinho licoroso feito com uvas americanas típicas da Serra Gaúcha.

A Salton renova periodicamente a autorização da Igreja, concedida por um bispo diocesano. Hoje, cerca de 80% do Canônico vai direto para as paróquias, e o restante segue para quem gosta de ter essa experiência em casa.

Por ser licoroso, funciona tanto na missa quanto na sobremesa ou naquele aperitivo antes do jantar. Como tem mais álcool e mais açúcar, ainda dura bem depois de aberto.

A Casa Geraldo, em Andradas, também fabrica vinho litúrgico. Fruto da fortificação de Moscato, Cabernet Sauvignon e Merlot, com um toque de destilado e açúcar, ainda descansa três anos em tonéis de amendoim e pereira. O resultado? Cor âmbar, perfume de frutas passas e uma parceria deliciosa com a rabanada natalina.

Na Península de Setúbal, em Portugal, a Casa Ermelinda Freitas também faz vinhos canônicos, com sua casta ícone: Moscatel de Setúbal. Escolhida após estudos do Secretariado Nacional de Liturgia de Portugal, é feito a partir de vinhas de 20 anos localizadas em Fernando Pó.

Patrimônio cultural do país, a Moscatel de Setúbal se sai muito bem no altar, mas também na harmonização com panetone, frutas secas, castanhas, chocolates e toda a ala doce da ceia.

Outros produtores desta região produzem rótulos de muito boa qualidade, como Casa Agrícola Horácio Simões, Adega de Palmela e Quinta do Piloto. São rótulos intensos, cheios de notas de passas e nozes.
Para fechar a lista santa com licença poética, nada como uma taça do tradicional Jerez Oloroso, da Andaluzia, que poderia ser perfeitamente o canônico da região.

Bodegas como González Byass, Sánchez Romate, Hidalgo, Barbadillo e Valdespino oferecem rótulos que parecem feitos para o Natal: avelã, nozes, especiarias, madeira, baunilha… Tudo combinando perfeitamente com a mesa festiva.

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