EDITORIAL | Arapuca para Lula

Continua rendendo especulações, em Brasília principalmente, as questões envolvendo o planejado atentado ao ex-juiz Sergio Moro, as reações do próprio e do presidente Lula. E motivos não faltam para exploração política da delicada questão, em que versões vão aparecendo conforme as conveniências e o oportunismo que costuma passar distante da verdade. Para começo de conversa é preciso entender, antes de tudo, que as investigações da Polícia Federal concluíram e apontaram que o grupo criminoso vinha se preparando há pelo menos seis meses para chegar a seu alvo. Uma informação que basta para impedir qualquer tipo de associação com o governo atual, muito menos, como disse Moro, para que se atribua ao presidente Lula qualquer responsabilidade com a segurança do agora senador ou de seus familiares.
Pior, o foco da questão, que deveria estar na criminalidade e, diante dela, na fragilidade do próprio Estado, acaba se perdendo, dando lugar, como estamos vendo, a uma politização absolutamente vazia de conteúdo. Moro, dono de um grande telhado de vidro e com muita coisa mal explicada, notadamente sua associação ao governo passado, tenta agora se fazer de vítima. Um papel que sua própria fisionomia, nas aparições mais recentes, desmente para qualquer bom observador. Da mesma forma, o presidente Lula não parece ter feito o melhor, seja quando usou um palavrão para dizer o que gostaria de fazer com seu algoz, seja agora quando sugere que tudo poderia não passar de “uma armação”.
Na realidade, o presidente da República assumiu reconhecendo que uma de suas tarefas mais importantes e urgentes seria promover a reconciliação dos brasileiros, não parece estar sabendo fazer o melhor uso de sua decantada habilidade política. Não é preciso e nem conveniente, definitivamente, jogar mais lenha na fogueira, o que só serve para alimentar seus inimigos, dando-lhes munição também para reforçar o jogo sempre sórdido das fake news. Como presidente, como alguém que no terceiro mandato já deveria conhecer bem a tal “liturgia do cargo”, ele definitivamente não poderia se medir pelo antecessor. Da mesma forma que não deveria se encantar com a vitória nas urnas, tendo humildade para reconhecer a própria fragilidade e, assim, cultivar a prudência e não fazer justamente o contrário.
Os palanques já foram desmontados, a campanha já acabou e o mandato está batendo no marco simbólico dos 100 primeiros dias. Cedo ainda para cobrar resultados, principalmente diante do terreno devastado que encontrou, mas já o bastante para que tivesse produzido avanços na conciliação e sinalizar rumos com relação ao futuro.
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