Opinião

EDITORIAL | Amigos, amigos, negócios à parte

EDITORIAL | Amigos, amigos, negócios à parte
Crédito: Paulo Whitaker/Reuters

Já se passaram mais de dez dias desde que autoridades sanitárias de Shenzhen, na China, anunciaram ter detectado, em embalagens de um lote de carne de frango de origem brasileira, vestígios do coronavírus. Para um país que é, hoje, o maior vendedor mundial de proteínas animais e tem justamente na China seu maior cliente, a denúncia assume ares de potencial catástrofe, cujo primeiro sinal foi a suspensão de compras, pelas Filipinas e por Hong Kong, do produto brasileiro, além de ameaças vindas de outras direções.

O governo brasileiro, que por mais incrível que possa parecer, tem feito esforços continuados para azedar as relações com o seu principal parceiro comercial, que insiste em qualificar como comunistas como aqueles construídos, fazem mais de 50 anos, pela propaganda ocidental, preferiu o silêncio diante da delicada questão.

Produtores e estudiosos da matéria, por seu lado, estranharam as vagas alegações vindas da China, dizendo ser altamente improvável, na realidade quase impossível, contaminação como a denunciada. Uma possibilidade que os próprios chineses fortaleceram ao declararem formalmente que não farão nenhuma comunicação oficial do ocorrido, além de se recusarem a reforçar suas acusações com resultados dos testes por suposto realizados, além das necessárias contraprovas.

Esquisito, para dizer o mínimo, lembrando que em julho passado o Equador foi o alvo dos chineses em circunstâncias muito parecidas, quando anunciaram que detectaram o vírus em pacotes de camarão vindos daquele país. Tanto quanto sabemos do lado de cá do planeta, ficou tudo por isso mesmo, também faltando elementos probatórios para confirmar a denúncia.

Para equatorianos e brasileiros, pouco resta a fazer diante de atitude que, de certa maneira, lembra o presidente Donald Trump, dos Estados Unidos, e suas frequentes ameaças de impor tarifas a produtos de qualquer país que o tenha incomodado, isto quando não anuncia barreiras ainda mais drásticas.

Para o Brasil, China em primeiro lugar, como principal parceiro comercial, Estados Unidos em segundo, os dois tão diferentes e com um ponto em comum. Colocam seus interesses em primeiro lugar e não arredam pé desta posição, que para Trump, com seu America first foi até tema de campanha nas eleições passadas.

Resta concluir, e sem permitir que o raciocínio seja contaminado por qualquer viés político, que o mundo é assim, quem pode manda, quem tem juízo obedece. Ou procura, com mais inteligência, e tão discretamente quanto possível, criar seus próprios espaços, sua autonomia, sem alimentar a ilusão de alianças que não sejam vistas da outra parte como negócios ou estratégia geopolítica.

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