EDITORIAL | A estratégia da mentira

Não é segredo que as ditas redes sociais, designação que se transformou em fina ironia, estabeleceram no planeta um sistema de desinformação tão poderoso capaz até de influenciar eleições nos Estados Unidos ou a decisão dos britânicos de abandonar a Comunidade Europeia. Não é pouca coisa e nem é por acaso que todo esse lixo é produzido e distribuído sem que medidas de contenção sejam efetivamente adotadas, enquanto as redes mais conhecidas e de alguma forma institucionalizadas abrem espaço para uma outra, assumidamente marginal, e, como tem acontecido, usando o falso argumento de que apenas atua em nome da liberdade de expressão, quando na realidade é abrigo, segundo o STF, para toda sorte de ilicitudes.
Estamos falando da Telegram, supostamente de origem russa e hoje com sede em Dubai, com larga atuação também no Brasil, transformado em espécie de caminho alternativo para propaganda de massa, calcada em fake news, na qual o presidente da República teria cerca de um milhão de seguidores. Operando a partir do exterior e até há pouco sem qualquer representação formal no País, o que em si configura crime, a Telegram, depois de mais de uma vez advertida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), teve suas atividades suspensas no Brasil e afinal deu sinal de vida. Respondeu que não teria recebido os e-mails a ela endereçados e, candidamente, pediu desculpas, além de ter de volta o direito de continuar de portas abertas, o que aconteceu no domingo.
Em seu socorro, conforme divulgado, veio a Advocacia Geral da União (AGU), que não foi capaz de perceber todas as ilegalidades que igualmente deveria combater, mas enxergou agressão à liberdade de expressão, como se não soubesse que este sagrado direito evidentemente não abraça mentiras, como tantas que foram ditas e repetidas para condenar a vacinação ou tentar desacreditar o processo de votação brasileiro. Quem se lembra do presidente Bolsonaro, em pessoa, citando pesquisa italiana que nunca existiu para dizer que a vacina contra Covid poderia provocar Aids?
Aceitas as desculpas e cumpridas as exigências, inclusive indicação de representante no País, tudo voltou ao normal. De qualquer forma, espera-se que tenha sido, pelo menos do ponto de vista dos interesses que contam, um sinal de alerta, uma advertência mais firme, que valha para todos e assim ponha algum freio a abusos transformados em rotina. Pior, fazendo da mentira principal arma de ação político-eleitoral, o que pode até não ser nenhuma novidade, mas carrega o perigo de se espalhar aos milhões, como verdadeira praga.
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