Opinião

Desfile de absurdos

Desfile de absurdos
Crédito: Depositphotos

“A desigualdade entre os sexos (…) dificulta o crescimento econômico” (Banco Mundial)

As considerações sobre o papel da mulher na sociedade têm desdobramento. A briga pela derrubada de paradigmas é braba e barulhenta. São ainda fortes os ecos de certas palavras de ordem vindas de eras remotas, sintetizadas na frase padrão: “Lugar de mulher é em casa”.

Os preconceitos apresentam, em muitos lugares, é verdade, efeitos atenuados em matéria de violentação à personalidade, se comparados com as inacreditáveis situações vividas em tempos antigos e em outros lugares de nosso próprio tempo.

Mas conservam vestígios culturais rançosos, ainda que longínquos, daquelas épocas absurdas em que algumas comunidades exóticas e fanatizadas assimilavam a ideia, por exemplo, de que a mulher não possuía alma.

Ou de que, no plano dos “sagrados deveres conjugais”, como amorosa e dedicada companheira, devesse se preparar para fazer jus ao prêmio máximo na loteca dos deuses, consentindo que a enterrassem viva com os pertences e despojos do pranteado marido, senhor seu amo, quando de sua (dele) partida desta para melhor!!!

Provêm de visualização nascida de impactante injustiça social os escandalosos problemas levados a debate nos conclaves promovidos periodicamente pela ONU. Ou por outras instituições que se ocupam, benfazejamente, da tormentosa discussão sobre os direitos da mulher. O desfile de absurdidades escancara práticas escravagistas, tráfico de mulheres, processos de mutilação sexual, restrições ao acesso no mercado de trabalho a cargos e promoções, falta de oportunidades iguais às concedidas aos homens nas atividades políticas, nas áreas técnica e científica, no desfrute de bens educacionais. Embargos assustadoramente consentidos, às vezes, em nome de mórbidos argumentos religiosos. Alguns registros dão conta de que, mesmo em países desenvolvidos, as políticas salariais revelam-se desiguais. A média da remuneração da mulher fica abaixo da média da remuneração do homem. As possibilidades de ingresso em empregos, nesse mesmo tipo de confronto, são de 61% no Japão, 58% na Holanda e 16% nos países árabes. Sabe-se, ainda, que de 1,2 bilhão de pessoas que vivem em estado de pobreza absoluta (renda inferior a 270 reais/mês), 70% são mulheres. Outro levantamento revelador diz respeito às chances de participação no poder. As mulheres ocupam 20 por cento dos cargos de direção, algo equivalente nos chamados postos ministeriais. Tem mais: meio milhão de mulheres (99% do Terceiro Mundo) morre, anualmente, vitimadas por patologias vinculadas à maternidade.

Não há como ignorar, por outro lado, o tratamento diferenciado, de modo geral desrespeitoso, com que a mídia, acionada por preconceitos milenares, dominantes no inconsciente coletivo, se ocupa do fato trivial de uma mulher que, no exercício de função pública, resolva assumir ostensivamente um caso afetivo. A derrama noticiosa que isso suscita, vou te contar…

Está na cara que esses dados não esgotam o temário difícil e, sob incontáveis aspectos, doloroso da problemática abordada. Mas servem para dimensionar as perturbadoras circunstâncias que envolvem essa questão prioritária no processo da construção humana. O Banco Mundial anota algo supra importante: “A desigualdade entre os sexos paralisa a produtividade e dificulta o crescimento econômico.”

Há avanços e respeitáveis. Há que celebrá-los. Mas os problemas continuam sendo de grande monta. As estruturas modernas ampliaram a faixa dos direitos previdenciários, sociais. Persistem, todavia, ainda numerosos, difíceis obstáculos a serem transpostos. A sociedade rodeia de manifestações simpáticas, em boa parte das vezes da boca pra fora, a trajetória ascensional feminina.

O assunto comporta mais considerações.

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