Viver em Voz Alta

Olavo Romano

Já nem me lembro mais quando nem como conheci Olavo Romano. Talvez tenha ido a alguns de seus sempre bem-sucedidos lançamentos. Ou assistido a alguma de suas palestras, provavelmente em ambiente escolar, que ele adorava prestigiar. O fato é que o reencontrei em 1997, quando, recém-formado, apresentava o “Jogo duro”, um programa de entrevistas do Canal 23, dirigido por Alberico Souza Cruz e Lauro Diniz na capital mineira. Impossível ‘jogar duro’ com Olavo. Seu sorriso convidava a gente a passear por um mundo paralelo, bem melhor que esse em que vivemos. Um mundo encantado, povoado por personagens marcantes, a maioria saída do interior de Minas, ainda carregando seus costumes, suas manias, seus sotaques, e, principalmente, suas histórias inesquecíveis. Pouco tempo depois, pude, mais uma vez, comprovar tudo isso, quando conheci, em sua casa, o mítico Manuelzão, imortalizado por Guimarães Rosa. Foram mais de três horas de uma conversa divertida e bem-humorada, de que também fez parte o professor Apolo Heringer Lisboa.

Exímio narrador de ‘causos’, Olavo retirou do esquecimento uma galeria imensa de tipos negligenciados pela literatura gerada no estado. Deu voz a muitos que passaram décadas sem ter a sua existência e a sua cultura valorizadas devidamente. Resgatou um tempo que a chamada ‘modernidade’ havia impiedosamente enterrado. Seus livros, por isso, são mais que produção literária. São documentos histórico-literários fundamentais para a compreensão do modo de ser, de viver e de conviver da gente mineira, notadamente a partir dos anos quarenta do século vinte. Tenho a certeza de que, agora mais que nunca, eles serão fonte de consulta e pesquisa, ajudando professores e pesquisadores a dialogar melhor com esse mistério chamado ‘Minas’. Se, dos volumes dedicados aos ‘causos’ podemos extrair esse refinado néctar, de “Família Romano – Memória – Afeto – Gratidão”, publicação em que Olavo e seus irmãos narram a saga do padre Aniello Romano, de dona Ambrosina Theobaldo, de dona Waldete, seu Demósthenes e a prole de quinze filhos, podemos retirar tudo o que o título promete, e mais, numa coleção de depoimentos completos e comoventes sobre o que viveram e do que se recordam.

Agregador e generoso, Olavo transformou sua luminosa passagem pela presidência da Academia Mineira de Letras em uma oportunidade para aproximá-la da cidade e de seu povo. Ainda na Fiat, embarquei, de novo, no navio mágico e enfeitado de sonhos que ele pilotava. Juntos, criamos “O autor na Academia”, com pleno apoio de Marco Antônio Lage, então diretor de Comunicação da montadora. Durante toda a sua gestão na Casa de Alphonsus, promovemos um evento por mês, sempre com um escritor de qualidade. Lembro-me bem dos encontros com Sérgio Paulo Rouanet, Domício Proença, Cícero Sandroni, Marina Colasanti, Mary del Priore, Ana Maria Machado, Ignácio de Loyola Brandão, Edla Van Steen… Eleito para a cadeira número oito em 2016, fui recebido por ele, na cerimônia de posse.

A notícia da morte de Olavo me machucou muito. Dói até agora. Para sorte nossa, sua obra ficará. Para sempre. E ele permanecerá vivo enquanto tivermos ouvidos para escutar aquela sua sonora gargalhada – prova de que a vida vale a pena.

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