Cultura e sustentabilidade

Se fosse possível associar um único verbo a cada perspectiva do desenvolvimento sustentável, à dimensão Social seria ‘engajar’; à Econômica, ‘viabilizar’; à Política, ‘representar’; à Ambiental, ‘acolher’; à Espiritual, ‘conectar’ e, à dimensão Cultural, ‘identificar’.
Embora sejamos individualmente partícipes de uma mesma comunidade planetária, nossos valores são feitos de diferenças. E é na diversidade onde residem as peculiaridades que fazem único cada grupo humano, cujos matizes caracterizam os povos ao mesmo tempo em que os distinguem.
Um dos principais papéis da Cultura é identificar as singularidades e permitir-lhes autoproteção. Mantém os indivíduos coesos e unidos, através do senso de pertencimento. Daí, as referências, raízes, crenças, tradições e identidades blindarem um “universo cultural” através do fortalecimento de seus contornos, para que este não se perca diante das diversas forças – em especial as imperialistas – que moldam o mundo e as instituições.
Há várias formas de se extinguir uma cultura, sendo as principais as falhas na valorização dos seus signos e a ineficiência no repasse de conhecimento ancestral, entre gerações. Isto pode facilitar o desaparecimento de dialetos, costumes, rituais, entre outros, devorados pelo “desenvolvimento”. Por que uma empresa deveria se preocupar com isso? A riqueza antropológica de um povo mantém sua pertença e pode contribuir com as visões corporativas, amplificando-as e adicionando componentes impensáveis, que podem ser diferenciais de inventividade e diversidade organizacional.
Uma cultura também pode ser afetada pela padronização prescrita pela mundialização. A predominância cultural pode ser nefasta em face, principalmente, de organizações transnacionais descuidadas e de avanços tecnológicos que facilitam a massificação e a supremacia de ícones de sociedades economicamente poderosas. É como se a globalização facilitasse a transformação do planeta em uma grande loja de R$ 1,99, perdendo suas peculiaridades regionais.
Certos símbolos religiosos antes esculpidos por artesãos brasileiros em madeira ou argila (com diferenças entre uma obra e outra face ao processo artístico e manual), por exemplo, gradativamente estão sendo substituídos por formas semelhantes em resina, produzidas – em séries simétricas – no além-mar.
O “baixo custo a qualquer custo” e preços “atrativos” jogam a pá de cal no que sobrar da originalidade da peça tradicional. Com isso, muitas particularidades culturais poderão desaparecer, até porque tem prevalecido a importância comercial das produções, mais que seu valor subjetivo e seu significado local, ameaçando, inclusive, a sobrevivência cultural.
Por que seria importante uma empresa participar da recuperação dos pavilhões de Goiabeiras que produzem panelas de barro no Espírito Santo; da manutenção da arte marajoara no Pará ou da conservação das pinturas rupestres em Conceição do Mato Dentro, em Minas Gerais? Além de contribuir com a preservação da identidade cultural dos povos, não se estaria favorecendo a possibilidade de turismo ou brindes institucionais originais nas regiões onde o negócio opera? Isso também geraria epicentros de desenvolvimento econômico, contribuindo com a economia local. Deixando a voracidade comercial engolir o empreendedorismo regional, iniciativas de economia criativa ou solidária podem não decolar.
O capitalismo transforma quase tudo em mercadoria, na ânsia de lucro, mas com sensibilidade, pode ajudar no fortalecimento popular. A viabilidade garantida pela dimensão Econômica à Culturalé determinante em certos estágios até sua estabilidade.
A atenção chamada aqui é para se assegurar a variedade na quantidade. Daí a necessidade de observância à dimensão que advoga pela identidade dos povos e sua preservação. Ou os indivíduos perder-se-ão de suas referências e tornar-se-ão presas fáceis da mais pueril estratégia de domínio. E poderão vagar pelo ‘limbo da pertença’, como os indígenas do norte do Brasil que suicidaram depois de perderem sua identidade com a colonização. Perdem-se raízes que os sustentem na solidez de um presente aprimorado a partir da herança de um passado, em direção a um futuro consciente e sustentável.
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