EDITORIAL | Agressões inaceitáveis

Em São Mateus, no Espírito Santo, foi constatada a gravidez de uma criança de apenas 10 anos, violentada desde os 6 por um tio. O caso, como seria de se esperar, ganhou enorme repercussão, sobretudo depois que hospitais da cidade negaram realizar procedimento de aborto, alegando falta de amparo legal.
A criança, em meio a inevitável exposição e sofrimento, acabou atendida em Recife, enquanto na porta do hospital grupos extremistas religiosos e políticos tentavam impedir o ato médico. Tudo porque uma mulher, bem conhecida por suas atitudes, publicou numa rede social o nome da criança e o endereço do hospital em que seria atendida. Cometeu mais um crime e deverá ser processada.
No dia seguinte, depois de uma cirurgia que demorou 17 horas, a frente do hospital foi coberta com balões brancos e flores, endereçadas à equipe médica e à menina, que também recebeu presentes e fartas promessas de ajuda.
Nesse país que parece perdido e sem rumos, o espaço da solidariedade e dos bons sentimentos felizmente ainda é predominante, por mais que os atos de intolerância chamem atenção e causem preocupação. Tudo, nessas alturas, remetendo mais uma vez ao uso impróprio, criminoso, das redes sociais. Não precisa ser assim e o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Luiz Roberto Barroso, que tem assento também no Supremo, é otimista quanto a mudanças rápidas, capazes de alcançar já as próximas eleições.
Para ele, as empresas que exploram estes serviços entenderam que sua imagem e seus resultados estão sendo comprometidos e se mostram dispostas a agir, sem a falácia de que seriam guardiãs da liberdade de expressão e contra censura. Absolutamente não foi o caso, para apontarmos apenas o exemplo mais recente, da mulher que expôs a infeliz criança capixaba e que foi imediatamente banida, por decisão da empresa operadora, da rede que utilizou como arma para praticar seu crime.
O ministro Luiz Roberto Barroso está coberto de razão. Como já foi dito aqui mais de uma vez, não se trata de agredir valores fundamentais e sim de resguardá-los. A falta de filtros e de controles e os abusos consequentes que ganham dimensão intolerável, impulsionados pelo poder da tecnologia, precisam e devem ser contidos, seja em nome da proteção da criança cujo trágico destino e objeto deste comentário, ou de uma escalada que claramente põe em perigo valores e instituições.
E banalizando deformações de caráter que igualmente acabam contribuindo para distorcer a realidade, multiplicando mentiras com o auxílio de robôs e outros aparatos tecnológicos, em inequívoca ameaça à liberdade e aos valores que a democracia abraça.
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