Opinião

Confiança Jurídica, pilar da democracia

Confiança Jurídica, pilar da democracia

Júlio Damião*

Um dos pilares da democracia é acreditar que os trâmites jurídicos, transitados e julgados, devem ser respeitados. Esta certeza garante a previsibilidade do mercado e principalmente do empresário, que com mais confiança irá investir e criar mais empregos. Fomos surpreendidos, no começo deste mês, com a decisão do STF de que o “transitado e julgado” pode ser modificado.

Imagine que a sua empresa conseguiu, de forma correta na Justiça, o não pagamento da CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido), tudo dentro da governança empresarial e com todos os “ritos” jurídicos cumpridos, ou seja, transitado e julgado. O STF, então, decide que não!!! Que a decisão que a empresa tinha não tem mais validade e que agora o pagamento é devido, podendo ser retroativo a 5 anos.

Esta decisão é um desastre para o Brasil, pois a percepção é que não temos uma segurança jurídica. Vejamos os impactos:

1 – Como o empresário acreditará nas decisões da Justiça depois disso? Como explicar que agora ele terá de pagar um imposto retroativo a 5 anos, visto que estava lastreado pela decisão da Justiça? GPA (empresa que controla entre outras empresas, a rede de supermercado Pão de Açúcar) já divulgou o impacto através de “fato relevante”, vai pagar R$ 290 milhões, outras empresas também poderão ser impactadas.

2 – Empresas já estão demitindo para ajustar o Fluxo de Caixa e passar por este período de mercado em baixa, com as empresas desembolsando e prejudicando ainda mais o caixa para pagar este imposto que não estava previsto, irá agravar ainda mais as demissões. O empresário vai pagar está conta, decisão judicial se cumpre, mas vão custar muito caro para pais de famílias, fornecedores e economia. Não existe almoço grátis. Este impacto no caixa das empresas irá diminuir os investimentos, cancelar contratações, a arrecadação do governo irá diminuir e teremos um aumento do déficit fiscal.  

3 – O Recado para os investidores internacionais também é muito ruim. Investimentos serão repensados. Quem vai querer investir no Brasil com uma decisão dessas? Como explicar para o mundo que uma decisão transitada e julgada pode ser modificada? Quando o investidor nos perguntar se o sistema judiciário é confiável, vamos responder o quê: Depende? 

4 – Uma importante questão a responder diz respeito a outras decisões transitadas e julgadas que as empresas conseguiram sobre o não pagamento de outros impostos. Esta decisão sobre o CSLL pode ser aplicada a outros tributos? Como, por exemplo, do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) na revenda de mercadorias importadas, a contribuição patronal sobre o terço de férias? Empresas já estão fazendo as contas e podem ter certeza, cancelando investimentos.

5 – A decisão do STF foi baseada no argumento de que a isenção (transitada e julgada) anteriormente a algumas empresas afetou a lealdade concorrencial, ou seja, as empresas de um mesmo setor estariam concorrendo de forma desleal, já que uma seria isenta de determinado imposto por uma decisão judicial, enquanto outra, não. Mas está questão já não foi analisada e aprovada pelo próprio judiciário, antes da decisão do STF? Como fica então todas as empresas que possuem incentivos fiscais e que geram empregos, principalmente na “Zona Franca de Manaus”?

6 – Outra questão diz respeito ao próprio sistema judiciário. As empresas de advocacia que conseguiram corretamente na Justiça o não pagamento do CSLL terão que devolver os seus honorários aos seus clientes? Como fica a credibilidade do judiciário sobre o próprio judiciário?

Tem uma coisa positiva nisto tudo, se o STF entende que as decisões já julgadas podem ser modificadas e retroagidas, gostaria de sugerir que as entidades que podem entrar com processos no STF, façam os seguintes pedidos:

1 – Que todos os auxílios moradias (Judiciário + Executivo) pagos indevidamente sejam devolvidos com correção, que incida o IRPF sobre este benefício e que todo este gasto entre no cálculo do teto constitucional. Para ser justo, pode ser retroativo nos últimos 5 anos.

2 – Que todos os servidores que recebem acima do teto salarial constitucional (Judiciário + Executivo), hoje em R$ 39 mil, devolvam esta diferença, também corrigido, retroativo a 5 anos.

3 – Se a questão aqui é a igualdade de concorrência, porque então que os salários e benefícios do judiciário são desiguais com relação aos ganhos da população (que paga um dos impostos mais altos do mundo), seria possível equalizar isto também, cortando todos os benefícios e diminuindo os salários?

Estamos, novamente, atuando nas consequências e não nas causas. Esta decisão do STF não aconteceria se tivéssemos um sistema tributário justo e descomplicado, precisamos atuar nareforma tributária, PEC 45 ou 110, de forma inteira, sem “fatiar” e fazendo uma séria discussão com a sociedade.

Somos um país sério? Depende.

*Presidente do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças de Minas Gerais (Ibef-MG)

Rádio Itatiaia

Ouça a rádio de Minas